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Mariana Kotscho

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

O que é 'tradicional família brasileira'? Conceito vem mudando com o tempo

Carol Campos e Simone Santos são mães do Pedro, de 7 anos. - Acervo pessoal
Carol Campos e Simone Santos são mães do Pedro, de 7 anos. Imagem: Acervo pessoal

Colunista de Universa

03/07/2022 04h00

Pessoas de boa família. Quem são? O que seria a tradicional família brasileira? Pai, casado com a mãe e filhos felizes e equilibrados? Mas só o pai ser casado com a mãe não é garantia de nada, muito menos de ser uma família "de bem". Os números alarmantes de violência doméstica estão aí para comprovar isso.

Infelizmente, muitas vezes a família "tradicional" da foto não mantém aquilo que deve ser tradição na vida real: amor, carinho, afeto, respeito, companheirismo, troca, crescimento. Essas palavras todas são mágicas e deveriam ser mais valorizadas.

Eu entendo família como uma formação de pessoas e de laços que podem, inclusive, ir além dos ditos "laços de sangue". Laços que se criam, se desenvolvem, que são cultivados. Estão aí as famílias com filhos adotivos para provar isso, famílias com padrastos e madrastas, amigos que se tornam mais que irmãos.

As famílias têm formatos diversos desde sempre. E esta diversidade faz a beleza de cada família ser única. Na geladeira da minha casa temos um ímã com a seguinte frase: "Toda família é igual, mas a nossa é mais legal". Sem querer analisar muito a frase, eu acho realmente interessante que cada criança possa ter o direito e a vontade de dizer "mas a nossa é mais legal".

Eu não gosto de definir famílias que não são formadas por pai e mãe biológicos como famílias "diferentes". Diferente do quê? Por quê? São famílias e ponto. Retomando a ideia de famílias diversas, a minha é uma delas: moramos juntos eu, 3 filhos do primeiro casamento, e o padrasto maravilhoso deles.

Padrastos e madrastas podem e devem assumir seus lugares e papéis muito importantes nas vidas das crianças e dos adolescentes. Pai e mãe continuam tendo o lugar deles. Sendo todas pessoas legais e do bem, com o foco no que é bom para os filhos e filhas, todos ganham. Quanto mais gente amando, melhor.

Carol Campos e Simone Santos são mães do Pedro, de 7 anos. Uma família. Carol é autora do livro "Duas mamães". Ela conta que a ideia do livro veio através de um sonho. No meio da noite, Carol pegou um caderno e começou a escrever sobre as coisas que os amigos de Pedro perguntavam, principalmente em relação ao que é uma família.

Carol e Simone formam uma família com Pedro.  Carol é autora do livro "Duas mamães". - Acervo pessoal  - Acervo pessoal
Carol e Simone formam uma família com Pedro. Carol é autora do livro "Duas mamães".
Imagem: Acervo pessoal

"Eu não planejei escrever esse livro. Eu vinha procurando nas livrarias uma história bonita em que uma criança tivesse duas mães, porque eu queria que meu filho se enxergasse nas páginas de um livro", diz Carol Campos, e completa: "Além disso, a literatura inclusiva na primeira infância pode conseguir mudar o destino de uma criança que cresceria como um adulto homofóbico". O livro Duas mamães tem ilustrações de Corine Carreira.

Para Carol, a história, mais do que ensinar as crianças a construírem um mundo onde todos são vistos apenas como pessoas, também fala sobre o que é uma família: "Um grupo de pessoas unidas por um grande sentimento de amor, e os bichinhos também podem fazer parte. Essas pessoas podem morar na mesma casa, em casas diferentes, ou até em outra cidade, mas quando você precisa de um abraço, certamente elas são as primeiras a chegar."

Rogério Capela e Gustavo França são pais da Alice, de 3 anos. - Acervo pessoal - Acervo pessoal
Rogério Capela e Gustavo França são pais da Alice, de 3 anos.
Imagem: Acervo pessoal

Rogério Capela e Gustavo França são pais da Alice, de 3 anos. Uma família. Em 2019 eles participaram do Programa Papo de Mãe na TV Cultura para contar a história da gravidez, que aconteceu por barriga de aluguel nos Estados Unidos. Aqui no Brasil, a barriga de aluguel não é permitida, mas existe a possibilidade de barriga solidária, ou "emprestada". São opções para casais que não podem gerar um bebê.

A administradora Ana Jimenez, por exemplo, "emprestou" a barriga para o irmão e a cunhada, que não podia engravidar, gerarem seus filhos gêmeos. Eles também participaram do Programa Papo de Mãe, que eu apresentava.

E quantas mães sozinhas ou mães solo conhecemos que criam seus filhos? Uma família. Há pais sozinhos também - muito mais raros, é verdade.

Temos ainda tantas realidades por esse Brasil afora. Crianças criadas por avós, crianças que ficam num estado com alguém da família quando a mãe precisa ir trabalhar em outra localidade...

E temos também a chamada família estendida. É aquela que, no grupo no whatsapp, cada um assume seu papel. Eu sou a tia que manda e pede fotos e fica divulgando os próprios artigos. Sem citar o parentesco, para não criar confusão, tem a que só observa e nunca escreve nada, a dos memes, o das fotos de comida, o dos stickers, o que esquece que têm crianças no grupo, os jovens avisando que já chegaram em casa sãos e salvos. Uma diversão. A única regra: nunca ter fakenews. Na família estendida, quando há harmonia, existe uma rede de apoio que faz toda a diferença na vida da gente.

Porque família é tudo igual. Mas a nossa é mais legal.