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Mariana Kotscho

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Como ser uma mãe perfeita e, ao mesmo tempo, uma profissional exemplar?

filadendron/Getty Images
Imagem: filadendron/Getty Images

Colunista de Universa

27/02/2022 04h00

A resposta para essa pergunta no título é simples: não dá. Inauguro esta minha coluna aqui em Universa trazendo verdades. A primeira delas é que não adianta querermos alcançar a perfeição na maternidade. A gente vai idealizar um monte de coisas e logo vem aquele choque de realidade para nos mostrar a vida como ela é.

Antes de sermos mães, achamos que vamos conseguir programar e controlar tudo. Que vai dar para escolher a data de engravidar, engordar só 9 quilos na gestação, o parto vai ser normal, a amamentação será sem intercorrências. O filho ou filha vai nascer saudável e ser o mais esperto, inteligente e educado da face da terra. Birra? Coisa de criança sem limites, de pais que não sabem de nada.

O resultado negativo após a primeira tentativa de engravidar vem como uma bomba. Como assim? Daí vem o segundo, o terceiro. Um, dois anos tentando. Poxa, ninguém me avisou que poderia ser tão difícil. Alguns tratamentos depois, ela chegou. Laura, linda. De parto cesárea. E o meu parto normal? Ganhei 22 quilos na gravidez, socorro.

Nossos filhos já chegam nos ensinando que nem tudo a gente vai ter domínio mesmo. Que vamos amá-los do jeitinho que são e não do jeitinho que os idealizamos. Que vamos amá-los sempre, embora nem sempre todos os dias vamos amar a maternidade. Sim, vamos cansar, vamos sofrer e vamos logo saber que não tem como ser a mãe perfeita, mas sim a mãe possível e aquela possível para cada filho.

O pediatra e psiquiatra Donald Winnicott muito bem definiu o conceito da mãe "suficientemente boa", para tirar um pouco este peso das costas das mulheres que carregam tantos sentimentos de culpa, sofrem tantas cobranças e julgamentos - temas, aliás, que pretendo trazer bastante por aqui. Sejamos suficientemente boas que já tá bom demais.

Depois de 3 anos e muitas outras tentativas de engravidar veio a Isabel, Bel, bela. Mais ensinamentos, uma amamentação difícil, desafios, mais quilos, mais realidade batendo à porta e, em meio a tudo isso, uma profissional equilibrando os pratinhos da vida de repórter de TV daquelas que vai pra rua e cada dia está num canto da cidade, com uma rotina maluca, entrando ora 5 da manhã, ora 5 da tarde, cumprindo plantões de fim de semana, de carnaval, natal, ano novo.

Daí você se depara com algo novo, que um dia ouviu falar de longe mas pensava que era bobagem: o tal conflito entre carreira e maternidade. Como ser uma boa mãe e, ao mesmo tempo, uma boa profissional? Parecia impossível.

Mas pelo menos eu havia me programado para ter duas filhas, precisei fazer tratamento, tudo tinha dado certo. Certo? Bem, lembra que nem tudo a gente programa na vida? Então, aos 34 anos, a "surpresa". Uma gravidez "inesperada" do terceiro filho. André, que eu chamo de "meu brinde". Paguei duas, levei 3. "Mas doutor, eu não tinha problemas para engravidar? Como estou grávida sem tratamento? A Isabel só tem 4 meses e eu ainda amamento." A resposta dele: "Pois é, foi aquela chance em mil que você tinha de engravidar naturalmente".

O fato é que voltei da licença-maternidade da segunda filha grávida do terceiro e me senti a pior profissional do mundo. Tive vergonha de falar com a minha chefe. Vergonha como se tivesse feito algo errado. Sim, no trabalho muitas vezes nós mulheres ainda nos sentimos mal por estarmos grávidas.

Em resumo, quando voltei da licença-maternidade da minha filha do meio, a mais velha tinha 3 anos. E eu estava grávida do terceiro. A essa altura, pelo menos, me sentia uma mãe muito experiente. Já sabia que não eram só os filhos dos outros que faziam birras (inclusive aqueles escândalos clássicos nos shoppings). Havia aprendido que a maternidade tinha seus altos e baixos, seus prós e contras, suas dores e delícias - o verdadeiro padecer no paraíso. Mas, afinal, quem disse que seria fácil? Ou que a vida não iria mudar?

Laura, Isabel e André cresceram no estúdio, entre as gravações do programa "Papo de Mãe" - arquivo pessoal - arquivo pessoal
Laura, Isabel e André cresceram no estúdio, entre as gravações do programa "Papo de Mãe"
Imagem: arquivo pessoal

E teve que mudar. André tinha 7 meses quando decidi pedir demissão após 12 anos na mesma empresa. Ser repórter era um sonho, que eu conquistei cedo na carreira. Mas ser mãe também era um sonho. A vida é feita de fases e de escolhas e naquele momento eu sabia que precisava me dedicar mais aos meus filhos.

Mas como conciliar jornalismo e maternidade? Eu não queria abandonar minha carreira, apenas mudar os rumos dela para poder ter horários mais flexíveis para poder estar com eles na hora do almoço e do jantar, levar pra escola, poder ir a reuniões de pais. Principalmente porque sentia que aquilo era importante para mim. Não coloco isso como uma regra para ninguém e acho que cada mulher deve respeitar seus próprios sentimentos, vontades e condições neste momento. De acordo com sua história, sua realidade. E, acima de tudo, deve ser respeitada pelos outros em suas decisões - marido, se tiver, pai, mãe, amigos, colegas, família, vizinhos, cachorro e outros. Seja para continuar no trabalho porque quer ou por necessidade, seja para se tornar dona de casa, seja para o que for.

No meu caso, se eu quisesse me dedicar aos três, estar ali presente nos horários que eles mais precisavam, eu não poderia mais ser aquela repórter com horários tão disponíveis. E para ser uma repórter tão disponível, eu não seria a mãe tão presente. Era um dilema.

Uma colega chegou a me perguntar se eu não iria me arrepender de pedir demissão e um dia jogar isso na cara dos meus filhos chegando a culpá-los por alguma frustração e eu respondi que naquele momento eu ia me arrepender se não fizesse aquilo. Os anos passaram e não me arrependo.

Mudar os rumos da minha carreira significou criar o "Papo de Mãe" que, de fato, uniu jornalismo e maternidade dando forma ao primeiro programa independente da TV brasileira que falava da criação dos nossos filhos em todas as idades. Com a também jornalista Roberta Manreza, apresentei por 12 anos o "Papo de Mãe", no começo TV Brasil e depois na TV Cultura.

No cenário do programa sempre teve um espaço para as crianças e todos podiam levar seus filhos na gravação, tanto os convidados como quem ia trabalhar. Assim, meus filhos cresceram bem pertinho de mim, ali no estúdio, acompanhando cada gravação. Acabei dando um jeitinho de criar minha "creche" própria.

Hoje o Papo de Mãe é site parceiro do UOL e eu acabei voltando para aquela mesma emissora, a TV Globo, onde atualmente apresento um quadro sobre parentalidade e relações familiares no Bem Estar dentro do programa "É de Casa".

Mariana Kotscho: Hoje meus eternos pequenos estão com quase 19, 16 e quase 15 e são tudo pra mim - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Mariana Kotscho: "Hoje meus eternos pequenos estão com quase 19, 16 e quase 15 e são tudo pra mim"
Imagem: Arquivo pessoal

De novo a vida nos prega (boas) surpresas! Assim como tem jornalista de política, de economia ou de esportes, digamos que eu faça "jornalismo materno" - que eu garanto ser tão importante quanto os outros! Falar sobre nossos afetos, quem não gosta?

Ser mãe é um desafio diário. A gente ensina, mas também aprende, a gente erra tentando acertar, acerta errando e assim cresce muito nesta aventura que é ter filhos. Hoje, meus eternos pequenos estão com quase 19, 16 e quase 15 e são tudo pra mim. O caçula já é maior do que eu e esta é uma sensação estranha. Quando eles eram menores, as pessoas me diziam muito a seguinte frase: "aproveita que passa rápido" e eu pensava "imagina, isso vai levar uma eternidade". Passou num piscar de olhos. Eu morro de saudades deles pequenos, mas curto muito a Laura, a Isabel e o André adolescentes e me encanto em notar o adulto em que cada um está se tornando.

Temos que criar seres humanos melhores para habitar este mundo e isso é de uma enorme responsabilidade. Ser mãe é ser mãe para sempre.