A Mulher da Casa Abandonada: qual é a voz que realmente precisamos ouvir
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Quando o podcast "A Mulher da Casa Abandonada" estreou em 2022, eu fiquei obcecada. Primeiro, por suas qualidades dramatúrgicas - em que tanto o cenário quanto a protagonista, dignos de um filme do Kubrick, etsão a poucos metros do café de onde escrevo este texto, em São Paulo. Mas depois, por perceber que, além de real, a história de Margarida Bonetti - conhecida por morar sozinha em um casarão caindo aos pedaços em Higienópolis - era também a história de Hilda Rosa dos Santos e de um crime que diz muito sobre o Brasil.
Pra quem não ouviu o podcast de Chico Felitti - que acaba de estrear em como uma série com três episódios dirigidos por Katia Lund no Amazon Prime - talvez seja o caso de parar por aqui, pois vou dar spoiler.
Quando o passado não passa
O tema levantado pelo escritor e jornalista - a herança da estrutura escravocrata em um país que ainda vive as consequências de um período que segue sendo nossa maior marca - ultrapassa, e muito, A Mulher da Casa Abandonada.
A mulher, no caso, é uma senhora cheia de cacarecos e de sobrenomes. Não necessariamente nessa ordem. E que chamou a atenção de Felitti quando, ao se mudar em plena pandemia para um apartamento próximo ao imóvel que dá nome ao podcast, passou a investigar aquela figura misteriosa e solitária, que, nas poucas vezes em que frequentava a rua, aparecia com o rosto coberto por uma curiosa pasta branca.
Era o início de uma trama infinitamente mais macabra do que parecia. A casa decadente, o comportamento de sua moradora, a contradição evidente daquela situação imobiliária, nada disso chegava aos pés do horror que viria a seguir: um episódio gravíssimo que envolvia abusos físicos, morais e psicológicos, comuns em casos de trabalhos em situação análoga à escravidão.
Criada para ser invisível, Hilda Rosa dos Santos, depois de ter sua vida roubada para servir a uma família quatrocentona que lhe tirou sua identidade, hoje finalmente acredita em sua existência. Nos Estados Unidos, para onde foi levada por Margarida e Rene Bonetti para ser tratada sem nenhuma humanidade, Hilda pinta e cria memórias que foi impedida de produzir.
É dela a voz que precisamos ouvir. É ela, a personagem que urge.






























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