Ouvir Piovani dizer que não se deixa ser maltratada me fez repensar a vida
Ler resumo da notícia
"Eu não me deixo ser maltratada por ninguém." Desde segunda-feira estou com a frase da Luana Piovani - dita em um quadro do último Fantástico, de forma simples e didática - instalada em todas as retrospectivas da minha história. Das relações românticas as de trabalho, das trocas em família ou do dia a dia, fiquei tentando fazer as contas...Quantas vezes já passei por cima de situações em que sabia estar sendo claramente desrespeitada?
Não preciso ir longe. Semana passada, enquanto dirigia, quase infartei com os gritos de um guarda de trânsito no Rio de Janeiro. Eram 18h da tarde e, no volante desde às 15h, eu ainda não havia me dado conta da necessidade de ligar os faróis. Parada em um congestionamento na estrada Lagoa-Barra, e surpreendida enquanto ouvia Tim Bernardes por berros que inicialmente me impediram de compreender seu conteúdo, achei que alguém estivesse morrendo. "Tá passeando, madame? Vendo a morte da bezerra? Não tá vendo que tá de noite?"
Depois de acender os faróis e contar até dez, encostei o carro. "Como é?", perguntei. "É isso mesmo que eu falei, dona. Além de cega, a senhora também é surda, por acaso?". "Não, meu senhor, não tenho deficiência visual e nem auditiva - ao menos por enquanto -, mas não lhe dou o direito de gritar comigo". "Ah, pronto. Então eu vou te multar, minha filha"." Sem problemas, moço. Multar, se for o caso, o senhor pode. Gritar, não".
O exemplo é suave. Há anos, somos subjugadas em ruas, escritórios e Natais, de acordo com nosso gênero, sexualidade, cor, e, principalmente, classe social. E se eu, que sou uma mulher branca, de classe média e relativamente disposta a questionar desigualdades, passo desde sempre por violências desse tipo, imagina o abismo que habita o valor de uma cidadania...(e, aqui, o "relativamente" não é usado ao acaso - a cada dia que passa, minha indignação é, aos poucos, substituída por resignação. Ah, deixa para lá...).
Quando, portanto, Luana Piovani oferece, em plena TV aberta, suas dores como filha, mãe e mulher, e expõe uma humanidade que vemos cada vez menos nas imagens assépticas e cheias de edição das redes sociais, o seu recado é generoso e transformador: eu também sou feita de colas, ela parece dizer. E se somos diferentes em diversos aspectos, isso não acontece no que, em nós, é de tudo o mais fundamental. Estamos todos tentando. E em meio a amores desfeitos, remendos parentais, e maternidades que estão longe das que vemos nas revistas, a busca mais importante, não pode ser outra que não a de Luana. Máscaras de oxigênio, como dizem nos aviões, primeiro em nós mesmas.
Deixe seu comentário
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Leia as Regras de Uso do UOL.