A morte solitária de Juliana no vulcão e a nossa comoção com a dor do outro
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Enquanto escrevia essa coluna, recebi a notícia da morte de Juliana Marins. Depois de quatro dias presa a uma encosta de difícil acesso, sem água, comida ou roupas adequadas ao frio das madrugadas de uma das montanhas mais altas da Indonésia, a informação não é exatamente uma surpresa.
Desde o último domingo acompanho aflita a história de Juliana. A brasileira de 26 anos -que escorregou de uma trilha que a levaria ao alto do vulcão Rinjani. O passeio era parte de um mochilão iniciado em fevereiro que incluía a passagem por vários países da Ásia.
Nas fotos do seu Instagram, a satisfação em viajar sozinha e para um lugar tão longe de casa parecia evidente, assim como seu encantamento por culturas. Aliás, não só culturas. O sorriso aberto, presente em quase todos os registros, também revelava uma característica cada vez mais rara de ser encontrada: a fé nos encontros, no acaso, nas trocas com gente totalmente desconhecida, a quem parecia, confiante, estender a mão.
Sua queda, no entanto, a mim, chamou a atenção pelo exato oposto: nossa incapacidade, cada vez mais aguda, de viver e agir como grupo. Contando com laços de humanidade gratuita, que prescindem de parentesco, gênero, classe ou amizade. Laços de um reconhecimento básico: você é uma pessoa como eu, e isso deveria bastar para que eu me importe com você.
Quando se acidentou no último sábado de madrugada (sexta à noite aqui no Brasil), Juliana, que segundo declarações de amigas era expansiva e se relacionava com facilidade, havia sido deixada para trás. E o abandono, que custou sua vida nesse caso, nada tem a ver com os riscos do montanhismo.
Porque, ao contrário de turistas que optam por cumprir a escalada por conta própria - o que é uma possibilidade oferecida pelo Rinjani -, Juliana, não à toa, decidiu fazer isso em grupo. Há vídeos no primeiro entardecer em que aparece fazendo piada com a neblina ao lado de uma jovem italiana, as duas e mais quatro pessoas sob a orientação de um guia.
No início do segundo dia, cansada, a brasileira pediu ao guia que parassem um pouco. Precisava de um tempo para retomar o fôlego. "Descanse que eu vou indo na frente", teria dito o rapaz, segundo os relatos obtidos por sua irmã, Mariana, que, graças às redes sociais, foi localizada no Brasil por espanhóis que viram Juliana pedindo socorro.
Juliana caiu quando estava sozinha. E sua solidão não me sai da cabeça. Porque é muito triste e injusto que uma mulher com essa coragem não tenha sido acolhida em um momento de vulnerabilidade.
A vida não tem mesmo nenhuma garantia, e isso já é assustador o suficiente. Podemos tropeçar em vulcões, mas também na rua e em casa - isso sem falar na loteria dos genes, nas guerras e na violência urbana. Por outro lado, somos humanos. Capazes, portanto, de conversar, de esperar, e de se comover com o desamparo dos outros, porque ele não é, ou não deveria ser, em nada diferente do nosso.
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