Maria Ribeiro

Maria Ribeiro

Siga nas redes
Só para assinantesAssine UOL
Opinião

Nós sempre seremos julgadas, então o melhor a se fazer é relaxar e namorar

Eu dava meu nome numa boa, mesmo não gostando muito do sobrenome materno. Data de nascimento, idem. Nacionalidade, filiação, profissão, tudo certo. Quando chegava na hora de preencher o estado civil, eu travava. Parecia uma espécie de carimbo de abandono, atestado de solidão, quase uma tatuagem de fracasso. Demorei - juro - uns dois ou três anos para depois de separada conseguir escrever a palavra "divorciada" com naturalidade. Isso nas situações mais triviais: fichas de hotel, formulários de exames, academia de ginástica. Não é que isso acontecesse, sei lá, em uma sessão de terapia.

Uma vez ultrapassada essa etapa, a da vergonha, que hoje vejo que tinha muito mais a ver com ego e construção social do que com amor (que com todo o respeito -e dor- eu já não sentia pelo meu então cônjuge quando separamos) decidi, portanto, fazer o que nunca tinha feito: namorar.

Ahhhh, que verbo bonito, esse: namorar. Namorei um antigo amor da juventude, um ator que sempre tinha achado interessante, um ativista que no Instagram parecia um sujeito incrível, um fotógrafo inteligente e gato e que fazia o melhor carbonara do mundo...

Fiz o que na verdade nunca tinha feito e fora da tal "idade certa" para isso. Como se essa pressão - essa da idade certa - não fosse uma regra tola, preconceituosa e cultural. Mais uma, aliás, para nos fazer caber em um lugar, que, com o passar do tempo, vai ficando cada vez mais estreito.

É que até os 41 anos, quando me divorciei, minha história era composta única e exclusivamente por três grandes relacionamentos. Com meu primeiro namorado, com quem fiquei por quatro anos; com meu primeiro marido, com quem morei por nove anos; Com o segundo marido e coloca aí vestido de noiva, casa, filho, firma, gato, cachorro, Igreja, e mais onze anos na conta. Mas de tudo isso, o mais importante é que, além do meu pai, até aquele momento eu só havia convivido para valer com três rapazes.

E aí, eu separei com dois filhos e já meio quebrada, o que aliás é uma ótima peneira. Me vi finalmente solteira e decidi que - antes tarde do que mais tarde, rs - havia chegado a hora de viver a adolescência dos 40, já que por motivos que não vem ao caso aqui, fui desde cedo obrigada a me transformar na garota mais séria da turma, aquela que não bebia e nem fazia besteiras e estava sempre a postos para segurar testas alheias em banheiros que nunca pensaram em estar na Vogue. Era agora ou agora, lembro de ter pensado.

Mas voltando a vaca fria (será que ainda pode falar vaca fria? De onde será que vem essa expressão?), o fato é que um dia, ali mais ou menos na altura do terceiro namorado da lista do parágrafo acima, e olha que sempre foi um por vez que eu sou monogâmica serial, eu vivi a cena que me marcaria para sempre, justamente quando já havia parado de me julgar, o que levou tempo.

Estava no carro com uma amiga. Seu parceiro também estava com a gente e dirigia o veículo quieto enquanto me ouvia contar sobre a vida: filme, livro, filho, essas coisas... Quando de repente ela veio com a pergunta: e o namorado? Quando eu comecei a responder dizendo como havíamos nos conhecido, ele (o parceiro da amiga com quem não tenho nenhuma intimidade) veio com a seguinte frase: "não vou nem ver a foto porque já sei que não vai durar, Maria está muito namoradeira". 'O que você disse?' Perguntei chocada e brava para logo adiante ser chamada de maluca por não ter gostado do jeito que ele falou.

Mas para quê serve essa história tão pessoal que já tem uns bons anos? Logo no dia de hoje? Respondo: é que se como mulheres sempre seremos julgadas - não importa a configuração em que estivermos posicionadas na prateleira do amor, como bem diz a escritora Valeska Zanello- é melhor relaxar.

Continua após a publicidade

Porque se estamos sozinhas, precisamos de namorado. Se namoramos muito, não somos levadas a sério. Se estamos com um único parceiro desde sempre, deveríamos ter experimentado mais. Se estamos em um show com nosso parceiro, nos inventam outro, que sequer estava no local.

Eu sei que eu deveria desejar feliz Dia dos Namorados, mas quer saber? Melhor já ir programando o Natal. Afinal, nos dois da pra amar o Roberto Carlos.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

Deixe seu comentário

O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Leia as Regras de Uso do UOL.