Maria Ribeiro

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Taylor Swift, Ana Clara Benevides e a sensação térmica do silêncio

"Não vou conseguir falar disso no palco. Me sinto sobrecarregada com o luto." A declaração, escrita no fim de semana pela cantora Taylor Swift em um stories do seu Instagram, refere-se à morte de uma fã na plateia de sua apresentação da última sexta-feira (a primeira de seis no Brasil).

Ana Clara Benevides, de 23 anos, passou mal na segunda música do show da popstar americana. Atendida ainda no estádio Nilton Santos, o Engenhão, no Rio de Janeiro, Ana foi encaminhada para o hospital municipal Salgado Filho, mas não resistiu. A causa da morte, em decorrência de uma parada respiratória, segue inconclusiva.

Muito tem se especulado sobre os motivos que levaram a estudante, que morava em Mato Grosso do Sul, a óbito. O maior deles aponta para as altas temperaturas registradas na cidade nos últimos dias. Os termômetros, que marcavam 40 graus, não indicavam a sensação térmica. Que era de 60.

Segundo o Corpo de Bombeiros, cerca de 60 mil pessoas estavam presentes no evento. Algumas, ao encostarem nas placas de metal que protegiam o gramado do estádio, sofreram queimaduras de segundo grau. Ao menos mil jovens desmaiaram por causa do calor.

Desde então, um show foi remarcado, garrafas passaram a ser liberadas nas apresentações — movimento rápido do ministro da Justiça, Flávio Dino — e águas têm sido distribuídas na pista. Em jatos e em copos. A empresa organizadora do evento, por meio de sua advogada Mara Natacci, deu entrevista à Folha de S.Paulo: "Infelizmente, não temos leis especificas para esses eventos. O que o poder público faz é regular conforme os acidentes que acontecem".

De fato. Desde o fim da pandemia, dezenas de shows e festivais de música vem lotando arenas, parques e tendas pelo país. Além da experiência insubstituível que esses shows sempre proporcionaram, há agora uma demanda represada pelos anos de confinamento. Ou seja, há que se olhar, mais do que nunca, para a indústria do entretenimento. Ela faz parte da economia, e tem que estar sujeita a regras. Regras claras, podemos sair com mais facilidade do tribunal da internet. Talvez a morte de Ana Clara não seja culpa de ninguém. O que torna tudo igualmente triste e irremediável.

Mas há algo que fica. Uma garota de 23 perdeu sua vida no dia que considerava o mais importante da sua história. De acordo com sua mãe, que falou ao Fantástico no domingo, Deus a levou em um dos momentos mais felizes de sua existência.

Pra ver sua cantora favorita, Ana Clara, que cursava faculdade de psicologia e trabalhava em uma creche, juntou dinheiro por meses. Pegou seu primeiro avião. Pagou, em várias prestações, R$ 1.800 em um ingresso VIP. VIP, que em inglês quer dizer "pessoa muito importante".

Mas Taylor Swift, que poderia perfeitamente homenageá-la em suas próximas apresentações no país, não se sente capaz de falar sobre essa morte. Compreendo.

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Falar sobre luto não é fácil. Mas essa não é uma escolha. Pra uma cantora com tanta popularidade — são 277 milhões de seguidores apenas no Instagram — dar um exemplo como esse seria de extrema relevância. Além de ser um gesto bonito e responsável com a família e os amigos de sua fã.

Ana Clara, que se referia a ela como "minha loira", merecia ter seu nome dito por sua artista predileta. Em tempos de redes sociais, em que a proximidade entre ídolos e admiradores é vendida como real, reconhecer o público não pode valer só para horas felizes.

Taylor, você não vai ler, mas eu vou te dizer. Como fã. Com amor. Eu sinto muito por você estar vivendo isso aqui no meu país. Mas ninguém gosta de falar de morte. A gente simplesmente aprende. Como diz minha cantora favorita, Alanis Morissette, que, por acaso, também esteve aqui nesse novembro que grita a emergência climática, "You Learn".

Porque pior do que a sensação térmica do calor, é a sensação térmica do silêncio.

Ana Clara é um nome lindo. E a gente vai gostar de te ouvir em português.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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