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Novela para celular: Dramas da TV serão trocados por formatos verticais?

Uma moça obviamente pobre pede dinheiro ao pai obviamente rico, para o tratamento da mãe doente. Ele nega. Mas a madrasta, que ouvia tudo em silêncio, abre um sorrisinho malicioso e diz que sim, pode dar o dinheiro a ela. Mas com uma única condição.

Corta.

Essa cena é o primeiro capítulo de "A vida secreta do meu marido bilionário", a trama mais assistida dessa nova febre global que vem sendo chamada no Brasil de "novelinhas verticais".

As tais novelinhas têm em média 60 capítulos de até 2 minutos, para serem assistidos no celular. A lógica lembra o TikTok: estímulo rápido, recompensa imediata e "só mais um episódio" logo ali na frente. São produções de orçamento enxuto e roteiros viciantes, afinados e turbinados por dados e métricas que só a internet é capaz de fornecer.

O Brasil já é o quarto maior consumidor do mundo deste gênero. O Marido Bilionário já tem quase meio bilhão de visualizações, globalmente (em contrapartida, a primeira temporada de "Round 6", a série mais famosa da gigante Netflix, acumulava "apenas" 265 milhões de visualizações até o fim de 2024).

A nova linguagem já virou indústria de peso, liderada por apps como o ReelShort, que já conta com dezenas de milhões de downloads por mês. Depois de conquistar a China, os apps de micro-drama se espalharam mundo afora e podem movimentar cerca de US$ 3 bi em faturamento em 2025 fora do país asiático. Também pudera: uma temporada típica pode custar por volta de US$ 300 mil para ser produzida (como comparação, este pode ser o valor aproximado de produção de um único capítulo de uma novela na Globo).

A novidade agora é que o Brasil, que de novela entende, entrou na onda. Aqui no Uol, você pode assistir a "Além do Toque". A Globo já anunciou sua estreia nas produções do gênero, com Jade Picon, Debora Ozório e Daniel Rangel. E, em breve, será lançada aqui a Tele Tele, primeira plataforma brasileira dedicada ao assunto e que, já vou logo avisando, tem um irmão e alguns amigos desta colunista envolvidos. Uma nepo novelinha, portanto.

Mas o que essa febre nos fala sobre o futuro? Ou, pelo menos, sobre o futuro do entretenimento? A lógica da atenção cada vez mais fragmentada reina. Até os podcasts, que tinham o formato mais longo como grande trunfo, agora são consumidos em vídeo, nas redes, em cortes rápidos chamados podclips. O mercado literário também tem sentido esse impacto. Um estudo recente indicou que os maiores best sellers do mundo dos últimos anos têm algo em comum: frases mais curtas.

Por aqui, a graça é sempre observar como cada tecnologia rearranja a mesma velha vontade de ouvir e de contar boas histórias. Desde que a variedade e o tempo de duração das fontes variem bastante. Cuide do seu cérebro, você ainda vai precisar dele.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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