Cristina Fibe

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Opinião

'O Professor e os Meninos': escolas devem acolher vítimas com transparência

A estreia do podcast "O Professor e os Meninos", do UOL, em agosto, motivou novas denúncias de abusos sofridos dentro de escolas.

Em quatro episódios, a série conta as violências sexuais cometidas por Carlos Veiga Filho contra adolescentes de dois colégios paulistas: o Libere Vivere, em Serra Negra, e o Rio Branco, em São Paulo. Ele foi condenado em segunda instância a mais de 50 anos de prisão.

Ao ouvir os relatos, ex-alunos dessas e de outras escolas procuraram as apresentadoras da série— Camila Brandalise, Paula Sacchetta e eu — para compartilhar o que tinham sofrido ou testemunhado, sempre com um traço comum: o manto de silêncio que envolve esses crimes.

As escolas, mesmo quando afastam ou denunciam um funcionário acusado de abuso, pecam pela falta de transparência e acolhimento.

Uma ex-aluna do Libere Vivere, cuja diretora procurou a polícia depois de ser informada por pais dos abusos, afirmou à repórter Camila Brandalise que o colégio não foi claro sobre o motivo do afastamento do professor, que trabalhou lá por mais de 15 anos.

Em um primeiro momento, alegou motivos de saúde, e só quando a notícia vazou fez uma reunião com os estudantes para dizer que sentia muito, e que todos estavam "devastados", mas era preciso "seguir em frente", segundo o relato da estudante.

Essa ex-aluna diz ainda que nenhum canal de apoio, acolhimento ou escuta foi oferecido: "Parece que simplesmente o assunto tem que morrer". Ela critica o silêncio que "faz com que muitos ex-alunos que sofreram abuso sigam calados, com medo e vergonha".

Procurei o advogado do Libere Vivere, Eduardo Leite, para comentar as críticas, mas ele afirmou que "tudo o que tinha para falar sobre esse caso já foi dito". Antes, ao UOL, ele havia respondido que "a escola não poderia negligenciar a denúncia e foi exatamente o que aconteceu".

Já o Colégio Rio Branco, onde Veiga Filho trabalhou por 17 anos, o afastou em 2003 sob o argumento de "reestruturação interna". Embora ex-alunos tenham dito à reportagem que procuraram a direção antes disso para contar dos abusos, a escola afirma que "não foram localizados registros de denúncias, apurações ou medidas tomadas à época".

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Em nota enviada ao UOL após a estreia do podcast, o colégio diz: "Jamais negamos a palavra de ex-alunos, apenas esclarecemos que não há registros". "Hoje, contamos com canais estruturados de denúncia e ouvidoria, protocolos claros de apuração e o encaminhamento imediato ao Ministério Público de todos os casos formalizados".

Por fim, o Rio Branco diz que "é preciso afirmar de forma inequívoca: o único responsável pelos crimes cometidos é Carlos Veiga Filho".

Parece que o medo de serem responsabilizadas juridicamente ou vistas pela comunidade como berço de violências faz com que as escolas tentem se afastar ao máximo desses crimes, depois que vêm a público. Ou mesmo antes, silenciando e jogando denúncias para baixo do tapete.

O problema, para quem conta com o silêncio, é que os tempos são outros, os microfones estão abertos, e quem se cala pode, sim, ser responsabilizado também.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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