Cris Guterres

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Opinião

Não deixe o beijo para depois! Quero beijar até esquecer CPF ou nome da mãe

Dia do Beijo. Ah, essa data linda, criada especialmente para gerar conteúdo de casal no Instagram e fazer os solteiros lembrarem que nem um selinho rolou nos últimos meses. Mas enquanto os algoritmos trabalham, a vida real anda meio seca. Não de chuva, mas de beijo mesmo.

No último domingo, fui ao pagode certa de que ia presenciar o espírito do Dia do Beijo em sua forma mais pura: aquele clima, aquele olhar, aquele "encosta mais um pouquinho". Gente bonita, cheirosa, arrumada... e ninguém se pegando! O auge da frustração amorosa em pleno ambiente de cerveja gelada e samba tocando.

Não é apologia à pegação desenfreada, que fique claro. Beijo bom é beijo com vontade mútua, com consentimento falado e olhado. Mas cá entre nós: cadê aquele beijo que faz a perna tremer, a espinha gelar e o cérebro dar um tilt temporário? Um beijo que faz a gente esquecer CPF, nome da mãe e onde deixou a chave de casa.

A verdade é que estamos mesmo nos beijando menos. Os dados confirmam o que o pagode já gritava: um estudo do Instituto Kinsey mostrou que a nova geração tá cada vez mais longe do toque. A Geração Z, essa galerinha que nasceu com wi-fi no berço, vê o beijo mais como uma forma de carinho do que de sedução. Resumindo: eles estão trocando o beijo na boca por beijo no topo da cabeça. O crush virou pet. Onde foi que a gente errou?

E no Brasil, onde a gente sempre teve fama de beijoqueiro até para dar bom dia, a situação não tá muito diferente. O beijo foi ficando para depois. Ou pior: para nunca. O flerte virou emoji. O desejo virou DM não respondida. O toque virou scroll.

E olha que a gente é um país cheio de tradição beijoqueira: em São Paulo, um selinho no rosto e tchau. No Rio, dois. Na Bahia? Três beijos e um sorriso que vale por quatro. Mas mesmo com essa cultura rica, o beijo anda em extinção. É quase um patrimônio imaterial do afeto sendo ameaçado por um tsunami de indiferença.

O beijo é um idioma. É pele dizendo "tô aqui". Só que a gente está falando menos essa língua. Porque beijar exige estar presente. E presença, em tempos de múltiplas abas abertas na cabeça, virou artigo de luxo.

Mas olha, beijo bom não precisa ser épico. Só precisa ser inteiro. Não é sobre número de línguas envolvidas, nem sobre performance de filme da Netflix. É sobre aquele silêncio entre duas pessoas que se escolhem. Aquele "eu quero, você quer?" que vem sem pressa, sem dúvida e sem lista de exigências de aplicativo de namoro.

Beijo bom é o que a gente dá porque quer. Porque o corpo pediu, a boca topou e o coração não entrou com objeção.

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E se não for assim... guarda. Guarda mesmo. Porque beijo meia boca ninguém merece. E tem beijo que vale a espera. De verdade.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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