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Cris Guterres

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Não se sabote: ouvi que TV não era para mim e consegui virar apresentadora

Cris realizou seu sonho e agora apresenta o "Estação Livre", na TV Cultura - NathalieBohm/TV Cultura
Cris realizou seu sonho e agora apresenta o "Estação Livre", na TV Cultura Imagem: NathalieBohm/TV Cultura

Colunista de Universa

13/04/2021 04h00

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"Cris, você precisa pedir pro universo exatamente o que quer, se não ele manda qualquer coisa."

Foi com esta frase que Andrea Cruz mudou os rumos da minha vida durante um processo de coaching que realizei com ela em meados de 2019. Naquela ocasião, eu buscava me reconectar com meus sonhos, com tudo aquilo que sempre desejei, mas no decorrer da vida acabei me desligando por medo de fracasso ou frustração.

Por isso, quando a Mariana Guarnieri me ligou dizendo que Eneas Carlos Pereira, diretor de programação da TV Cultura, queria conversar comigo sobre uma nova produção da TV eu sabia que estava pronta. Desliguei o telefone e disse "Obrigada universo, você entendeu direitinho". Estava, naquele instante, ainda mais próxima de realizar meu grande sonho profissional, ser apresentadora de um programa de televisão.

O grande dia foi a sexta (9).Depois de meses de ensaios e preparação colocamos no ar algo inédito na TV brasileira: o "Estação Livre" é o primeiro programa jornalístico a abrir espaço para que as mulheres negras estejam em posição de destaque na elaboração, apresentação e direção. Com uma equipe de profissionais diversa e bem cadenciada, o "Estação Livre" coloca na tela toda a beleza e potência de uma população preta e periférica que sempre foi invisibilizada pela mídia do país que escolheu tratar as questões raciais sob o silêncio e o medo.

O programa conta histórias, lutas e conquistas de pessoas que encontraram seus espaços e se tornaram referência no Brasil e no mundo, e também de quem apoia a diversidade de um país plural como o Brasil. Mulheres e homens de várias áreas e profissões, negros e não negros que fazem a diferença e ajudam a valorizar a cultura black. Segundo o IBGE, o Brasil é composto por 54% de pessoas pretas e pardas.

Com uma hora de duração e edições temáticas, o "Estação Livre" tem quatro blocos, receberá convidados e contará com matérias feitas pelos jovens vídeorrepórteres Lucas Veloso e Rodney Suguita. Entre os assuntos que serão abordados estão empreendedorismo, comunidades, literatura, dança, gastronomia e artes plásticas.

Ao longo da minha vida nunca desisti do meu sonho. Mudei de caminho, troquei a rota, me sabotei algumas vezes, mas nunca desisti. Ouvi de diferentes pessoas que eu não precisava ser apresentadora de TV, que eu podia fazer meu próprio programa no YouTube. Obrigada, mas o sonho é meu, deixa que eu faço do meu jeito e eu quero estar na TV. Eu quero furar a bolha, quero estar ali na tela.

A gente sabe quão poderosa é a internet, mas nada se iguala à intensidade da televisão. Entrar na casa de alguém por meio de um aparelho, informar, conversar, criar um vínculo e mostrar que não existe limite para os sonhos. Esse sempre foi o meu objetivo.

Foram inúmeras as vezes que bati de porta em porta com meu portfólio. Na época em que nem imaginávamos que um dia compartilharíamos vídeos em nossos celulares eu carreava debaixo do braço uma fita VHS com a gravação de um trabalho que tinha apresentado na faculdade. As pessoas diziam: eu conheço fulano que conhece ciclano que tem um amigo que trabalha na Globo, talvez ele ajude. E lá ia eu com a fita VHS falar do meu sonho.

Numa dessas conversas com o amigo do amigo do diretor eu sofri um assédio sexual. O homem que supostamente me auxiliaria disse sem pestanejar que eu só realizaria meu sonho "se chupasse o pinto de alguém". Nunca me esquecerei daquela boca nojenta me olhando e dizendo: "Se você não transar ou chupar um pinto, não vai conseguir. Ou você acha que essas famosas chegaram lá só por talento?".

Eu, no auge da minha ignorância e ingenuidade, saí correndo daquela reunião e me sentindo a pior pessoa do mundo. Por anos me cobrei por não ter denunciado aquele homem. Hoje, mais de uma década depois e sem ter chupado ninguém para chegar onde estou, sei o quanto nós mulheres somos violentadas e o preço que pagamos para alcançar os postos que almejamos.

O texto de hoje é um convite para você assistir ao "Estação Livre" na tela da TV Cultura toda sexta-feira, às 22h, e para você revisitar seus planos. Como anda a materialização dos seus sonhos? Você tem permitido que eles se tornem realidade? Tenha em mente que a única pessoa no planeta capaz de fazer com que seus sonhos saiam do plano das ideias e se materializem no seu infinito particular é você mesmo, ninguém mais pode assumir este compromisso, a responsabilidade é sua.

Entregue-se ao seu sonho, permita que ele esteja dentro de você e movimente o universo em direção a realizá-lo.