Topo

Jill Biden, doutora e primeira-dama: por que a mulher com títulos incomoda?

A professora Jill Biden, figura forte durante a campanha do marido à presidência americana. - Bastiaan Slabbers/NurPhoto via Getty Images
A professora Jill Biden, figura forte durante a campanha do marido à presidência americana. Imagem: Bastiaan Slabbers/NurPhoto via Getty Images
Carla Lemos

Colaboração para Universa

12/01/2021 04h00

Você sabia que Jill Biden é a primeira-dama mais graduada da história dos Estados Unidos? Sim, a companheira de Joe Biden tem dois mestrados e um doutorado. E ela já mandou avisar que não vai parar de dar aulas. "Eu quero que o povo valorize os professores" disse ela, em entrevista à TV americana.

Antes de Jill, outra primeira-dama dos Estados Unidos também foi professora. Mas quando o marido de Eleanor Roosevelt foi eleito para assumir o cargo há quase 90 anos, ela não teve escolha. Ao se mudar para a Casa Branca, teve que abrir mão do que mais amava fazer na vida: dar aulas.

A doutora Jill quer abrir novos precedentes para mulheres de todo o país dizendo a elas que não precisam abrir mão da sua carreira em prol da carreira do marido como tantas outras primeiras-damas antes dela. Esta decisão deveria ser uma escolha, não uma imposição.

Uma escolha como a feita por Douglas Emhoff, o primeiro "segundo cavalheiro" da primeira vice-presidenta da história americana. Assim como Jill, Douglas também é professor universitário, mas tão logo a imprensa declarava a vitória da chapa Biden-Harris, o marido de Kamala Harris anunciou que iria largar seu emprego para dar total suporte a carreira de sua esposa.

Michelle Obama e Jill Biden - Reprodução - Reprodução
Michelle Obama: apoio incondicional à Jill Biden
Imagem: Reprodução

Não é sobre certo e errado. É sobre o que funciona para cada pessoa. Jill já tem experiência na Casa Branca. Durante 8 anos em que o marido foi vice de Barack Obama, ela conciliou seus compromissos como esposa de um vice de chefe de Estado com seu trabalho como professora universitária.

Sua amiga da primeira temporada dos Biden na Casa Branca, Michelle Obama, testemunhou em seu Instagram: "Por oito anos, eu vi a dra. Jill Biden fazer o que muitas mulheres profissionais fazem com sucesso: administrar mais de uma responsabilidade ao mesmo tempo, dos seus deveres como professora, às suas obrigações oficiais na Casa Branca, ao seu papel como mãe, esposa e amiga."

Mas, é aquilo né? Mulheres, quando reivindicam o direito de fazerem as próprias escolhas sobre a sua vida, o patriarcado fica em polvorosa. Afinal, para eles é um absurdo uma mulher não se limitar a caber na caixinha que determinaram pra ela.

Um artigo de opinião publicado no Wall Street Journal representou muito bem esse pensamento medíocre que ainda vigora em parte da sociedade. Nele, o colunista Joseph Epstein deu sua opinião não-solicitada dizendo que Jill deveria abrir mão de usar seu título de doutora porque ele acha que "Drª Jill Biden soa e parece fraudulento, para não dizer um pouco cômico".

Por que para este senhor uma mulher que se orgulha dos seus títulos é algo cômico? Por que para este senhor uma mulher tem que abrir mão da sua história para se encaixar nas expectativas dele de qual é o papel de uma primeira-dama? Por que homens se sentem tão ameaçados por mulheres letradas?

Imediatamente depois da publicação desse artigo descabido, a comunidade acadêmica se manifestou em defesa de Jill. "Se você tem um doutorado seja em farmácia, educação ou biologia, não importa: Se intitule uma doutora. Você trabalhou anos para merecer o título. Grite para todos se você quiser. É seu direito" disse a arqueóloga Sara Helen Parcak, ela mesma uma doutora da Universidade de Yale, estrela de vários TED Talks.

E como Michelle Obama declarou em apoio a sua amiga: 'todos estamos vendo o que acontece com muitas mulheres profissionais, quer o título seja, Dra. Srta., Sra. ou até primeira-dama. Vezes demais, nossas conquistas são vistas com ceticismo, até escárnio.

Podem até tentar, mas não vamos mais aceitar essas ideias. Como respondeu a própria @drbiden em seu twitter: "Juntos, vamos construir um mundo onde as conquistas das nossas filhas serão celebradas, e não diminuídas"

É essa a mudança que a gente quer ver e ter de exemplo para gente e para gerações que estão por vir.

*Carla Lemos é feminista, carioca e produtora de conteúdo há mais de 15 anos. Observadora atenta das mudanças de comportamento das mulheres na sociedade, Carla comanda o podcast PRIMAS e é autora do livro "Use a Moda A Seu Favor". Em 2021, lançará seu novo livro, "As Mentiras que te Contaram Sobre Ser Mulher"