Virada aposta na mistura de gerações e gêneros, mesmo com desafios técnicos

A Virada Cultural de São Paulo completou 20 anos com uma edição que tinha como objetivo resgatar a grandiosidade de outras edições.
Apesar das falhas pontuais — problemas de som, distribuição desigual de público e pouca sinalização —, a Virada conseguiu retomar parte de seu espírito original. Um dos destaques foi a percepção de que o centro, mesmo após anos de esvaziamento, voltou a pulsar.
O evento, que sofreu com falhas técnicas e algumas apresentações esvaziadas, teve como trunfo principal uma curadoria que apostou no encontro entre gerações e na celebração da diversidade, com boas atrações gratuitas de nomes consagrados e novos talentos, atravessando gêneros como reggae, forró, pop, samba, trap e rock.
A segurança também foi elogiada e, segundo a prefeitura, até domingo ao meio-dia, apenas três prisões haviam sido feitas.
Com momentos históricos, como o tributo a Rita Lee no encerramento e a apresentação emocionante de Liniker no Vale do Anhangabaú, a Virada mostrou força ao mobilizar públicos distintos, do centro à periferia. A seguir, um resumo das principais experiências em cada região da cidade.

Centro: clima de retomada e diversidade de públicos
Nos arredores do centro — Vale do Anhangabaú, Largo do Arouche, República e Rua XV de Novembro —, o clima era agradável e de reencontro. Depois de anos marcados por medo e esvaziamento, inclusive com episódios de violência nas últimas edições, o que se viu em 2025 foi um público mais solto, que parecia recuperar a confiança em ocupar a cidade durante a Virada.
No Arouche, a programação majoritariamente feminina — juntando num palco só Thalma de Freitas, Juliana Linhares, Melly e Anelis Assumpção com nomes mais pop, como Wanessa e Priscila Sena, estrela da cena brega pernambucana — atraiu um público LGBTQ+ visivelmente presente e à vontade. Os shows tiveram atmosfera intimista, com performances autênticas, dando ao espaço uma das programações mais coesas do evento.
No domingo, o Ministereo Público, com participação de Russopassapusso, animou a Rua XV de Novembro com um soundsystem de peso. A região, apesar de charmosa por estar entre casarões do centro histórico, tem limitações de espaço. Nesse caso, o público ficou confortável, mas a sensação era de que poderia ter lotado com facilidade, como ocorreu com o show de Yellowman, também em área estreita da República, e que acabou prejudicado por som estourado e público espremido.
O tributo a Rita Lee e Roberto de Carvalho, na Praça da República, reuniu um público diverso, com destaque para pessoas idosas que ocuparam as ruas em peso. Apesar do espaço cheio, foi possível assistir ao show sem grandes perrengues, ainda que o som tenha oscilado ao longo da apresentação.
Na madrugada, festas e sets ajudaram a manter parte do público na região central, mas em volume bem menor do que nas edições mais emblemáticas da Virada. A "virada da madrugada", que já foi ponto alto do evento, ainda parece longe de sua antiga potência.

Vale do Anhangabaú: Bons shows, apesar da pane
O Anhangabaú concentrou alguns dos momentos mais marcantes da Virada. A abertura no sábado com Orquestra Sinfônica Heliópolis, e participação de Simoninha e Luciana Melo, foi recebida com entusiasmo.
Por outro lado, o samba de Belo, que deveria trazer leveza à noite, foi interrompido por uma pane no som. Ainda assim, o público seguiu presente e engajado. Em termos técnicos, os palcos centrais contaram com estrutura de som muito superior às montadas em bairros mais afastados, algo notado por quem acompanhou shows em diferentes pontos da cidade.
No domingo, o show de Liniker transformou o vale em um mar de vozes e emoção — talvez a performance mais celebrada da edição. João Gomes entrou na sequência, prejudicado pelo atraso em efeito dominó, mas manteve o brilho de um dos melhores line-ups da edição.
Um dos grandes destaques do palco foi a presença do Crocodilo, festa de aparelhagem do Pará, que fez dançar o público no intervalo dos shows principais. Com energia, DJs espertos e participações especiais das mais diversas, o palco secundário trouxe o clima dos anos áureos em que as festas de rua entravam madrugada à dentro no Centro.
Fora do centro: som aquém, mas presença importante
Na Zona Norte, o palco na Freguesia do Ó sofreu com problemas técnicos. O show de Toni Garrido — que chegou a cantar no meio do público, pulando a grade — teve som ruim, situação que se repetiu com Luísa Sonza, headliner da noite. Técnicos tentaram ajustar o som entre uma apresentação e outra, mas a qualidade permaneceu abaixo do esperado.
Ainda assim, foi simbólico levar grandes nomes a essas regiões. No palco de Sapopemba, na Zona Leste, o rapper Wiu foi recebido com entusiasmo por um público jovem que mal acreditava estar vendo o ídolo de perto. "Um dia fui eu ali, do lado de lá. É muito importante isso ser de graça", disse no palco, destacando o caráter democrático da Virada.
Em áreas mais afastadas, como na Zona Sul, a descentralização teve resultados variados. O show de João Gomes, com seu forró dançante, foi um dos que conseguiu empolgar o público local.

Já apresentações como a de Marcos & Belutti, no palco Freguesia-Brasilândia, teve baixa adesão, com plateias esparsas e sensação de palco deslocado da grande festa. As mudanças de horário e atrações, e a falta de informações no geral, era a grande reclamação entre o público.
Entre os artistas mais populares da Virada, Luísa Sonza entregou uma performance intensa mesmo diante das dificuldades técnicas.
Negra Li, celebrando 30 anos de carreira e o lançamento de seu novo disco, emocionou com um show potente e simbólico.
* Com colaboração de Raíssa Leal, Tarso Oliveira, Martha Alves, Beatriz Mazzei e Tiago Dias
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