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Carvão de 50 mil anos do NE é vestígio mais antigo do homem nas Américas

Em Brasília

02/10/2013 18h13

Os vestígios mais antigos de habitantes das Américas remontam a 50 mil anos e teriam vindo da África. Assim afirma a arqueóloga franco-brasileira Niede Guidon, que dedicou sua vida a pesquisar a Serra da Capivara, no Piauí, no Nordeste do país, repleta de pinturas rupestres e celebrada em uma exposição em Brasília.

"Dificilmente exista um sítio com concentração tão grande de arte rupestre", declarou à AFP a arqueóloga de 80 anos que desde os anos 1970 chefia a missão franco-brasileira que realizou as grandes escavações no parque situado no interior do Piauí.

Antiga fronteira entre as florestas amazônica e atlântica, a Serra da Capivara atraiu uma civilização de caçadores e coletores que deixou um incrível acervo de arte no local.

Muitos caminhos levam à América

Cenas de animais, cerimônias, representações de caça, luta e até a vida sexual desses antigos povoadores americanos foram eternizadas em pinturas rupestres em 940 sítios arqueológicos situados entre os impressionantes cânions da Serra.

O primeiro vestígio humano - restos de carvão de fogueiras estruturadas - data de mais de 50 mil anos, explicou Guidon, filha de pai francês e nascida em São Paulo. "Até hoje é a data mais antiga" de vestígios humanos nas Américas, destacou. A teoria é de que teriam chegado da África.

A representação de arte rupestre mais antiga da Serra tem 29.000 anos, "isto é, quando começava na Europa e na África, começava aqui também. A pedra polida, com lascas, e a cerâmica", afirmou, orgulhosa.

As descobertas nesta serra ajudaram a questionar a teoria tradicional de que o homem teria chegado das Américas há 12 mil anos, vindo da Ásia, cruzando o estreito de Bering rumo ao Alasca.

Outros sítios nas Américas, como Valsequillo no México e Monte Verde no Chile, com indícios de populações com dezenas de milhares de anos, levaram os arqueólogos a supor que os moradores das Américas chegaram por várias vias e em várias épocas, explicou à AFP a arqueóloga Gisele Daltrini Felice.

Em busca de turistas

A "Serra da Capivara" foi declarada Patrimônio da Humanidade em 1991 pela Unesco, mas apenas alguns milhares de turistas a visitam a cada ano.

"Depois de muito esforço, temos 20 mil visitantes por ano. Qualquer patrimônio da Humanidade recebe milhões, e nós estamos preparados para receber milhões", explicou Guidon, desanimada com a falta de recursos para promover o imenso parque, próximo à cidadezinha de São Raimundo Nonato, que há anos tenta concluir a construção de um aeroporto.

Uma centena de peças do sítio arqueológico estão expostas desde quarta-feira em Brasília: cerâmicas, pinturas, restos de flechas e de animais extintos como a mandíbula de uma preguiça-gigante e restos do haplomastodonte, um parente do elefante.

"A ideia é promover um turismo cultural, histórico e natural que pode ajudar o desenvolvimento de áreas próximas aos grandes parques do Brasil, e especialmente a Serra da Capivara, que tem as infraestruturas mais modernas", com 172 sítios para visitar, uma natureza exuberante, um grande museu e laboratórios avançados, mas ainda pouco conhecido, explicou Jerome Poussielgue, encarregado de cooperação da delegação da UE (União Europeia).

A UE patrocina a exposição e um ciclo de conferências com a Unesco, o Instituto de Parques e o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico brasileiros.

Guidon lembrou que o interior do Piauí é uma região extremamente pobre que ganharia muito com o turismo. A fundação que lidera as pesquisas no parque impulsiona projetos de desenvolvimento - como uma fábrica de cerâmica que reproduz as pinturas rupestres - que dão prioridade às mulheres.

"Queríamos ajudar o desenvolvimento de uma região onde as mulheres sofrem uma violência enorme", disse Guidon. Hoje as guaritas de acesso ao parque são guardadas por mulheres.