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Facebook liga assessor de Bolsonaro a fake news; PT pedirá que TSE use relatório em ação

09/07/2020 20h23

Por Lisandra Paraguassu e Jack Stubbs

BRASÍLIA/LONDRES (Reuters) - A investigação do Facebook que derrubou uma rede de páginas ligadas à produção de fake news levou as suspeitas para dentro do Palácio do Planalto, com um dos assessores da Presidência, Tercio Arnaud Tomaz, sendo apontado como um dos operadores das páginas suspensas, e pode aumentar a pressão nos processos que correm contra o presidente Jair Bolsonaro no TSE.

Autor de ação pela cassação da chapa Bolsonaro-Mourão pelo uso de notícias falsas ainda sendo analisado pelo Tribunal Superior Eleitoral, o PT --cujo candidato Fernando Haddad foi derrotado no segundo turno por Bolsonaro-- informou à Reuters que vai peticionar à corte até sexta-feira que requisite o relatório do Facebook para ser incluído no processo.

Segundo a assessoria do TSE, apenas o partido, como autor da ação, pode fazer essa requisição.

O relatório preparado para o Facebook pelo Laboratório Forense Digital do Atlantic Council, mostra que Tercio --que trabalhou com as mídias digitais da campanha de Bolsonaro e hoje tem o cargo de assessor especial da Presidência-- é o criador da página @bolsonaronewsss no Instagram, que também pertence ao Facebook.

A página tinha cerca de 492 mil seguidores e 11 mil posts. Apesar de ter sido criada anonimamente, os pesquisadores conseguiram rastreá-la até Tercio. Segundo o relatório, seu conteúdo era "enganoso em muitos casos, empregando uma mistura de meias-verdades para chegar a conclusões falsas", e ataques a adversários e ex-aliados do clã Bolsonaro. Na foto, uma imagem do presidente.

"Muitas dessas postagens foram publicadas durante o horário de trabalho, o que pode ser uma indicação de que Tercio Arnaud estava postando neste site --que não está oficialmente conectado à Presidência-- durante o horário oficial do gabinete", complementa o relatório.

Tercio trabalhou diretamente com o vereador Carlos Bolsonaro filho do presidente, em seu gabinete e foi levado à campanha presidencial para ajudá-lo a cuidar das redes sociais do então candidato. É frequentemente apontado como o chefe do "gabinete do ódio", um grupo de jovens leais ao clã, todos com cargos no Palácio do Planalto, encarregados de alimentar as redes bolsonaristas em defesa do presidente e ataques a seus inimigos.

O Planalto sempre negou oficialmente a existência do "gabinete do ódio" e a atuação dos assessores na produção da notícias falsas, ou mesmo o envolvimento do presidente e seus filhos com blogueiros e influenciadores digitais que estão sendo investigados nos inquéritos das fake news e dos atos antidemocráticos.

A identificação de Tercio como um dos criadores e operadores das páginas de informações falsas as leva para dentro do Palácio do Planalto, mas ele não é o único que chega muito perto do clã Bolsonaro.

Dois assessores parlamentares do deputado Eduardo Bolsonaro, o filho 03 do presidente, também foram identificados como autores de páginas de notícias falsas. Paulo Eduardo Lopes, o Paulo Chuchu, seria o autor da página "Brazilian Post", uma das que o Facebook identificou como uma das que se tentavam passar por sites jornalísticos oficiais.

Eduardo Guimarães, outro assessor de Eduardo, já havia sido identificado pela CPI das Fake News como autor de postagens de ódio, usando equipamentos do próprio gabinete parlamentar na Câmara dos Deputados.

Outras três pessoas identificadas têm ligação direta com deputados estaduais do PSL do Rio e de São Paulo, ligados à ala bolsonarista do partido.

"Parte da rede foi criada antes das eleições de 2018 e atuou para promover Bolsonaro e atacar seus oponentes durante a campanha, às vezes empregando meios de comunicação hiperpartidários. Esse comportamento é consistente com relatos de como o suposto Gabinete de Ódio opera", informou o relatório.

"Mais recentemente, algumas das contas atacaram o Congresso e o Supremo Tribunal Federal e, assim como Bolsonaro, vendiam a idéia de que a Covid-19 não era uma ameaça séria, sugerindo que o Brasil não deveria adotar medidas de distanciamento social."

A Reuters procurou Paulo Eduardo Lopes e Eduardo Guimarães através do gabinete de Eduardo Bolsonaro, sem sucesso. Tercio Arnaud também não respondeu às ligações.

Até meados da tarde desta sexta o Palácio do Planalto não se manifestou sobre a ação do Facebook.

Em sua conta no Twitter, Eduardo criticou a ação em vários posts, acusando o Facebook de se vender a grandes corporações e de pegar carona nos inquéritos de Fake News e atos antidemocráticos que, segundo ele, visam atacar a direita do país.

"Defendo a liberdade de expressão a todos, lembrando que é cada vez mais notável a perseguição de redes sociais a perfis de direita, dentro e fora do Brasil, mesmo sem haver crime nos posts/perfis", escreveu o deputado.

O Facebook chegou a relacionar algumas das páginas derrubadas a pessoas ligadas ao senador Flávio Bolsonaro, filho mais velho do presidente, mas o levantamento do laboratório digital não conseguiu encontrar os vínculos. Flávio, no entanto, também reclamou da ação no Twitter.

"Minha solidariedade a todos os perfis que foram injustamente censurados por Facebook e Instagram --aparentemente por apoiarem o presidente Bolsonaro. Assim que criarem seus novos perfis para exercerem a sagrada liberdade de expressão, avisem no privado ajudarei a divulgá-los", escreveu.

Mais tarde nesta quinta-feira, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), pediu ao ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, relator de inquéritos sobre fake news e ameaças à corte, que investigue as páginas de apoio ao presidente removidas pelo Facebook.

Randolfe pede ao ministro que "determine as medidas cabíveis contra as pessoas já identificadas pelo Facebook, bem como que diligencie junto à empresa para o compartilhamento de todos os dados, que poderão ser utilizados no aprofundamento das investigações, sobretudo sobre quem financia e quais agentes públicos participam, com a ​quebra dos sigilos telemáticos, bancários e quaisquer outros necessários​".

(Reportagem adicional de Maria Carolina Marcello)