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Por que essa gota de vidro suporta marteladas e estilhaça com um toque?

Gota pode vencer até mesmo a pressão de prensas Imagem: Reprodução/Instagram

De Tilt, em São Paulo

09/10/2025 05h30

Um vidro que desafia prensas hidráulicas e marteladas, mas que se desfaz em mil pedaços ao menor toque em sua cauda.
Esse é o paradoxo das chamadas Gotas do Príncipe Rupert, um objeto estudado há séculos e que ainda hoje intriga engenheiros e físicos.

Criadas pelo acaso, transformaram-se em chave para compreender como forças de compressão e tensão atuam nos materiais. Esse fenômeno ganhou as redes sociais, onde a estrutura é testada ao extremo. Conversamos com engenheiros para entender o que há por trás desse material.

O que é

As Gotas do Príncipe Rupert não nasceram como invenção planejada, mas como descoberta de artesãos de vidro no século 17. O fenômeno acontece quando o vidro fundido é resfriado em água fria, formando uma peça com "cabeça" robusta e "cauda" frágil.

Quem levou o objeto à fama foi o príncipe Rupert do Reno, que apresentou a gota à corte inglesa em 1660. Desde então, elas se tornaram curiosidade científica e ajudaram a desenvolver técnicas que inspiraram o vidro temperado usado hoje em celulares.

De um fenômeno aparentemente simples, a gota se tornou um professor valioso na ciência dos materiais.
Victor Henriques, engenheiro civil especializado em análise e verificação de estruturas, CEO da Help Reformas e Construções

O que torna a gota tão resistente?

Quando o vidro incandescente entra em contato com a água fria, a superfície esfria primeiro, formando uma casca rígida. O interior quente demora a resfriar e, ao se contrair, fica preso dentro da casca sólida, gerando compressão permanente.

A compreensão criada pelo rápido resfriamento cria uma espécie de armadura de proteção muito resistente. "Essa compressão transforma a cabeça em uma espécie de armadura, que distribui qualquer impacto e impede a propagação de trincas", explica Henriques.

O vidro é frágil quando puxado, mas incrivelmente forte quando espremido. A compressão funciona como um sistema de defesa ativo.
Victor Henriques, engenheiro civil

Vidro passa por uma espécie forja. "A superfície fica em compressão, sendo mais difícil de trincar e quebrar. É como se fizéssemos a forja do vidro sem quebrá-lo, explica Paulo Henrique Campos Prado Tavares, professor de Engenharia do Ibmec (Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais) e doutor em materiais e processos industriais.

Resistência e fragilidade

A mesma compressão que fortalece a cabeça cria um desequilíbrio na cauda, que esfria de forma diferente e acumula tensão. Isso transforma a ponta fina no ponto mais vulnerável da gota, bastando um toque mínimo para liberar toda a energia acumulada.

Quando a cauda se rompe, a energia se espalha em milissegundos e a gota explode em milhares de fragmentos. "O toque na cauda provoca um desequilíbrio entre as forças de compressão na superfície e as de tração no interior", explica Tavares.

Estrutura se compara a um fio de tecido quando puxado. "É como puxar um fio solto em um tecido muito esticado: uma vez que o fio se solta, toda a estrutura pode se desfazer dramaticamente", afirma Henriques.

Comparado a vidro temperado e tela do celular

O comportamento é semelhante ao vidro temperado usado em carros e boxes de banheiro, que também acumula tensões internas. Assim como a gota, esse vidro pode resistir a impactos fortes, mas se quebrar em milhares de fragmentos se atingido em pontos vulneráveis. O princípio também se compara a liberações súbitas de energia em falhas geológicas, que resultam em terremotos.

Inspirada no fenômeno, a indústria desenvolveu técnicas de têmpera térmica e química para criar vidros resistentes. No processo químico, íons maiores substituem íons menores na superfície do vidro, criando uma pele comprimida que aumenta sua resistência. "Esse é o princípio aplicado em telas de celulares, que suportam quedas e arranhões sem quebrar facilmente", explica Henriques detalha.

Essa camada comprimida é o que faz as telas de celulares serem tão resistentes a impactos, replicando a armadura da cabeça da gota
Victor Henriques, engenheiro civil

Embora a compressão aumente a força do vidro, existe um limite. Tensões excessivas podem tornar o material instável e predisposto a falhas. Por isso, engenheiros buscam sempre o equilíbrio entre robustez e previsibilidade.

Em certos testes, a cabeça da gota pode resistir mais que alguns metais comuns em impacto direto. Porém, diferente do metal, o vidro é quebradiço e não se deforma antes de romper.

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