Não foi para se aquecer: por que nossos ancestrais usaram fogo pela 1ª vez?
Colaboração para Tilt
17/06/2025 05h30
Uma pesquisa liderada por especialistas da Universidade de Tel Aviv, em Israel, sugere que Homo erectus usava fogo para aumentar vida útil dos alimentos e afastar predadores da comida. O estudo foi publicado na revista científica Frontiers in Nutrition em maio.
O que aconteceu
Uso primário do fogo seria para defumar e desidratar carne de grandes animais. Pesquisa propõe que a preservação da carne a proteção dela contra predadores foram provavelmente as motivações iniciais para o uso do fogo pelo Homo erectus, uma das espécies ancestrais aos Homo sapiens, durante o período Paleolítico Inferior.
Maioria dos sítios datados entre 1,8 milhão e 800 mil anos atrás não tem evidência de fogo. A produção das chamas era ocasional, em locais específicos e com propósitos pontuais. "O processo de coletar combustível, acender o fogo e mantê-lo aceso ao longo do tempo exigia um esforço significativo, e eles precisavam de um motivo convincente e energeticamente eficiente para fazê-lo", disse Miki Ben-Dor, um dos responsáveis pela pesquisa, ao portal EurekAlert.
Há apenas nove locais do tipo espalhados pelo mundo. Há dois em Israel, seis em países da África e um na Espanha. Além desses sítios, os arqueólogos se basearam também em estudos etnográficos de sociedades contemporâneas de caçadores-coletores, alinhando seu comportamento com as condições que prevaleciam nos ambientes em que viviam.
Todos os locais estudados tinham grandes quantidades de ossos de animais de grande porte, como elefantes, hipopótamos e rinocerontes. "A partir de estudos anteriores, sabemos que esses animais eram extremamente importantes para a dieta dos primeiros humanos e forneciam a maior parte das calorias necessárias", explicou Ben-Dor. A carne e a gordura de um único elefante, por exemplo, contêm milhões de calorias, o suficiente para alimentar um grupo de 20 a 30 pessoas por um mês ou mais.
Um elefante ou hipopótamo caçado era, portanto, um verdadeiro tesouro —uma espécie de "banco" de carne e gordura que precisava ser protegido e preservado por muitos dias. Ben-Dor, ao portal EurekAlert
Preocupação com a preservação das presas é observada de diversas formas no Paleolítico. "Foi demonstrado que humanos do Paleolítico preservaram intencionalmente a medula óssea dentro de ossos de membros de gamos [espécie de mamífero semelhante ao veado] por várias semanas enquanto armazenados em uma caverna, reforçando, assim, a atenção dada à preservação de alimentos no período", explica a pesquisa.
Além da conservação do alimento, os Homo erectus precisavam protegê-lo de diferentes espécies com as quais dividia o habitat. Dependendo do tamanho da presa, o alimento poderia durar por dias, semanas e até meses. "Durante esse período prolongado, a carcaça parcialmente consumida inevitavelmente atrairia predadores e necrófagos [animais que se alimentam de cadáveres], elevando o risco tanto para a presa quanto para o grupo humano", diz o estudo.
O ganho relativo de retorno energético decorrente da prevenção da deterioração e do roubo de presas supera substancialmente os ganhos que o cozimento poderia proporcionar e, portanto, deveria ter sido um fator mais provável para a produção de fogo. Trecho do estudo publicado no periódico Frontiers in Nutrition
Outros usos do fogo foram implementados ao longo do tempo. O calor passou a ser utilizado para aquecimento dos próprios humanos, realização de rituais, processamento de matéria-prima, geração de luz e proteção contra insetos.
Benefício oferecido pelas chamas teria que ser suficiente para justificar o esforço físico necessário para criá-las. "Sustentar o fogo incorre em custos energéticos, necessitando de um retorno energético líquido positivo para justificar sua produção e manutenção", conclui a pesquisa.