Do tamanho do Grand Canyon: como vales se formaram na Lua em poucos minutos

Um estudo elaborado por cientistas dos EUA e da Inglaterra detalha como foi o surgimento de dois enormes vales formados na Lua a partir do impacto de um asteroide ou de um cometa há 3,8 bilhões de anos. Cada um dos cânions tem quase 300 quilômetros de extensão.

O que aconteceu

Equipe analisou a formação de duas estruturas na Lua com largura e profundidade "compatíveis ao Grand Canyon", nos EUA. A pesquisa foi realizada por especialistas do Instituto Lunar e Planetário, dos Estados Unidos, e Departamento de Ciências da Terra e Engenharia do Imperial College de Londres. O resultado foi publicado na revista especializada Nature Communications na última terça-feira (4).

Segundo o estudo, uma colisão com alto poder energético provocou a formação dos cânions na face conhecida como "o lado oculto da Lua". Com o choque, fluxos de rochas foram ejetados da bacia de impacto Schrödinger —formada por grandes colisões na superfície da Lua, em que o impacto pode provocar crateras extensas. A bacia de impacto Schrödinger, por exemplo, tem cerca de 320 quilômetros de diâmetro.

À esquerda, a vista orbital da bacia de impacto de Schrödinger e dois cânions esculpidos; à direita, projeção da bacia com a manta contínua de material ejetado em bege e os raios de cratera secundários em vermelho
À esquerda, a vista orbital da bacia de impacto de Schrödinger e dois cânions esculpidos; à direita, projeção da bacia com a manta contínua de material ejetado em bege e os raios de cratera secundários em vermelho Imagem: Divulgação/Nature Communications

Para elaborar a pesquisa, os cientistas utilizam o mapeamento fotogeológico dos cânions. A equipe também analisou depósitos de material ejetado a partir de impactos relacionados, com a intenção de identificar a trajetória do asteroide ou cometa que se chocou contra a Lua e formou os vales em questão, identificados próximos ao polo sul lunar.

De acordo com o estudo, todo o processo de formação dos cânions aconteceu rapidamente. "As direções do fluxo dos detritos ejetados e a velocidade de seu subsequente impacto com a superfície lunar são calculadas, assim como a energia que esculpiu os cânions, em menos de dez minutos". Segundo os cientistas, ambos os cânions sofreram erosão ao longo dos bilhões de anos que se passaram desde o seu surgimento na superfície da Lua.

A energia para produzir os grandes cânions na Lua é de 1.200 a 2.200 vezes maior do que a energia da explosão nuclear uma vez planejada para escavar um segundo Canal do Panamá na Terra, mais de 700 vezes maior do que o rendimento total dos testes de explosão nuclear dos EUA, URSS e China, e cerca de 130 vezes maior do que a energia no inventário global de armas nucleares. Trecho do estudo

Os cânions encontrados ganharam nomes dos pesquisadores: Vallis Schrödinger e Vallis Planck. O cânion Vallis Schrödinger tem aproximadamente 270 quilômetros de comprimento, 20 de largura e 2,7 de profundidade. Segundo o estudo, este cânion está localizado "dentro dos limites da manta contínua de material ejetado". Quinze crateras secundárias foram identificadas ao longo do Vallis Schrödinger, com diâmetros entre 10 e 16 km, um tamanho "consideravelmente maior do que a teoria poderia sugerir", diz o estudo.

Já o Vallis Planck tem cerca de 280 quilômetros de comprimento, 27 de largura e 3,5 de profundidade. No caso deste cânion, um raio de crateras secundárias se estende por 860 quilômetros além da manta contínua de material ejetado.

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Para efeito de comparação, os cientistas citam o Grand Canyon, cânion formado no estado do Arizona (EUA). O local tem 446 quilômetros entre os pontos de Lees Ferry e Grand Wash Cliffs.

Enquanto o Grand Canyon do Arizona foi escavado pela água ao longo dos últimos cinco a seis milhões de anos e a partir de paleocânions integrados que se formaram ao longo de 70 milhões de anos, o Vallis Schrödinger e o Vallis Planck da Lua foram escavados por correntes de rocha impactante em menos de 10 minutos. Trecho do estudo

Vista aérea das partes sul e norte do Grand Canyon, nos EUA
Vista aérea das partes sul e norte do Grand Canyon, nos EUA Imagem: Adobestock

Futuras missões espaciais podem colher materiais no local e fornecer mais informações sobre a formação da Lua e do Sistema Solar como um todo. "O registro do bombardeio inicial do Sistema Solar foi apagado da Terra. Foi destruído pela erosão, tectônica de placas e outros processos geológicos. Se quisermos entender como os eventos de impacto afetaram a Terra primitiva, precisamos coletar amostras de lugares na Lua como a bacia Schrödinger e seus cânions", explicou David Kring, cientista principal do Instituto Lunar e Planetário e líder do estudo, à rede norte-americana CNN.

O que é o lado oculto da Lua?

O lado oculto é a superfície lunar que não é vista da Terra. "Isso ocorre porque a interação da gravidade entre a Terra e a Lua desacelera a Lua em uma rotação que acompanha a sua própria rotação. A Lua gira, mas gira na mesma velocidade que orbita ao redor da Terra. Isso mantém o mesmo lado sempre voltado para nós", explica a Nasa.

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Assim como o lado visível da Terra, o lado oposto passa por um ciclo completo de fases. No entanto, o terreno do lado oculto é diferente da superfície vista por nós: nele, não há as grandes manchas escuras, chamadas de marias (mares em latim). No lado oculto, predominam crateras de todos os tamanhos. "O outro lado também abriga uma das maiores e mais antigas formações de impacto do Sistema Solar, a bacia do Pólo Sul-Aitken", relata a agência espacial americana.

O "outro lado" foi visto pela primeira vez em imagens granuladas enviadas pela sonda soviética Luna 3, que girou em torno da Lua em outubro de 1959. Em 2009, a nave Lunar Reconnaissance Orbiter foi lançada ao espaço, onde colhe dados para que os cientistas elaborem mapas detalhados da Lua, inclusive de seu lado oculto.

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