Inimigo das caixas de som: como funciona aparelho que silencia Bluetooth
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O vídeo compartilhado pelo turista argentino Roni Baldini que mostra um aparelho silenciando uma caixa de som em uma praia brasileira está repercutindo nas redes sociais. Mas como o equipamento funciona?
Entenda
Ilegal no Brasil, o aparelho funciona como um emissor que "suja" a radiofrequência desejada —no caso, o Bluetooth. A interferência impede a conexão adequada para a troca de informações, impedindo a emissão do som. O princípio do equipamento montado e usado pelo argentino é o mesmo do bloqueador de sinais de celular em presídios.
Você tem a caixa de som e o que está gerando o fluxo de dados que vai para a caixa [possivelmente o celular]. O aparelho do turista faz um 'corte' nesse link de comunicação. Você não consegue fazer a associação do celular com a caixa e acaba não transmitindo o dado, silenciando a caixa de som.
Gustavo Correa Lima, gerente de Soluções de Conectividade do CPQD (Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações)
Um bloqueador pode ser projetado para agir apenas sobre um tipo de sinal ou sobre vários sinais simultaneamente, a depender da configuração do dispositivo. Bloqueadores específicos são programados para bloquear uma faixa de frequência específica, como Bluetooth ou GPS. Já os bloqueadores múltiplos podem interferir em várias faixas de frequência ao mesmo tempo, incluindo sinais de Wi-Fi, redes móveis (3G, 4G, 5G) e rádio AM/FM, explica Sthefano Cruvinel, CEO da EvidJuri e coordenador de doutrinas de inovação no âmbito tecnológico e jurídico.
É possível que o aparelho do turista tenha afetado o funcionamento de outros aparelhos. Lima destaca que isso acontece porque aparelhos de baixa qualidade geram irradiações até fora da frequência que se deseja atingir —no caso do vídeo, o Bluetooth.
O argentino pode ter desligado outra caixa de som, o Wi-Fi de um quiosque na praia e até bloqueado o funcionamento de uma maquininha de cartão de algum ambulante que estava cobrando ali na praia.
Gustavo Correa Lima, gerente
Todo equipamento que irradia radiofrequência precisa passar por um processo de homologação na Anatel. Após a aprovação, ele ganha um selo da agência e pode operar no Brasil. "A homologação é exigida para garantir que o equipamento não causará interferências prejudiciais às redes de telecomunicações e outros dispositivos", afirmou Cruvinel.
Mesmo que tentasse certificar o aparelho no Brasil, o argentino não conseguiria, diz Lima. Segundo o gerente, como o aparelho do turista deve afetar toda a banda de radiofrequência do Bluetooth, podendo interferir até em outras frequências, a Anatel não iria aprová-lo. "Como os jammers [bloqueadores] têm como finalidade principal a interferência deliberada em sinais, eles não podem ser homologados pela Anatel", acrescentou Cruvinel.
Bloqueadores de sinais são proibidos no Brasil
O uso e a comercialização dos bloqueadores, também conhecidos como jammers, são ilegais no país. Todavia, há exceções em situações específicas autorizadas pela Anatel. Cruvinel aponta que o aparelho de Baldini se enquadraria como infração no artigo 183 da Lei Geral de Telecomunicações, que discorre sobre a proibição de qualquer equipamento que emita sinais para interferir em comunicações de rádio. "Vejo que ele se enquadra no artigo, pois o equipamento pode, se comercializado em grande escala, interferir diretamente em comunicações via rádio."
Lei Geral de Telecomunicações prevê que a pena de dois a quatro anos de reclusão, além de multa, para quem opera ou comercializa equipamentos sem homologação ou licença. A proibição é para todos os tipos de bloqueadores de sinais, visto que nenhum possui autorização para comercialização e uso até o momento no território nacional.
Para Cruvinel, ainda é possível ser enquadrado em um crime no Código Penal. Ele relembrou que, conforme previsto em lei, a importação ou comercialização de mercadorias proibidas pode configurar crime de contrabando, com pena de dois a cinco anos de reclusão. Além disso, o usuário ou revendedor pode ser responsabilizado civilmente caso o uso do aparelho cause danos a terceiros, como danificação do aparelho que foi "bloqueado".
Essas são algumas das diversas penas que tal ato pode causar para o usuário, comprador ou revendedor. Costumo brincar, que em casos assim a justiça pode escolher de olhos fechados o artigo da lei que irá encaixar o ato, pois são tantos os possíveis descumprimentos causados por esse aparelho e a comercialização que as opções são diversas.
Sthefano Cruvinel, CEO da EvidJuri
CEO diz que o uso dos jammers pode ser considerado uma violação da privacidade. Ele cita a interferência na comunicação de terceiros sem o consentimento deles, ferindo os direitos garantidos pela Constituição Federal. "O uso de um jammer para bloquear a comunicação entre aparelhos também pode ser interpretado como uma forma de interferência ilegal em dados ou comunicações, violando o direito à privacidade e ao sigilo das informações."
Advogado criminalista diz não ver punição criminal para o uso de apenas um aparelho na praia, por exemplo, já que ele não tem o poder de bloqueio em grande escala. Rafael Paiva, mestre em Direito e professor de Direito Penal e Processo Penal, disse ver a possibilidade de apreensão do equipamento. No entanto, ressalta que há municípios em que as leis que proíbem o uso de caixas de som, enquadrado como perturbação de sossego.
Em nota, Anatel diz que faz fiscalizações em todo o país para evitar a comercialização de produtos irregulares de telecomunicações, incluindo aqueles sem homologação.
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