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Oumuamua não é nave alienígena, só cometa 'soltando gases', diz estudo

O asteroide Oumuamua é um dos objetos mais longos que já foram observados pelos cientistas - ESO/M. Kornmesser
O asteroide Oumuamua é um dos objetos mais longos que já foram observados pelos cientistas Imagem: ESO/M. Kornmesser

Felipe Oliveira

Colaboração para Tilt, de São Paulo

24/03/2023 14h43

Sem tempo, irmão

  • Oumuamua foi descoberto em 2017 e já foi classificado como asteroide, acumulado de poeira, parte de um pequeno planeta e até mesmo nave alienígena.
  • Novo estudo classifica o objeto como "cometa escuro", já que ele não possui cauda nem brilho.
  • O Oumuamua estaria se deslocando por meio de uma liberação de gás de moléculas de hidrogênio.
  • Isso seria possível graças ao tamanho do Oumuamua (cerca de 120 metros), que é bem menor do que outros comentas já conhecidos.

Desde quando foi descoberto por cientistas em 2017, o Oumuamua despertou a curiosidade sobre o que poderia ser o misterioso objeto interestelar. Como o estranho "visitante" cruzou o Sistema Solar três vezes mais rápido que um cometa comum, viajando a 87 quilômetros por segundo, muitos cientistas consideravam que fosse uma espaçonave alienígena. Outros achavam que fosse um asteroide ou ainda o estilhaço de um planeta minúsculo de um sistema planetário diferente do nosso.

O mistério parece ter sido finalmente solucionado por um estudo publicado na revista Nature nesta semana: o Oumuamua é um novo tipo de cometa, que não brilha e solta gases.

A principal dúvida estava relacionada a velocidade e aceleração. Como seria possível que aquele objeto, ao sair do sistema solar, acelerasse como um comenta, mas não brilhasse como um desses corpos celestes?

Os cometas do sistema solar costumam "acelerar" porque recebem um impulso adicional de água e poeira que evaporam de seus núcleos gelados conforme vão sendo aquecidos pelo Sol. O que intrigou os astrônomos era justamente o fato de o Oumuamua não dar nenhum sinal de possuir cauda.

A charada foi desvendada por Darryl Seligman, bolsista de pós-doutorado da National Science Foundation na Cornell University, e Jennifer Bergner, professora assistente de química na Universidade da Califórnia, em artigo publicado nesta quarta-feira (22) na Nature. Eles classificaram o Oumuamua como "cometa escuro.

Precisávamos de algo que fosse examinado tão intensamente quanto Oumuamua, porque era interestelar, para perceber que existe essa nova população de cometas escuros dentro do próprio sistema solar
Darryl Seligman

No artigo, os dois cientistas argumentam que o gás hidrogênio liberado pelo aquecimento do gelo de água amorfa provavelmente impulsionou a aceleração não gravitacional de Oumuamua.

A controvérsia na informação ocorre porque o hidrogênio exigiria temperaturas extremamente baixas para congelar em objetos do tamanho de Oumuamua. Além disso, os cientistas não esperam tais temperaturas dentro das densas nuvens moleculares onde esses objetos se formam.

O que diz o novo estudo?

Os cálculos de Seligman apontam que o Oumuamua não recebia luz solar suficiente para liberar gás a partir do aquecimento de água e poeira, como ocorre com os cometas já conhecidos. Assim, o especialista sugeriu que o gás liberado pelo Oumuamua poderia ser oriundo de elementos chamados de hipervoláteis — talvez monóxido de carbono ou algum gelo exótico, como hidrogênio ou nitrogênio sólidos.

A partir desses cálculos, Jennifer Bergner começou a se questionar se o hidrogênio molecular poderia ser o responsável pela propulsão do cometa. Foi então que observou que experimentos da década de 1970 mostraram que, quando o gelo é atingido por radiação energética (semelhante aos raios cósmicos), suas moléculas podem se separar, deixando várias bolhas de gás hidrogênio presas.

Como o Oumuamua tem cerca 120 metros de largura em forma de panqueca, algo bem diferente dos cometas comuns, os pesquisadores concluíram que essa liberação de gás seria suficiente para alimentar a aceleração não gravitacional.

É um cometa viajando pelo meio interestelar basicamente sendo cozido pela radiação cósmica, formando hidrogênio como resultado
Bergner, no comunicado divulgado pela Universidade da Califórnia em Berkeley

E por que não tem cauda? A explicação é que a poeira ficaria presa ao Oumuamua, inviabilizando as espetaculosas caudas comuns nos cometas.

O que dizem outros cientistas?

A teoria ainda não foi tão bem aceita por outros especialistas no assunto. Em entrevista ao "The New York Times", Avi Loeb, astrônomo de Harvard que propôs que Oumuamua poderia ser um objeto alienígena, discordou da ideia devido à falta de cauda.

Os autores do novo artigo afirmam que era um cometa de gelo de água, embora não tenhamos visto a cauda do cometa. É como dizer que um elefante é uma zebra sem listras
Avi Loeb

Karen Meech, especialista em cometas do Instituto de Astronomia da Universidade do Havaí, também estudou o Oumuamua. Ela, porém, afirmou ao NYT que o artigo era "uma explicação muito interessante".

Perseguição espacial

As curiosidades a respeito do Oumuamua são tantas que o instituto britânico Iniciativa para Estudos Interestelares (i4is, na sigla em inglês) criou o Projeto Lyra, com o objetivo de alcançar o Oumuamua em 22 a 26 anos por meio de uma nave que seria "empurrada" pela gravidade de Júpiter.

Os cientistas pretendem lançar uma nave da Terra em uma verdadeira perseguição espacial. Primeiro, ela vai dar duas voltas ao redor do nosso planeta. Assim, ganhará impulso para chegar até Vênus, onde repetirá o mesmo processo para ir a Júpiter. Lá, executaria a manobra uma última vez para ser estilingada pela gravidade do planeta rumo ao Oumuamua.