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Por que EUA discutem proibir fogão a gás (e Brasil tem problema pior)

Getty Images
Imagem: Getty Images

Thiago Varella

Colaboração com Tilt, em Campinas (SP)

16/01/2023 04h00Atualizada em 17/01/2023 11h39

O fato de o fogão a gás ser um agente poluidor e um possível risco para a saúde de crianças reacendeu nos Estados Unidos a discussão sobre a proibição ou não do equipamento no país.

O caso ganhou repercussão após a CPSC (Comissão de Segurança de Produtos de Consumo) publicar um relatório em que mostrava os danos à saúde causados pela liberação de dióxido de nitrogênio e monóxido de carbono vindo de fogões a gás, sobretudo quando desregulados, segundo reportagem da Bloomberg.

Em meio a isso, um estudo publicado em dezembro apontou que equipamentos do tipo são responsáveis por 12,7% da asma em crianças nos Estados Unidos.

O que rolou

Segunda-feira (9). Richard Trumka Jr., da CPSC, chamou os fogões a gás de "perigo oculto" e disse que a agência deve tomar alguma medida para regular o setor. O mercado se assustou, a indústria de petróleo chiou e políticos republicanos correram para reclamar da suposta proibição.

Quarta-feira (11). Alex Hoehn-Saric, diretor da CPSC, teve de usar as redes sociais para negar que o órgão pediria a proibição do uso de fogões a gás. O governo também precisou entrar na história. O porta-voz da Casa Branca, Michael Kikukawa, afirmou que o presidente Biden não pretende banir os fogões a gás.

Afinal, quais são os riscos?

Nos EUA, quando o fogão é aceso, começa a despejar metano na atmosfera. O gás é um dos causadores do efeito estufa.

Depois que o queimador acende, outros poluentes também passam a circular pela cozinha, como:

  • monóxido de carbono
  • formaldeído
  • dióxido de nitrogênio

As substâncias em excesso podem gerar problemas cardiovasculares e doenças respiratórias, já que causam inflamação nas vias aéreas. O risco é maior em ambientes mais fechados, sem ventilação.

No ano passado, a Associação Médica Americana reconheceu a ligação "entre o uso de fogões a gás, níveis internos de dióxido de nitrogênio e asma".

Depois, em dezembro, o International Journal of Environmental Research and Public Health publicou uma pesquisa que estima que quase 13% dos casos de asma infantil nos EUA são causados pelo uso de fogão a gás.

É possível proibir?

Nos EUA, 38% das casas, o que equivale a 40 milhões de lares, utilizam fogão a gás, o que torna a proibição virtualmente impossível de ser concretizada.

O que deve acontecer por lá, além do marketing para a troca por fogões por indução, é começar a exigir que novos fogões a gás sejam vendidos com um exaustor para ventilação externa.

Há também uma campanha para que as cozinhas nos EUA sejam mais bem ventiladas, justamente para que os gases não se acumulem dentro de casa.

No Brasil, o problema é outro

Por aqui, o fogão a gás é o queridinho das famílias. Apesar da tendência dos cooktops, poucas pessoas possuem fogão por indução. No entanto, há um problema mais grave para ser resolvido. Ainda há um grande número de famílias utilizando a lenha no lugar do gás.

Segundo a PNAD Contínua de 2019, quase 20% das famílias brasileiras usavam lenha ou carvão para cozinhar. E, com o aumento no preço do gás de cozinha nos últimos anos, esse percentual pode ter aumentado.

Segundo Adriana Gioda, professora de química atmosférica da PUC-Rio e pesquisadora sobre o tema, os riscos de poluição do uso de lenha e carvão são muito maiores.

"Aqui, a população pode até ter fogão a gás em casa, mas, se não tiver dinheiro para o botijão, usa lenha. E essa lenha é utilizada em fogões rudimentares. A queima é extremamente poluente e ultrapassa os níveis toleráveis de poluição", afirmou.

"Antes de pensar em substituir o fogão a gás, a gente tem de pensar em maneiras de fazer essa população pobre usar um fogão mais moderno", completou.

Além disso, a realidade brasileira é diferente dos EUA. Pelo fato de ser um país mais quente, as cozinhas por aqui são mais ventiladas do que nos países do hemisfério norte, o que reduz os riscos da poluição dentro de casa.

O gás usado pelos fogões brasileiros, na maior parte dos casos, também é diferente. Os botijões trazem o chamado GLP (gás liquefeito de petróleo), que é uma mistura de propano e butano. Apenas as residências com gás encanado — em geral apartamentos — usam o metano.

"O metano é um gás de efeito estufa, mas o propano e o butano não são. Apenas depois da queima é que o GLP também passa a emitir gases poluentes. E o metano traz mais um problema que são os vazamentos que ocorrem desde a extração do gás natural até a sua distribuição", concluiu Gioda.

*Com informações dos sites Vox e Wired