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Tornozeleira eletrônica é segura? Como monitora presos? Dá para escapar?

Deputado federal bolsonarista Daniel Silveira (PTB-RJ) diz que tornozeleira eletrônica adquiriu "vida própria" - Reprodução/Twitter/vlogdolisboa
Deputado federal bolsonarista Daniel Silveira (PTB-RJ) diz que tornozeleira eletrônica adquiriu "vida própria" Imagem: Reprodução/Twitter/vlogdolisboa

Marcella Duarte

Colaboração para Tilt, em São Paulo

04/04/2022 17h53Atualizada em 05/04/2022 21h59

O uso de uma tornozeleira eletrônica é determinado pela Justiça para monitorar presos em regime aberto e semiaberto. A tecnologia, já bem antiga, virou assunto nesta segunda-feira (4), pois a que foi colocada no deputado federal bolsonarista Daniel Silveira (PTB-RJ) adquiriu "vida própria", segundo seu advogado.

A polêmica levantou questionamentos sobre: como o equipamento funciona? Como é capaz de monitorar presos? Dá para enganar a polícia? Confira a seguir respostas para essas e outras dúvidas sobre o equipamento. Mas, antes, entenda o que rolou.

Equipamento teria "vida própria"

A defesa de Silveira, preso e investigado por fazer ataques ao STF (Supremo Tribunal Federal) e à democracia, afirmou que a tornozeleira eletrônica emite "ruídos estranhos" e "vibrações" esporádicas. Por isso, a substituição do aparelho foi solicitada ontem.

Silveira colocou a tornozeleira na última quinta-feira (31), na sede da Polícia Federal, em Brasília. Seu advogado quer que o aparelho seja submetido à perícia, pois o deputado questiona a "integridade e confiabilidade do equipamento".

Ele acrescenta que a tornozeleira pode ter "escuta". Ou seja, conseguiria monitorar o que está sendo falado próximo a ela. A Polícia Federal ainda não se pronunciou oficialmente sobre o caso.

Por que a tornozeleira existe?

A tornozeleira eletrônica foi regulamentada no Código Penal brasileiro em 2010, como uma medida para diminuir a superlotação das penitenciárias e reduzir gastos do sistema prisional, já que os investigados/condenados poderiam ficar em prisão domiciliar e serem monitorados 24 horas por dia. Com os anos, ela passou a ser cada vez mais utilizada no regime semiaberto também.

Segundo números do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), em 2015, pouco mais de 18 mil pessoas usavam o equipamento em todo o país; em 2020, eram 51.897 mil. Um salto de 285%.

Em termos de economia, enquanto cada detento custa aos cofres públicos cerca de R$ 2 mil por mês, os gastos com a tornozeleira e seu sistema firam em torno de R$ 300 mensais, variando de estado para estado.

Quem pode usar a tornozeleira?

O ex-governador Paulo Maluf, de São Paulo, e boa parte dos condenados na Operação Lava Jato há alguns anos estão entre os "famosos" que já usaram/usam a tornozeleira eletrônica.

O equipamento pode ser direcionado para:

  • pessoas indiciadas por um crime mas que ainda não foram julgadas.
  • presos em progressão de pena ou liberdade condicional.
  • pessoas que tenham de respeitar alguma restrição de circulação ou manter distância de outras.

Como ela monitora alguém?

De modo geral, a tecnologia embutida no aparelho permite um rastreamento 24 horas por dia, para que as autoridades saibam quando alguém deixa de seguir as regras de deslocamento determinadas.

Isso obriga a pessoa a —literalmente— andar na linha, pois cada um de seus passos está sendo vigiado.

Presa ao tornozelo por uma tira de borracha, a tornozeleira pesa o mesmo que um celular: 128 gramas. Dentro, um sensor GPS e um modem fazem o trabalho; o primeiro determina a localização da pessoa, via satélite, e o segundo transmite os dados, criptografados, para a central de monitoramento, via sinal de celular.

Tanto o aparelho como o serviço de acompanhamento são fornecidos por empresas privadas, contratadas pelos governos estaduais. Essas companhias possuem funcionários que acompanham em uma tela cada passo dado por quem usar o acessório.

Por que é difícil escapar dela?

Cada tornozeleira é programada com "áreas de inclusão" previamente definidas, ou seja, regiões em que os presos podem ir, de acordo com a pena.

Alguns não podem sair de casa. Outros podem ir ao trabalho e voltar, até um determinado horário. As regiões que não contemplam as penas são incluídas na "área de exclusão" do sistema.

Em telões de controle, é exibida a movimentação de cada pessoa. Se alguém vai até onde não poderia, ou sai de casa fora do horário permitido, um alarme soa na central de monitoramento.

A central pode então

  • enviar um contato sonoro de alerta pela própria tornozeleira.
  • fazer uma ligação para solicitar o retorno (a pessoa pode explicar ser uma emergência, como uma ida ao hospital).
  • comunicar a Polícia Militar se não houver retorno.

A Secretaria de Segurança Pública do estado e o juiz responsável são avisados, para tomar as medidas cabíveis, podendo até rever a pena em liberdade.

Com o tempo, o sistema vai acumulando informação sobre o comportamento de cada um. Isso ajuda a detectar anomalias.

Se a tornozeleira eletrônica é usada por alguém que foi obrigado pela Justiça a manter distância de outra pessoa (por exemplo, um marido agressor que não pode se aproximar da ex-esposa), entra em cena outro equipamento: a Unidade Portátil de Rastreamento (UPR), que é mantida pela pessoa que solicitou a medida protetiva.

A UPR também se comunica a todo instante com a central de monitoramento, para atualizar a "área de exclusão" da pessoa que está com a tornozeleira, para que ela não se aproxime.

Dá para arrancar?

Até dá, mas a polícia será notificada. E o processo não é simples. A tira do equipamento que envolve o tornozelo é resistente, difícil de ser rompida e existe um lacre de segurança.

Dentro dela há um cabo de fibra óptica, que emite um sinal o tempo todo. Se ele for rompido, a central de monitoramento é avisada na hora e a pessoa é considerada foragida.

Tentar aproveitar as regiões sem cobertura de sinal de celular para dar uma "fugidinha" também não é uma opção. Caso o preso esteja em uma área sem cobertura móvel, a tornozeleira continua coletando e armazenando dados, para enviá-los quando houver acesso novamente.

Além disso, o equipamento dedura quando há pouca carga na bateria. Por isso, deixá-la "morrer" não funciona e é considerada uma violação.

Com o GPS sempre ligado e transmissão contínua de dados, o consumo de bateria é alto, parecido com o de um smartphone, com duração estimada em 24 horas. Uma das obrigações do preso é recarregá-la, por meio de um cabo longo.

Quando a bateria chega a apenas 25% da carga, há avisos: um bipe e uma vibração a cada 10 minutos, inicialmente, e a cada cinco minutos mais perto de se desligar.

*Com matéria de Helton Simões Gomes, para o UOL.