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Mineração de criptomoedas livra brasileiro de sufoco durante viagem aos EUA

Stênio Romao deixa seu notebook minerando criptomoedas enquanto trabalha como motorista de aplicativo - Arquivo pessoal
Stênio Romao deixa seu notebook minerando criptomoedas enquanto trabalha como motorista de aplicativo Imagem: Arquivo pessoal

Giacomo Vicenzo e Rodrigo Favoretto

Colaboração para Tilt

27/03/2022 04h00

Stênio Romao, 33, trabalha como motorista de aplicativo e passa o dia rodando pelas ruas de São Paulo. Enquanto isso, o notebook em sua casa também está bem ativo na mineração de criptomoedas.

O paulistano faz uso dos chamados 'pools' de mineração, que é onde um grupo de pessoas coloca à disposição o poder de processamento de seus computadores caseiros ligados à internet e, assim, dividem a fração de criptomoeda (moedas digitais) conquistada. Os ganhos ainda são baixos, nas casas de centavos de dólar, mas já ajudaram o brasileiro a se livrar de perrengues financeiros durante uma viagem aos EUA.

O planejado era ficar no país 15 dias, mas o Romao acabou vivendo por três meses por lá graças ao lockdown no início da pandemia de covid-19, em 2020.

Quando viu que teria dificuldades para retornar ao Brasil, estratégia do motorista de aplicativos foi trocar as frações de bitcoins por criptomoedas alternativas, as chamadas altcoins.

"Foi justamente nesse período que as moedas virtuais valorizaram muito e me sustentaram até que as fronteiras abrissem e eu pudesse voltar", lembra.

A ideia de começar a usar o próprio computador, que custou cerca de R$ 1.500, para minerar as moedas digitais surgiu ao pesquisar sobre investimentos na internet. Foi então o paulistano começou a arriscar alguns aportes na compra e venda de criptomoedas.

Essa experiência tem servido como um trampolim para que ele se arrisque nesse ambiente digital e, consequentemente, possa aumentar seu lucro.

A popularidade da tecnologia tem movido um mercado em expansão, de acordo com um estudo feito pela Crypto.com (plataforma dedicada à compra e venda de criptomoedas) em julho de 2021, que calcula que o número de usuários presentes no criptomercado chegou a 220 milhões de pessoas espalhadas pelo mundo.

Em novembro de 2020, o site CoinGecko, que monitora o comércio de cerca de 10 mil criptomoedas, trouxe a informação que esse mercado atingiu o valor de US$ 3,7 trilhões.

"Fazendas de dinheiro virtual"

Apesar da alta das moedas no período da pandemia, a guerra na Ucrânia fez com que o preço do bitcoin e de outras moedas digitais caíssem. Ainda assim, o investimento para ter as chamadas "fazendas de mineração", que são usadas por investidores de porte médio e grande, permanece alto.

Uma das infraestruturas que garante um poder de processamento arrojado para esse trabalho são os chamados rigs de mineração, que são hardwares montados com uma série de placas gráficas de computadores. Desse modo, conseguem uma fatia maior na parcela das frações de criptomoedas extraídas da internet. A montagem de uma estrutura média como essa tem valores altos que variam entre R$ 47 mil e R$ 100 mil.

É nesse tipo de investimento que o advogado e investidor gaúcho Luciano dos Santos, 38, aposta. Seu primeiro contato com a atividade foi em 2016, quando começou, ainda com pouco conhecimento, a minerar Ethereum —um ativo digital que usa a tecnologia de blockchain.

Ele abandonou a mineração depois de alguns meses, mas retornou a ela no início de 2021 com mais conhecimento. "Mais experiente, encontrei Ethereum minerado daquela época ainda nas minhas carteiras. Foi a sensação de achar um valor perdido no bolso da calça", afirma.

Blockchain - Pedro Luis Bottino de Vasconcellos/Arte UOL - Pedro Luis Bottino de Vasconcellos/Arte UOL
Infográfico mostra como funciona a base do blockchain
Imagem: Pedro Luis Bottino de Vasconcellos/Arte UOL

Depois de dez meses em sua nova tentativa no ramo, Santos não informa um valor exato de quanto ganhou, mas revela que investiu o equivalente a um bom carro nos computadores para manter sua "fazenda de mineração".

"É uma ferramenta que pode significar a liberdade financeira das pessoas. Mas, da mesma forma, é um mercado muito volátil. Acredito que todos deveriam investir uma parcela de seu capital apta ao risco. Porém, nunca colocar dinheiro que possa precisar em curto prazo, ou valor que não possa ser perdido", afirma.

Existe riscos para o computador?

Atividade de mineração de criptomoedas disparou na pandemia aliada ao aumento do uso de computadores para o trabalho, escola e entretenimento. Isso fez os preços das placas de vídeos subirem. No ano passado, a empresa de mineração canadense Hut 8 Mining Corp fez uma compra no valor de US$ 30 milhões desse tipo de hardware, por exemplo.

Só que mais do que encontrar um preço inflacionado, quem deseja fazer esse tipo de investimento, sobretudo para realizar a mineração caseira, deve ficar atento aos possíveis danos causados pelo uso severo do hardware na atividade.

"A parte que mais sofre na mineração é a placa de vídeo, pois ela faz a grande parte do processamento da mineração e trabalha sempre em alto desempenho por longos períodos", diz Éverton Machado, técnico de informática que trabalha na Santa Efigênia, região conhecida pelo comércio de eletrônicos no centro de São Paulo.

"A fonte de alimentação do computador também se desgasta por trabalhar constantemente com alta exigência e por muito tempo. Processadores e placa-mãe não costumam sofrer muito nesse processo", completa.

Além disso, o alto consumo de energia na mineração de ciptomoedas é sentido até mesmo por quem faz o trabalho em porte doméstico. Esse aumento no consumo de energia faz parte da vida de todo o investidor de criptomoedas e impacta diretamente o meio ambiente pelo aumento na demanda de energia. Por isso, a atividade ainda é alvo de críticas.

"A mineração de moedas digitais causa grandes discussões sobre o uso da energia e o quanto pode ser prejudicial ao meio ambiente, principalmente quando a matriz energética do país vem de fontes não renováveis", destaca Marcus Nakagawa, professor da ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing) e especialista em sustentabilidade.

"Em países em que existem problemas de insegurança energética, esta atividade pode estar 'competindo' com outras essenciais e importantes. Como, por exemplo, na área de saúde e alimentação", acrescenta.

Na casa de Romao, ele sentiu um aumento considerável no consumo de energia com o computador ligado por vários dias, com pausas curtas apenas para refrigeração. Ao mesmo tempo, ele diz que pretende investir em mais notebooks para aumentar a sua capacidade de mineração e de aportes nas transações de compras e vendas de moedas digitais.