Topo

Entenda como satélites comerciais podem ser o 'Cavalo de Troia' da Ucrânia

Satélite mostra fila de mais de 60 km com veículos blindados russos ao norte da cidade ucraniana de Ivankiv - Imagem de satélite/Maxar Technologies/AFP
Satélite mostra fila de mais de 60 km com veículos blindados russos ao norte da cidade ucraniana de Ivankiv Imagem: Imagem de satélite/Maxar Technologies/AFP

Rosália Vasconcelos

Colaboração para Tilt, de Recife

03/03/2022 13h00Atualizada em 03/03/2022 13h29

Diante do poderio armamentista e militar da Rússia, a Ucrânia tenta usar estratégias de guerra para diminuir o avanço das tropas russas, assim como fizeram os gregos contra os troianos, na obra "Ilíada" de Homero.

O "Cavalo de Troia" atual, entretanto, não é de madeira e tampouco estaria sob rodas, mas sim, no alto do espaço, com os olhos voltados para a Terra. A Ucrânia quer usar imagens de satélites comerciais para ter informações das tropas inimigas e rastrear os militares — como seus deslocamentos.

Segundo o portal de notícias estadunidense Cnet, líderes ucranianos têm solicitado imagens do espaço a empresas que operam satélites comerciais em todo o mundo. Os registros poderiam ajudar o país a se defender contra os ataques do exército do presidente russo Vladimir Putin.

Na última terça-feira (1º), o vice-primeiro-ministro da Ucrânia, Mykhailo Fedorov, publicou em uma rede social imagens de um pedido oficial do governo às companhias espaciais, apelando às "empresas e organizações globais de sensoriamento remoto para fornecer dados SAR (radar de abertura sintética), em tempo real, para apoiar as Forças Armadas da Ucrânia com inteligência útil".

De acordo com o líder ucraniano, as imagens de radar são essenciais para que os militares locais e a EOS Data Analytics (empresa espacial comercial fundada pelo empresário ucraniano Max Polyakov) observem o movimento das tropas russas — especialmente no período noturno, uma vez que, durante o dia, cerca de 80% do território ucraniano fica coberto por nuvens.

Resposta das empresas

Após a solicitação de Fedorov —e também da pressão de internautas diante dos ataques à população da Ucrânia—, algumas empresas se posicionaram em relação ao assunto.

As companhias de satélites comerciais Planet, Maxar, BlackSky e Capella Space afirmaram que já estão compartilhando imagens de movimentos de tropas russas nas mídias sociais e também com agências de notícias.

Em uma nota à imprensa internacional, um porta-voz da BlackSky informou que a empresa "está com o povo corajoso da Ucrânia".

"Continuaremos apoiando seus esforços por meio de nossos parceiros e membros da imprensa com dados e análises", completa o texto.

Antes do pedido formal de Fedorov, o presidente-executivo da empresa Planet, Will Marshall, já havia se pronunciado no Twitter, afirmando que sua equipe trabalha desde antes da invasão para fornecer dados oportunos: "Isso já inclui governos, organizações intergovernamentais, organizações de ajuda e a mídia".

De acordo com o Cnet, a empresa Iceye disse em comunicado que também está colaborando com os governos da Finlândia, dos EUA e da União Europeia. "Existem várias iniciativas em andamento das quais estamos cientes que buscam reunir informações disponíveis. Estamos em contato com esses representantes e estamos tentando coordenar com eles o acesso apropriado às imagens do Iceye", disse, em nota, ao portal.

Já o Capella Space informou em um comunicado à imprensa que neste momento não está em condições de apoiar diretamente entidades governamentais dos EUA e da Ucrânia.

As empresas Airbus, Maxar (que registrou o avanço de tropas russas nos primeiros dias de guerra) e SIIS ainda não responderam sobre o pedido de Fedorov.

"Online, on time"

A empresa ucraniana EOS Data Analytics deu uma contra-resposta e informou que precisa ir além das imagens que são divulgadas nas redes sociais e nos serviços de notícias.

Eles disseram que precisam de informações que façam a diferença e "não de imagens ópticas arquivadas ou desatualizadas, que são boas para fins de relações públicas e como evidência de crimes de guerra para futuros processos judiciais criminais internacionais", afirmou o presidente executivo da EOSDA, Max Polyakov.

A companhia de Polyakov chegou a criar uma plataforma específica em seu site para coleta de dados de satélites e, de forma imediata, processá-los, analisá-los e compartilhá-los com as Forças Armadas da Ucrânia e com organizações humanitárias.

"Esta é realmente a primeira grande guerra em que imagens de satélites comercialmente disponíveis podem desempenhar um papel significativo no fornecimento de informações de código aberto sobre movimentos de tropas", escreveu Fedorov.

A guerra

A Rússia iniciou a invasão da Ucrânia na quinta-feira passada (24), com dezenas de milhares de soldados. No oitavo dia de confligo, o exército tenta conquistar mais territórios ucranianos.

Para isso, a estratégia tem sido cercar cidades importantes — no que líderes internacionais condenaram como um "ataque brutal". Os Estados Unidos, a União Europeia e o Reino Unido impuseram sanções econômicas à Rússia. Calcula-se que mais de 660 mil pessoas tenham fugido da Ucrânia

Desde o início do conflito, alguns empresários da tecnologia também têm se mobilizado contra a guerra.

A SpaceX de Elon Musk diz ter ativado o seu serviço de internet via satélite Starlink na Ucrânia e enviou receptores para o país. Já a Apple parou de vender seus produtos na Rússia, limitou as transações do Apple Pay no país e desativou alguns recursos do Apple Maps na Ucrânia para proteger os civis.