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Ímã terá poder suficiente para erguer um porta-aviões; por que isso importa

Ímã foi desenvolvido na França - Gretchen Ertl/MIT-PSFC
Ímã foi desenvolvido na França Imagem: Gretchen Ertl/MIT-PSFC

Rosália Vasconcelos

Colaboração para Tilt*, do Recife

04/11/2021 04h00Atualizada em 04/11/2021 14h48

Uma equipe de pesquisadores enviou para a França, no início de setembro, a primeira parte de uma estrutura que irá formar um ímã gigante tão poderoso que será capaz de levantar um porta-aviões. E erguer um imenso navio nem está entre as principais finalidades dessa tecnologia.

Com peso de 1.000 toneladas e dimensões de um prédio de sete andares, esse primeiro "item", na verdade, é destinado a fazer parte do ITER (International Thermonuclear Experimental Reactor, ou Reator Termonuclear Experimental Internacional), um megaprojeto de engenharia e pesquisa em fusão nuclear que envolve cientistas de diversos locais, como China, União Europeia, Índia, Japão, Rússia, Coreia do Sul e Estados Unidos.

O grande objetivo do reator é replicar os processos de fusão do Sol para criar energia na Terra. A primeira parte, cujas peças foram desenvolvidas nos EUA e montadas no sul da França, durou três anos para ser construída.

Quando as demais forem concluídas, e ele estiver totalmente montado, sua estrutura medirá mais de 18 metros de altura e 4,3 metros de largura. Se der certo, o conjunto será conhecido como o maior ímã do mundo.

"Cada conclusão de um importante componente inédito — como o primeiro módulo do solenoide central [nome do primeiro módulo do ímã] — aumenta nossa confiança de que podemos concluir a engenharia complexa da máquina", disse Laban Coblentz, porta-voz do ITER.

No Twitter, o perfil do reator ITER registrou a chegada do primeiro módulo. "Fabricado nos EUA por @GeneralAtomics, ele é um dos seis pacotes de bobinas que formarão o coração do ITER, o ímã mais poderoso do mundo."

Por que é importante

Ainda que a conquista dos pesquisadores seja apenas uma etapa, para os cientistas foi um grande passo em busca da tão sonhada criação de usinas de energia baratas e livres de carbono (responsável por exemplo pelo agravamento do efeito estufa).

O desenvolvimento desse ímã gigante era visto como o maior obstáculo tecnológico para o processo de fusão nuclear. A operação bem-sucedida de agora abriu as portas para a produção de energia atômica, que tem sido perseguida por décadas, mas até então com avanços limitados.

Com a tecnologia magnética demonstrada com sucesso, os cientistas dizem estar no caminho certo para construir o primeiro dispositivo de fusão do mundo que consegue criar e confinar um plasma que produz mais energia do que consome.

Maior campo magnético já criado pelo homem?

O ímã gigante é a peça-chave de um reator de fusão nuclear, denominado SPARC.

Na prática, o ímã gigante será usado como um supercondutor de altas temperaturas, capaz de atingir pressão e calor suficientes para realizar o processo de fusão nuclear, assim como ocorre no Sol.

Para se ter uma ideia da potência desse equipamento, segundo os cientistas do ITER, o ímã produzirá um campo magnético de 20 tesla (unidade de medida usada para mensurar a densidade de fluxo magnético), cerca de 280 mil vezes mais forte do que o campo magnético da Terra.

O Sol em um tubo

A fusão nuclear ocorre quando dois ou mais átomos, submetidos a uma enorme quantidade de energia, se fundem para formar outros tipos de átomos mais pesados. Esse processo é o que acontece no interior do Sol.

Sob temperatura e pressão extremas, os átomos entram em colisão e se fundem, liberando enormes quantidades de energia. O reator SPARC fará justamente isso.

Mas como esse processo exige temperaturas muito além do que qualquer material sólido poderia suportar — cerca de 15 milhões de graus Celsius — os cientistas tiveram a ideia de manter o processo de fusão nuclear suspenso, evitando contato com qualquer coisa sólida.

Essa proposta só seria possível criando campos magnéticos intensos, que formassem uma espécie de tubo invisível para conter o plasma quente de átomos. Como as partículas têm carga elétrica, elas são fortemente controladas pelos campos magnéticos.

E foi então que surgiu a ideia de produzir um super ímã, capaz de criar esse campo magnético muito maior em formato de tubo, mas num espaço físico relativamente pequeno.

Segundo os cientistas, SPARC é um teste para provar o conceito antes da construção da usina de produção de energia em tamanho real.

O que vem a seguir

A expectativa dos cientistas é de que o ímã esteja totalmente concluído até 2025. A produção de energia nuclear pode ser uma contribuição importante para limitar os efeitos das mudanças climáticas no planeta, segundo seus defensores.

"A fusão é a melhor fonte de energia limpa. A quantidade de energia disponível realmente muda o jogo", disse a vice-presidente de pesquisa do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts), dos EUA, e professora de geofísica Griswold, Maria Zuber, em entrevista para o MIT News.

Segundo ela, o combustível usado para criar a energia de fusão vem da água e a Terra está cheia de água — é um recurso quase ilimitado. "Só é preciso descobrir como utilizá-lo."

*Com informações dos sites Futurism e NewScientist