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Defesa de Elizabeth Holmes vai acusar ex-namorado dela por abuso

Elizabeth Holmes deixa o tribunal após o primeiro dia de seu julgamento, na Califórnia - Nick Otto / AFP
Elizabeth Holmes deixa o tribunal após o primeiro dia de seu julgamento, na Califórnia Imagem: Nick Otto / AFP

De Tilt, no Recife

14/09/2021 16h24

Os advogados de Elizabeth Holmes, 37, — ex-promessa da biotecnologia do Vale do Silício, nos EUA, que está sendo julgada por um júri do estado da Califórnia pelo crime de fraude eletrônica e conspiração — já deram pistas de como vão basear sua defesa.

Já durante a seleção do júri, vários candidatos em potencial foram questionados se haviam sofrido "abuso de alguém próximo", sinalizando que essa será parte da estratégia para ajudar Holmes no julgamento. Mas a promotoria deve apresentar profissionais de saúde para desmontar essa tese.

No primeiro dia de julgamento, realizado na última quarta-feira (8), em um tribunal de San Jose, a defesa alegou que Holmes sofreu abuso psicológico e era dominada por seu sócio e ex-companheiro, Ramesh "Sunny" Balwani, 56, que é julgado em separado. Balwani classificou as acusações de "ultrajantes".

Se condenada, Holmes, que já foi chamada de "nova Steve Jobs", poderá pegar até 20 anos de prisão. O julgamento deve durar até 13 semanas.

Do sucesso ao banco dos réus

Ao criar a empresa de diagnósticos Theranos, Holmes tornou-se uma celebridade no mundo da tecnologia. O sucesso veio com a promessa de exames baratos realizados com apenas gotas de sangue com resultados mais rápidos do que os laboratórios tradicionais. Figurões do mercado como Henry Kissinger e Rupert Murdoch foram alguns dos que investiram na startup.

Porém, em 2015, um informante levantou preocupações sobre o carro-chefe da Theranos, o dispositivo de teste Edison, e o jornal americano Wall Street Journal mostrou, em uma série de reportagens, que os resultados do exame não eram confiáveis. Segundo a publicação, a empresa vinha usando máquinas disponíveis comercialmente, produzidas por outros fabricantes, para viabilizar a maioria de seus testes.

Os processos se acumularam, os parceiros cortaram relações e, em 2016, os reguladores dos EUA proibiram Holmes de operar um serviço de exames de sangue por dois anos. Em 2018, a Theranos decretou falência.

Em março daquele ano, ela fez um acordo com a Justiça dos EUA após ter sido acusada de levantar US$ 700 milhões (R$ 3,6 bilhões, em valores atuais) junto a investidores de forma fraudulenta. Três meses depois, no entanto, acabou presa junto com Balwani, sob acusações criminais de fraude eletrônica e conspiração. Ela foi libertada sob fiança.

Segundo os promotores, Holmes mentia para investidores, médicos e pacientes para continuar arrecadando dinheiro. Ela chegou a acumular uma fortuna estimada em 3,6 bilhões de dólares, segundo a revista Forbes de 2014. Naquela época, era a bilionária mais jovem sem ter herdado sua fortuna.

A tese da defesa

Logo no primeiro dia de julgamento, para ajudar Holmes a defesa optou por mostrar o lado humano da empresária para o júri. O advogado Lance Wade contou em detalhes como ela guardou seus pertences no carro depois que Theranos afundou.

Ramesh "Sunny" Bawani - Getty Images - Getty Images
Ramesh "Sunny" Bawani
Imagem: Getty Images

Depois, voltou no tempo e falou da trajetória da jovem de 19 anos que resolveu abandonar a faculdade em 2003, após patentear um dispositivo que realizava testes e dava um resultado. Wade ainda afirmou que acreditar em Balwani foi um dos maiores erros cometidos por Holmes.

Holmes e Sunny terminaram o relacionamento amoroso em 2016, após cerca de uma década juntos. Depois disso, ela se casou com o herdeiro do ramo de hotelaria Billy Evans. Em 2018, tanto Holmes como Balwani foram julgados juntos. Desde então foram muitos adiamentos — incluindo um devido à gravidez da empresária e ao nascimento de seu filho com Evans.

No ano passado, o juiz separou os casos, o que foi considerado um movimento incomum entre especialistas jurídicos. Mas a explicação está em novos documentos que mostrariam que Holmes acusa Balwani de um "padrão de abuso e controle coercitivo".

De acordo com os autos, os dois se conheceram quando Holmes tinha apenas 18 anos e Balwani, 37. Ela alega que ele controlava o que ela comia, como se vestia, o tempo em que ela dormia, quanto dinheiro ela podia gastar e com quem ela poderia passar o tempo e onde.

Alega ainda que ele monitorava suas ligações, mensagens de texto e e-mails, e o acusa de depreciá-la verbalmente e de abusar dela fisicamente, até mesmo jogando objetos nela.

Os advogados de Holmes afirmam que apenas ofato de estar perto de Balwani pode induzir "sintomas debilitantes de Transtorno de Estresse Pós-Traumático" nela. Eles planejam argumentar que ele foi o verdadeiro cérebro por trás do suposto golpe de Theranos.

De acordo com a defesa, o abuso de um parceiro íntimo pode afetar as suas vítimas - o que é algo primordial em qualquer processo criminal porque o ônus do governo é provar não apenas que Holmes fez declarações falsas aos investidores, mas que ela sabia que as representações eram falsas, e que ela tinha a intenção de enganar.

Ou seja, a defesa quer apresentar o argumento de que os efeitos do relacionamento supostamente abusivo de Holmes com Balwani afetavam diretamente naquilo que ela acreditava — o que a eximiria de culpa.

Os advogados de Balwani negaram as acusações de abuso e classificaram as alegações como "lascivas e inflamadas" nos processos judiciais. O julgamento dele está previsto para começar no início do próximo ano. Como Holmes, ele se declarou inocente.