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Logs, código-fonte e voto apurado: 3 tecnologias que tornam a urna segura

Marcella Duarte

Colaboração para Tilt, de São Paulo

06/08/2021 10h57

O presidente Jair Bolsonaro divulgou, em sua conta no Twitter, documentos de um inquérito da Polícia Federal (PF) que investiga um ataque hacker aos sistemas do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em 2018. Segundo ele, "o sistema eleitoral brasileiro foi invadido e, portanto, é violável". O TSE, porém, rebateu as acusações de que o pleito daquele ano teria sido fraudado.

"O acesso indevido, objeto de investigação, não representou qualquer risco à integridade das eleições de 2018. Isso porque o código-fonte dos programas utilizados passa por sucessivas verificações e testes, aptos a identificar qualquer alteração ou manipulação. Nada de anormal ocorreu", diz a nota oficial.

Coincidentemente, no mesmo dia em que divulgou os documentos, Bolsonaro foi incluído no inquérito das fake news do Supremo Tribunal Federal (STF), que vai apurar a disseminação de informações falsas pelo presidente em suas lives.

Para que você entenda melhor o caso, separamos abaixo questões tecnológicas que aparecem na polêmica das urnas eletrônicas, que desmentem o que o presidente está dizendo:

O código-fonte da urna foi hackeado?

Segundo Bolsonaro (sem partido) e o deputado federal Filipe Barros (PSL-PR), relator da PEC do voto impresso, os hackers tiveram acesso ao código-fonte de diferentes urnas eletrônicas, a partir de um servidor, e o TSE teria apagado os arquivos acessados para esconder o ataque.

"Código-fonte" é um conjunto de linhas de programação de um software, com as instruções para que ele funcione.

Não há qualquer prova de que os hackers tiveram acesso aos códigos-fonte das urnas. Mas, ainda que tivessem, isso não significa conseguir invadi-lo ou alterá-lo. Muitos servidores, inclusive, rodam sistemas operacionais de código livre, aos quais todos têm acesso, e isso não faz deles menos seguros.

O próprio código-fonte das urnas é, de certa forma, público. Ele é liberado para partidos políticos, para a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), para a PF e outras instituições que participam do processo eleitoral, justamente para manter a transparência.

Cogita-se até que ele seja divulgado publicamente.

Além disso, um sistema tem controle sobre modificações (como o Github) e guarda o histórico de alterações, que não pode ser alterado. Uma invasão que fizesse com que o código fosse alterado seria facilmente detectada.

"Uma vez assinado digitalmente e lacrado, não existe a possibilidade de adulteração. O programa simplesmente não roda se vier a ser modificado", declarou o TSE. "Os sistemas usados nas eleições de 2018 estão disponíveis na sala-cofre para os interessados, que podem analisar tanto o código-fonte quanto os sistemas lacrados e constatar que tudo transcorreu com precisão e lisura."

As urnas são conectadas à internet?

Bolsonaro alega que o ataque de 2018 poderia ter removido o registro de sua candidatura à Presidência das urnas. Assim, as seções atacadas não aceitariam como voto válido o 17 (número do PSL, ao qual era filiado na época).

A invasão relatada pelo presidente não é novidade: foi admitida pelo TSE e divulgada em diversos veículos de comunicação na época. Mas ela aconteceu em módulos do sistema que não conseguiriam acessar ou alteram a votação em si. As informações acessadas seriam registros burocráticos de 2001 a 2010 — ultrapassadas e sem qualquer possibilidade de uso para fraude no pleito de 2018.

Vale lembrar que urnas eletrônicas não são conectadas à internet e jamais entram em rede. Por isso, é impossível o acesso remoto ou qualquer tipo de interferência externa durante o processo de votação e de apuração.

No final da votação, cada urna do Brasil imprime, de forma totalmente offline, um boletim com a contagem de todos os votos recebidos, que são conferidos pelos fiscais dos partidos e podem ser comparados com os resultados divulgados.

O que são "logs"?

De acordo com Bolsonaro, o TSE apagou logs e "cometeu um crime". Os logs são os registros de atividade, como o histórico, de qualquer sistema. É onde vemos possíveis alterações e acessos. Corriqueiramente, eles ficam armazenados por apenas um período determinado, e não para sempre.

No caso do TSE, uma empresa terceirizada era a responsável pelos logs. Eles eram automaticamente apagados após atingirem o limite de 80 GB, lotando o disco de armazenamento então disponível. Segundo especialistas, isso é normal e todo sistema funciona assim.

Por isso, o Tribunal não disponibilizou os logs da época — por tanto, não tem como o presidente afirmar que houve uma manipulação. A investigação da PF, inclusive, descreve etapas que afirmam que não houve alteração indevida de sistemas críticos da urna.

O TSE ressalta que "de 2018 para cá, o cenário mundial de cibersegurança se alterou, sendo que novos cuidados e camadas de proteção foram introduzidos para aumentar a segurança dos demais sistemas informatizados".

De acordo com Luís Roberto Barroso, ministro do STF (Supremo Tribunal de Federal) e presidente do TSE, o processo eletrônico de votação no Brasil é seguro, auditável e transparente. São 25 anos sem registros de fraudes nas eleições.

Para ele, a aprovação da proposta de voto impresso seria um retrocesso a tempos sombrios de nossa história, e poderia facilitar a ação de milícias, do crime organizado e da compra de votos, tumultuando o processo democrático.