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Como se descobre a cepa de um vírus e como isso pode nos salvar da covid?

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Imagem: iStock

Carlos Madeiro

Colaboração para Tilt, em Maceió

27/01/2021 04h00

O sequenciamento genético do novo coronavírus é uma das maiores chances que temos para entender o comportamento do Sars-COV-2. É um trabalho importante tanto para analisar as novas cepas (variantes) do vírus que estão surgindo pelo mundo, quanto para pesquisar traços como a capacidade de contágio e capacidade de reação a vacinas.

No Brasil, por exemplo, o sequenciamento genético confirmou o primeiro caso de reinfecção de covid-19 e descobriu a origem da nova cepa que circula no Amazonas.

Cepas ou linhagens de um vírus são mutações que ocorrem ao longo do tempo, por meio de um processo evolutivo. O objetivo delas é garantir a propagação da espécie.

Por exemplo: as novas variantes no Amazonas, Reino Unido e África do Sul conseguiram passar por uma mutação e aumentar a capacidade de transmissão. Há indícios que elas podem até escapar de anticorpos neutralizantes que já estavam presentes na população.

"É uma vantagem enorme para o vírus sempre se transmitir mais e causar menos doença", explica Fernando Spilki, virologista e especialista em sequenciamento genético da Universidade Feevale (RS).

O ritmo de evolução —e a formação de novas cepas— depende muito do momento em que o vírus está na espécie em foi introduzido. No SARS-CoV-2, após um período de linhagens relativamente estável, várias mutações estão acontecendo.

"À medida que se dá espaço para o vírus evoluir, ele consegue infectar muitos hospedeiros, o que vai sendo a chance para que ocorram essas mutações. Elas são selecionadas para que esses vírus tenham mais vantagens", explica Spilki.

O que é um sequenciamento?

Todos os vírus têm genomas, e eles são formados por pequenas unidades que nós chamamos de nucleotídeos. Essas unidades são aqueles A, T, C, G, que vemos em figuras explicativas sobre DNA. No caso do coronavírus, ele é um RNA (que difere em características do vírus DNA e são mais propensos a mutações).

"Para sequenciar um vírus, os cientistas concentram o material genético dele no laboratório e fazem reações químicas. "Essas reações a leituras em máquinas especializadas permitem delineá-lo, olhando letrinha por letrinha na sequência correta", explica.

Com esses dados em mãos, os cientistas podem comparar qual a relação de um vírus com o outro, descobrir sua origem e saber o como ele está circulando em uma população. Isso é possível pelo estudo das relações de parentesco entre as diferentes linhagens. Esses dados estabelecem o que os cientistas chamam de relações filogenéticas, que determinam as relações ancestrais entre espécies.

"A gente consegue perceber qual linhagem dá origem a uma determinada variante, qual vírus que circula em uma determinada região está sendo transportado a uma outra região, e se as ferramentas de distanciamento social estão conseguindo impedir, de fato, que uma determinada linhagem do vírus entre em um lugar ou outro", completa Spilki.

Sequenciamento decisivo para vacinas

A professora e pesquisadora em Doenças Tropicais da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco) Vera Magalhães explica que os vírus são conhecidos por suas mutações frequentes, mas cada tipo evolui de forma e ritmo diferentes.

"Tem vírus que muta mais, tem vírus que muta menos. Elas visam o aperfeiçoamento da transmissão viral. Essas novas variantes do SARS-CoV-2 são pelo menos 50% mais transmissíveis do que o vírus inicial", relata.

"A maior parte dos vírus muta exatamente na proteína S, que é a proteína de ligação viral ao receptor na célula humana. O sequenciamento genético viral possibilita a detecção dessas novas variantes, sendo fundamental para que os órgãos sanitários possam traçar ações de combate ao vírus", completa.

"É importante acelerar o processo de vacinação para que a transmissão viral seja rompida. Isso é uma luta contra o tempo e é mais um reforço da necessidade da vacinação em massa. Já é possível que essas vacinas oferecidas hoje não sejam capazes de gerar imunidade contra a nova variante. Até agora não parece ter ocorrido isso, mas a gente vai saber disso a partir do sequenciamento", explica.