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"Uber dos ônibus", Buser coleciona vitórias contra fiscalização em SP

Ônibus da Buser - Divulgação / Buser
Ônibus da Buser Imagem: Divulgação / Buser

Lucas Carvalho

De Tilt, em São Paulo

14/11/2020 04h00Atualizada em 30/11/2020 17h30

Pela segunda vez em menos de duas semanas, a Buser — startup que oferece viagens de ônibus num modelo semelhante ao da Uber — teve seu modelo de negócios defendido pela Justiça de São Paulo.

A juíza Marina Gimenez Butkeraitis, da 9ª Vara Cível Federal de São Paulo, concedeu uma liminar à empresa Lucretur, parceira da Buser, contra sanções da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). Na semana passada, foi a vez de outra parceira, a Spazzini, receber liminar semelhante.

A Buser oferece passagens de ônibus interestaduais por aplicativo a preços mais baratos que empresas de viação tradicionais. Isso acontece porque a startup faz viagens com ônibus fretados e divide o valor do fretamento entre os passageiros. A plataforma diz que já fez viagens interestaduais com passagens de apenas R$ 10 graças ao modelo.

Assim como a Uber, que chegou ao Brasil sem regulamentação e com preços mais baixos do que táxis, a Buser também tem enfrentado resistência de empresas mais tradicionais, que contam com o apoio dos órgãos de fiscalização.

A Justiça proibiu a ANTT e outros fiscais de dificultar o trabalho da Lucretur por conta de sua parceria com a Buser. A empresa opera ônibus que são usados nas viagens da startup.

A ANTT, oficialmente, diz que não tem nada contra a Buser. Ela argumenta que o problema é a Lucretur, que se declara uma empresa de fretamento, mas não se encaixa nessa categoria porque depende de uma intermediária (no caso, a Buser). E também porque opera em rotas fixas, como se fosse uma empresa tradicional de ônibus de viagem.

A juíza do caso ficou do lado da Lucretur, argumentando que a parceria da empresa com a Buser é fruto do avanço da tecnologia. Segundo ela, vender passagens rateadas por aplicativo não muda o fato de que a empresa ainda é uma fretadora.

"As plataformas tecnológicas são utilizadas para aumentar a produtividade e reduzir custos, facilitando, assim, o serviço de contratação do fretamento eventual, conectando digitalmente o grupo de pessoas com interesse comum, juntamente com a empresa de transporte, não desvirtuando a sistemática do fretamento", diz a decisão que concede liminar à Lucretur.

Reações

Embora não faça parte do processo, a Buser comemorou a decisão. "Não somos contrários a nenhum tipo de fiscalização. O que nos causa indignação é o reiterado abuso de poder", disse Marcelo Abritta, presidente-executivo da startup, em nota enviada ao Tilt.

Para Abritta, a ANTT "parece proteger não os passageiros, mas as grandes empresas que oferecem serviços com veículos mais velhos e preços mais altos".

A ANTT se defende dizendo que não persegue empresas parceiras do app. "Independentemente de prestar ou não serviços para esses aplicativos, as empresas que estiverem fazendo transporte interestadual de passageiros serão fiscalizadas pela ANTT, que trabalha de forma imparcial", disse a Agência em nota enviada ao Tilt. "Sobre decisões específicas a ANTT se manifestará quando for notificada."

A Buser diz que seu setor jurídico "colabora" com as empresas parceiras de frete de ônibus, mas não defende legalmente as companhias. Tanto a Lucretur quanto a Spazzini, além de outras empresas, são representadas pelo mesmo escritório de advocacia, o Desio Senra Advogados.

As empresas tradicionais do setor de ônibus negam que sejam privilegiadas pela fiscalização, mas defendem que o modelo da Buser é irregular, "clandestino" e precisa ser cerceado enquanto não houver legislação específica sobre o caso de aplicativos do gênero.

"A sociedade deve dizer se ela quer ter um sistema regulado ou totalmente aberto", diz Gentil Zanovello, presidente do Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros do Estado de São Paulo (Setpesp), ao Tilt.

"Nós estamos prontos para operar em qualquer um dos dois sistemas. O que não pode é alguém, de maneira arrogante, dizer 'eu faço dessa maneira e acabou, dane-se a decisão judicial'. Eles se recusam a cumprir qualquer regra", acrescentou.

Derrotas

A Buser enfrenta batalhas judiciais praticamente em todo o território brasileiro e acumula também algumas derrotas judiciais. Na maioria dos casos, os processos estão em andamento e ainda não chegaram ao fim. Mas pelo menos em um caso a startup foi proibida de operar.

Atendendo a um pedido da Federação das Empresas de Transporte de Passageiros dos Estados do PR e SC (Fepasc), o Tribunal Regional Federal da 4ª Região aumentou a multa imposta à startup após denúncias de que ela continuava operando viagens nos estados mesmo após ter sido proibida em setembro de 2019.

Em nota, a Buser disse que "vem cumprindo regiamente a decisão da Justiça e não está disponibilizando a oferta de viagens para o Paraná". A startup afirmou que iria recorrer da decisão.

Além de PR e SC, a Buser recorre de uma decisão no Rio de Janeiro que também proibiu sua operação no estado. A empresa ainda faz viagens na região, porém, porque entende que a ordem ainda está sob disputa.