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WhatsApp usa hífen para separar sílabas? Entenda a nova polêmica

Detalhe pequeno do WhatsApp virou "arma" de influenciadores bolsonaristas que atacam jornalista - Estúdio Rebimboca/UOL
Detalhe pequeno do WhatsApp virou 'arma' de influenciadores bolsonaristas que atacam jornalista Imagem: Estúdio Rebimboca/UOL

De Tilt, em São Paulo

12/02/2020 14h47

Os usuários transformaram um detalhe no qual você provavelmente nunca reparou na mais nova polêmica brasileira. Afinal, o WhatsApp coloca hífen para separar as sílabas de uma palavra quando ela não cabe na mesma linha?

Muita gente está usando esse pormenor como evidência de que o jornal "Folha de S.Paulo" forjou provas para mostrar que um ex-funcionário de firma de disparos automáticos no WhatsApp mentiu ao depor na Comissão Mista Parlamentar de Inquérito das Fake News nesta terça-feira (11). Elas estão erradas. Essa tentativa, porém, mostra bem como funcionam as redes de desinformação na internet.

Antes de tudo, um contexto: ontem, compareceu perante deputados para dar um testemunho o ex-funcionário da Yacows, uma das agências que fizeram disparos de mensagens em massa pelo WhatsApp durante a campanha presidencial de 2018, Hans River, que foi uma das fontes das reportagens da Folha sobre o assunto.

Durante a sessão, ele declarou não ter compartilhado informações ao jornal e ainda afirmou que Patrícia Campos Mello, a jornalista responsável pelo texto, se insinuou sexualmente.

Para a Folha, Hans mentiu. O periódico publicou capturas de tela das conversas pelo WhatsApp entre Hans e a repórter para sustentar sua versão. Está tudo lá. Hans enviou documentos, planilhas e áudios.

Influenciadores digitais bolsonaristas passaram a usar um dos prints para dizer que tudo aquilo era falso. Uma das imagens mostrava uma palavra hifenizada pelo WhatsApp. "Amanhã" aparecia escrita "Ama-nhã". Isso, dizem eles, é prova de que a Folha produziu as provas artificialmente para rebater as mentiras de Hans.

Um dos que espalharam essa versão foi Allan dos Santos, do site Terça Livre. "Em um dos prints o WhatsApp hifena [sic] uma palavra. Software nenhum da face da Terra, mesmo desde os remotos tempos wordstar rodando em MS DOS 3.2., jamais hifenizou se não se usar alinhamento justificado", escreveu Santos no Twitter. Essa informação não procede. Na verdade, ela reveste uma mentira (software não coloca hífen em palavras) com ares de verdade ("se não se usar alinhamento justificado").

Na verdade, os editores de textos mais sofisticados e geralmente usados em computadores, como o Word, oferecem opção de não hifenizar ou não palavras.

No caso dos celulares, os aplicativos não são tão sofisticados para apresentar opções assim, nem faria sentido o WhatsApp permitir ou não justificar o texto —o foco é mandar rapidamente uma mensagem, que muitas vezes sequer é escrita. O máximo de edição que o app permite é a edição de expressões em itálico, negrito ou tachado (com um risco), o resto da formatação de texto é definido pelo sistema operacional.

No caso do jornalista, o aparelho usado por ela quando conversou com Hans em novembro de 2018 era um Moto G6, celular da Motorola que roda Android. A plataforma do Google, presente na maioria dos smartphones, aplicava hífen por padrão até sua versão Android 9 Pie.

Durante um encontro para desenvolvedores de apps para Android, a empresa reafirmou isso. "Em nosso sistema, a hifenização é feita por padrão", afirmou Siyamed Sinir, gerente técnico do Android.

Não quer dizer que todas as palavras divididas eram hifenizadas. Isso depende do tamanho da tela do celular.

Só foi no ano passado que o Google deixou de fazer isso, quando lançou o Android 10. A empresa percebeu que colocar hífen consumia 70% do tempo dedicado pelo sistema à mensuração de um texto.

Para explicar a situação, Patricia publicou um vídeo no Twitter. Ela explica que os prints incluídos na reportagem da versão impressa foram feitos com o Moto G6. Mas, como o celular caiu no chão e ficou com a tela quebrada, ela passou a usar outro, um Moto G8 Plus. O aparelho foi lançado em outubro do ano passado, ainda com Android 9 Pie, mas está na lista para receber o Android 10.

O jornal publicou duas versões dos prints em que é possível notar a diferença entre os dois celulares. No texto da versão impressa do jornal, saiu "Ama-nhã", por ter sido uma captura de tela feita com o Moto G6, enquanto no texto online saiu "amanhã", porque a imagem foi capturada pelo Moto G8 Plus.

A diferença é que a tela do Moto G8 Plus é maior que a do Moto G6. Enquanto a largura do display do primeiro é de 7,5 cm, a do segundo é de 7,2 cm. Esses três milímetros foram os responsáveis por "Ama-nhã" virar "Amanhã".

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