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Ela salvou 900 mil kg de comida: ativista combate desperdício com app

Jasmine Crowe, criadora do app Goodr, fala no TEDWomen 2019 em Pal Springs, California, EUA - Jasmina Tomic/TED/Divulgação
Jasmine Crowe, criadora do app Goodr, fala no TEDWomen 2019 em Pal Springs, California, EUA Imagem: Jasmina Tomic/TED/Divulgação

Fernanda Ezabella

Colaboração para Tilt, de Palm Springs (EUA)

13/12/2019 04h00

Sem tempo, irmão

  • Goodr já conseguiu desviar do lixo mais de 900 mil quilos de comida em dois anos
  • Jasmine Crowe teve ideia quando servia comida para sem-teto de Atlanta, EUA
  • Empresas se cadastram e doam comida excedente, que é enviada a organizações
  • Aplicativo funciona em sete cidades dos EUA, como Miami, Filadélfia e Chicago

Em nove anos, a ativista americana Jasmine Crowe servia comida aos sem-teto de Atlanta, no estado americano da Geórgia. Nesse meio tempo, percebeu que o combate à fome tem sido feito de maneira errada e que o problema não é uma questão de escassez de comida, e sim de logística. Ela resolveu então criar um aplicativo para ser uma solução.

Em dois anos, a plataforma Goodr já conseguiu desviar do lixo mais de 900 mil quilos de comida e levá-los para quem mais precisa, com a participação de cerca de 200 empresas doadoras, incluindo redes de fast-food, aeroportos, estádios e até mesmo a Netflix.

"O desperdício está por toda parte. Trabalhamos muito [para obter comida] com sets de filmagem", disse Jasmine ao Tilt nos bastidores do TED Women, um evento de palestras que aconteceu na semana passada em Palm Springs (EUA). "Mesmo aqui há muito desperdício", disse, olhando em volta. "É necessário alguém dizer: não no meu evento, não no meu trabalho, não no meu restaurante."

Atualmente, o aplicativo funciona em sete cidades dos EUA, como Miami, Filadélfia e Chicago. O app existe para Android e iOS, mas no Brasil eles não podem ser usados. O foco em 2020 será na expansão: a startup de 20 funcionários criou um software que poderá ser licenciado por empresas para repetir a iniciativa em qualquer lugar.

Uber Eats reverso

"O aplicativo funciona como um reverso do Uber Eats", explicou. Um restaurante, por exemplo, registra seus produtos, suas vendas e suas doações, usando um serviço de entrega de motoristas locais para levar a comida a organizações da região.

A Goodr cobra das empresas uma taxa com base nas entregas, que pode variar de US$ 10 por mês ou até US$ 75 por delivery. Em contrapartida, a tecnologia usa a movimentação de produtos para fazer relatórios de sustentabilidade que mostram às organizações o quanto elas estão ajudando com a ação. Assim essas empresas podem receber incentivos fiscais por colaborarem com causas beneficentes.

"Com base nos dados, podemos dizer a um cliente: nas quartas, seus bagels estão sendo desperdiçados, você não precisa fazer tantos", disse.

Em sua palestra no TED Women, Jasmine desfilou números do problema: são 821 milhões de pessoas no mundo que passam fome —cerca de 40 milhões nos EUA. "Onze milhões de crianças aqui em nosso país vão dormir com fome", falou.

E, de acordo com dados do governo, 150 mil toneladas de comida são desperdiçadas diariamente por consumidores norte-americanos. "Fome não é um problema de escassez e sim de logística", disse. "E tecnologia e inovação têm o poder de resolver problemas reais."

O começo: cupons para sem-teto

A inspiração para o aplicativo veio de sua experiência organizando o Sunday Soul, um restaurante temporário montado em locais estratégicos que chegava a alimentar 500 sem-teto no centro de Atlanta. "Arrumava mesas e cadeiras, toalhas de mesa, imprimia menus", contou. "Levava essas experiências para becos, debaixo de pontes e parques. Queria que pessoas em situação de rua pudessem jantar com dignidade."

Para fazer acontecer, ela corria atrás para comprar comida de supermercados, cortava cupons de desconto, procurava os melhores preços, pegava o que tinha disponível em bancos de alimento e aproveitava outras doações. Mas nenhum restaurante doava, mesmo com uma grande quantidade de comida sendo desperdiçada.

Jasmine é formada em administração de empresas sem fins lucrativos. Antes de lançar o aplicativo, trabalhava como consultora independente de filantropia e chegou a ajudar em eventos de atletas e artistas de hip-hop.

"Percebi que estávamos fazendo a mesma coisa, sempre igual, e esperando um resultado diferente", disse, sobre eventos para levantar doações de alimentos e criação de cestas básicas com produtos quase nunca saudáveis.

É incrível que já existem carros que se dirigem sozinhos e ainda não resolvemos a fome. Com os bilhões de dólares doados a caridades, já deveríamos ter resolvido há muito tempo. Precisamos ser mais espertos em conectar os pontos que estão debaixo de nossos narizes
Jasmine Crowe

Nos últimos três anos, França e Itália passaram a proibir supermercados de jogar comida fora, tornando programas de doação mandatórios. Crowe espera que o mesmo aconteça nos EUA e outros países. No Brasil, a lei 8137/1990 responsabiliza os restaurantes em caso de comida doada que faça mal à saúde do doador.

"Talvez assim vamos conseguir aumentar a frequência nas escolas, melhorar o estado de saúde de milhões de pessoas e reduzir o desperdício e o tamanho de nossos aterros. Vamos criar um ambiente melhor para todo.", conclui Jasmine.

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