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Com gestos e voz, Google dá pontapé para reinventar nosso uso do celular

Gabriel Francisco Ribeiro

De Tilt, em Nova York *

16/10/2019 04h00Atualizada em 16/10/2019 14h15

Sem tempo, irmão

  • Nova tecnologia no Pixel 4 permite comandar celular por gestos
  • Movimentos são limitados agora, mas perspectivas são maiores
  • Junto à voz, isso poderá fazer você usar celulares sem as mãos
  • Recurso é fruto de anos de pesquisa do Google

A nova missão do Google no universo dos celulares é mudar a forma como os controlamos. Em vez das mãos, voz e gestos. É o que vimos no lançamento do Pixel 4 e o Pixel 4 XL desta terça-feira (15). Isso parece bobagem, mas tem um potencial muito mais revolucionário do que aparenta.

Na apresentação, a empresa explicou como serão os controles de gestos dentro do Pixel 4. Já em uma conversa com a imprensa, adiantou uma evolução no uso de voz com o Google Assistente. Se você, como eu, não via grandes coisas nisso a princípio, revi meu conceito quando vi as demonstrações.

Essa é uma meta antiga do Google, que já foi bastante alardeada há pouco mais de um ano, quando sugeriu que o Assistente passaria a marcar compromissos com estabelecimentos como restaurante e cabeleireiro por telefone, como se fosse uma pessoa de verdade. Lembra disso?

Google Assistente marca compromissos por telefone

UOL Notícias

Desde o iPhone X que isso é tendência, e neste ano já tivemos a caneta do Galaxy Note 10 e o LG G8 ThinQ apostando nos gestos. Mas nesta semana, o Google foi além. Geralmente celulares reconhecem gestos normalmente pela câmera do aparelho, o que é algo limitado e até invasivo de privacidade. Os novos Pixels adotaram radares embutidos e miniaturizados.

Esse radar funciona da seguinte forma: em vez de ter uma visão limitada à área captada pela câmera, ele cria uma espécie de bolha invisível ao redor do celular. Nessa área, ele consegue entender sua aproximação e responder a diferentes comandos que o usuário fizer.

"O radar tem várias coisas legais. Não tem campo de visão, tem uma bolha e está sempre ligado (o usuário pode desligar se preferir). E o gesto é uma coisa, outra é o contexto. O celular precisa saber se algo está ali, entender a velocidade do gesto", explica Nanda Ramachandran, diretor global da divisão do Google Pixel.

Vimos na apresentação quatro funções dos tais comandos por gestos: rejeitar uma ligação, pular música (no Spotify ou YouTube Music), silenciar um alarme e dar tchau para um wallpaper do Pikachu. Tudo muito bobo e nada que mude a vida de alguém, de fato.

Ok, testei a função de pular música no Pixel 4 e foi bacana —você pode ver no vídeo no topo. Daí com a impressão de que não era para isso que o Google passou quatro anos investindo misteriosamente em uma nova tecnologia. Esperava mais. Mas imagino que serão o início de algo muito maior.

"Nós acreditamos que esse é só o começo. Leva tempo para isso ser ampliado, para entender gestos. São funções bobas, mas isso não será o uso principal. Acreditamos que essa é a base do que vem pela frente", afirmou Ramachandran.

Pixel 4 e Pixel 4 XL - novos celulares do Google - Gabriel Francisco Ribeiro/Tilt - Gabriel Francisco Ribeiro/Tilt
Imagem: Gabriel Francisco Ribeiro/Tilt

Limitações atuais

A tecnologia do radar nos Pixels será usada para movimentos mais completos de gestos com as mãos, mas a capacidade dele é enorme: consegue diferenciar até movimentos leves com o dedo ou até movimentos do seu corpo inteiro.

Inicialmente, o Pixel reagirá a só alguns pequenos gestos limitados a algumas funções. Cauteloso, o Google não abrirá, a princípio, essa tecnologia para apps terceiros e desenvolvedores. Nem chegarão a todos os usuários: entre os países em que o Pixel é vendido de forma oficial, o Japão só terá o recurso mais para frente, por exemplo. O Google não explicou muito bem o motivo.

O radar dos gestos pode ser desligado se o usuário não curtir muito a ideia. Mas fica o alento: por não ser uma câmera, ele não entende que é de fato um humano na frente do aparelho e não captura imagens. Apenas percebe que há algo nas redondezas e diferencia os gestos.

Esse recurso é algo revolucionário porque permite ao Google criar uma nova espécie de linguagem não-verbal do zero. Isso é complicado, já que existem muitas nuances: o gesto de uma pessoa pode diferir do de outra em muitas formas, como velocidade e movimento da mão.

São várias as formas que o Google tem procurado mostrar que quer fazer a gente desapegar de toques na tela. No próprio evento do Pixel, tinham jaquetas com chips —essas roupas tecnológicas "chipadas"— que deixam você comandar certas funções do celular sem tocá-lo.

Soma-se à voz: você é a interface

Se você não curte a ideia dos gestos, que tal a voz? As possibilidades dessa tecnologia também são gigantes. No site do Projeto Soli-- área do Google que investiga novas interações com máquinas-- isso fica claro. O mantra é: "você é a única interface que você precisa". E isso pode ser ampliado ao pensarmos na voz.

Os avanços que o Google fez no Assistente são marcantes nesta nova geração de celulares. Em uma demonstração, Nanda Ramachandran fez a seguinte sequência de comandos com a voz no seu Pixel 4:

- Mostre meu calendário
- Abra a calculadora
- Mostre minhas fotos de Taiwan
- Agora aquelas em que eu estou com a fantasia de Batman

Pode parecer pequeno, mas isso é de fato impressionante. Note que ele não fez o "Ok, Google" para iniciar a conversação —existem outras maneiras, como apertando as laterais do celular— e continuou pedindo ajuda em uma conversa fluida.

O mais impressionante foi o Assistente entender o contexto do último pedido dele e executar a tarefa via Google Fotos —e tudo feito com extrema rapidez, já que era processado dentro do celular, não nos servidores. Isso leva a nossa relação com assistentes por voz a um novo nível.

O Google ainda não quer fazer alarde, fez essas demonstrações em um ambiente controlado e já falhou antes nessas tentativas, como na primeira versão dos fones Pixel Buds, que prometiam tradução simultânea e não foi bem assim. Outro aparelho seu de interface diferenciada, o Google Glass, também não foi muito longe.

Talvez por conta desse histórico, a empresa ainda não está fazendo um escarcéu nem afirmando categoricamente que vai revolucionar os celulares (e a tecnologia) com isso. Mas se conseguir emplacar sua visão, um mundo em que seus dedos são desnecessários em um smartphone —e em várias outras tecnologias— será algo sem precedentes. Mais simples, mais direto, e mais próximo da nossa relação com pessoas de verdade.

* O repórter viajou a convite do Google

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