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Como técnicos da Huawei ajudaram governos africanos a espionar opositores?

Funcionários teriam colocado spyware em celular de rapper da Uganda - Fred Dufour/Reuters
Funcionários teriam colocado spyware em celular de rapper da Uganda Imagem: Fred Dufour/Reuters

Leonardo Martins

Colaboração para Tilt, em São Paulo

16/08/2019 13h01Atualizada em 16/08/2019 15h37

Sem tempo, irmão

  • Técnicos da Huawei teriam auxiliado governos da Zâmbia e de Uganda contra rivais
  • Eles se infiltraram no WhatsApp e acessaram redes sociais dos alvos, diz reportagem
  • Não há indícios de executivos da China envolvidos; Huawei negou todas as acusações
  • Investigação pode elevar desconfiança sobre empresa, impedida de vender nos EUA

Em um momento crítico no qual enfrenta abertamente leis do governo norte-americano que restringem suas operações nos EUA, a Huawei está no centro de uma reportagem do Wall Street Journal desta semana, na qual funcionários da empresa teriam ajudado governos africanos a grampear opositores.

Segundo a reportagem, técnicos da Huawei auxiliaram as forças de segurança dos países da Zâmbia e da cidade de Kampala, em Uganda, a obter mensagens de WhatsApp e acessar redes sociais de celulares de alvos escolhidos estrategicamente.

A investigação, segundo o jornal, inclui documentos secretos da polícia, documentos de comissões parlamentares, entrevista com diplomatas e com mais de uma dúzia de oficiais da segurança que trabalham com a Huawei em países africanos e com ativistas de oposição que afirmaram terem tido seus celulares hackeados.

Ação com governos

No ano passado, segundo a investigação, um grupo de seis agentes de inteligência do presidente de Uganda, Yoweri Museveni, estava com dificuldades para espionar o rapper Robert Kyagulanyi Ssentamu, conhecido como Bobi Wine, que atualmente é visto como a principal força política no país. O regime de Museveni preside Uganda há 33 anos.

A ordem de espionar Wine teria sido dada após uma viagem do cantor à Washington e foi justificada por uma lei de 2010 que "assegura aos interesses multidimensionais" do país. Nessa viagem, Wine teria ganho apoio do governo Trump para o seu movimento político de oposição.

Então, após uma série de dificuldades em invadir o WhatsApp e o Skype do cantor, os oficiais teriam pedido ajuda aos técnicos da Huawei, que é a maior fornecedora de produtos digitais no país, e estes teriam levado dois dias para acessar às redes de Wine. Para isso, o governo lançou mão de uma lei de 2010 que dá a ele a capacidade de "garantir seus interesses multidimensionais".

Os engenheiros da Huawei teriam usado um spyware para se infiltrar em um grupo de WhatsApp de Wine, chamado Fire Base, mesmo nome de sua banda. Com o acesso, autoridades ugandenses interceptaram comícios organizados pelo cantor e chegaram a prender dezenas de apoiadores.

Já na Zâmbia, ainda segundo o jornal, técnicos da Huawei ajudaram o governo a acessar telefones e páginas do Facebook de blogueiros de oposição que escreviam artigos críticos ao presidente do país, Edgar Lungu.

Em conjunto com a unidade de cibervigilância do governo, dois técnicos da Huawei teriam ajudado a encontrar a localização dos blogueiros e ficavam em contato constante com a polícia para conseguir detê-los.

O governo de Uganda confirmou ao jornal que técnicos da Huawei estavam trabalhando junto à polícia pela segurança nacional, mas não comentou as acusações de interceptação telefônica. O porta-voz do partido que governa Zâmbia confirmou que a Huawei atuou junto à uma instituição governamental para combater sites de notícias de oposição, mas que estes produziam notícias falsas.

A Huawei negou todas as acusações e diz que elas são "infundadas e imprecisas". "A nossa investigação interna mostra claramente que a Huawei e os seus empregados não têm envolvimento em qualquer uma das atividades alegadas", disse a empresa em nota enviada ao jornal.

Histórico recente

Desde 2012, o governo norte-americano acusa a Huawei de ser uma arma em potencial do governo chinês para espionar outros países. O imbróglio com Washington fez com que o governo norte-americano recentemente proibisse a empresa de comprar tecnologia americana, suspendendo o fornecimento de chips e softwares do Google.

A investigação do Wall Street Journal não revelou provas de que as espionagens na África teriam envolvimento do governo chinês. A reportagem também endossa não ter elementos que mostrem envolvimento de executivos da Huawei na China e que não identificou alguma diferença significativa na tecnologia da Huawei que facilite esse tipo de atividade ilegal.

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