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"Dividir não é resposta": veja 3 pontos da réplica do Facebook a cocriador

Chris Hughes e Mark Zuckerberg - Rick Friedman/Corbis via Getty Images
Chris Hughes e Mark Zuckerberg Imagem: Rick Friedman/Corbis via Getty Images

Márcio Padrão

Do UOL, em São Paulo

12/05/2019 17h11

Resumo da notícia

  • Cocriador escreveu artigo defendendo fatiá-la em várias empresas
  • Empresa diz que seu tamanho não importa, mas sua responsabilidade sim
  • Réplica aponta esforços de controle de danos, além de destacar concorrentes

Chris Hughes é um dos quatro cocriadores do Facebook e está fora da empresa há mais de dez anos. É também o mais novo membro seleto do clube dos anti-Facebook, após escrever um longo artigo para o New York Times nesta semana defendendo a separação da rede social em empresas menores. Claro que o Facebook não deixaria isso passar.

No sábado (11), foi a vez de Nick Clegg, vice-presidente global de comunicação do Facebook, defender a camisa da rede social, também em um artigo no New York Times. O título do texto deixa claro a intenção: "Breaking Up Facebook Is Not the Answer" ("Quebrar o Facebook não é a resposta"). No primeiro parágrafo, dá o tom:

Chris Hughes (...) argumenta que o Facebook deve ser desmontado porque ser 'grande' representa um risco para a sociedade. Na minha opinião - e da maioria das pessoas que escrevem sobre o impacto da tecnologia na sociedade - o que importa não é o tamanho, mas os direitos e interesses dos consumidores e nossa responsabilidade perante os governos e legisladores que supervisionam o comércio e as comunicações
Nick Clegg

Bem menor que o texto de Hughes, a réplica do Facebook —representado por Clegg— foca basicamente em três pontos: que não é justo dividir o Facebook apenas por ser muito grande; que a empresa está fazendo o que pode para acabar ou mitigar os diversos problemas sociais gerados direta ou indiretamente por ela; e que não é verdade que o Facebook é um colosso da internet sem concorrente à altura (o que reforçaria a necessidade de dividi-lo).

Sede do Facebook em Menlo Park, no Vale do Silício - Reprodução/Instagram - Reprodução/Instagram
Sede do Facebook em Menlo Park, no Vale do Silício
Imagem: Reprodução/Instagram

Tamanho é documento?

O que Chris Hughes disse? Que a concentração de mercado nas mãos de poucas empresas deteriorou o empreendedorismo, enquanto aumentou preços e piorou o serviço para consumidores. E o Facebook seria um exemplo dessa realidade nas redes sociais.

O Facebook lucra com publicidade direcionada à base de dados de usuários, como sabemos. E é sempre criticado por isso, mas se defende dizendo que esse modelo é o que sustenta a qualidade de seus serviços sem custos monetários para os clientes.

Sobre isso, Hughes diz que dividir a empresa a obrigaria a rever esse modelo, considerado problemático por sacrificar a privacidade alheia. Uma das empresas novas poderia continuar com serviço gratuito, outra cobraria uma taxa aos usuários para entregar pouca publicidade, e outra permitiria mais personalização do feed, e assim vai.

A defesa do Facebook: O tamanho do Facebook, para a empresa, é proporcional ao bem que realiza. Com mais de dois bilhões de usuários em todos os seus serviços (Facebook, Instagram, WhatsApp etc.), emprega 38 mil pessoas globalmente, e que mais de 90 milhões de pequenas empresas prosperam com a ajuda de suas plataformas. Também pelo Facebook, ONGs arrecadam dinheiro e promovem suas causas em cerca de 200 países.

"Nosso sucesso deu a bilhões de pessoas em todo o mundo acesso a novas formas de comunicação entre si. Ganhar dinheiro com anúncios significa que podemos fornecer essas ferramentas para as pessoas gratuitamente", disse o porta-voz.

E aí? O Facebook voltou ao mesmo argumento de sempre sobre publicidade x privacidade e não parece interessado em sequer discutir alternativas ao seu modelo de negócios. Faz o tradicional "não se mexe em time que está ganhando". E também não vê nada de errado em ser grande demais, desde que esteja ajudando as pessoas e encarando suas responsabilidades. É uma posição que faz sentido, mas que propositadamente ignora todos os transtornos causados pelas suas decisões erradas nos últimos anos.

O presidente da França, Emmanuel Macron, posa com executivo-chefe e cofundador do Facebook, Mark Zuckerberg, antes de sua reunião no palácio Elysee, em Paris - Yoan Valat/AFP - Yoan Valat/AFP
O presidente da França, Emmanuel Macron, posa com executivo-chefe e cofundador do Facebook, Mark Zuckerberg
Imagem: Yoan Valat/AFP

Regulação e política

O que Chris Hughes disse? Desde o ano passado, o Facebook tem aumentado seu lobby na esfera pública para supostamente contribuir com legislações que regulem a internet. Mas Hughes lembrou que isso já não deu certo. Em 2011, a Comissão Federal de Comércio dos EUA proibiu a empresa de compartilhar com empresas mais dados além daqueles que os usuários já haviam permitido. A regra não foi respeitada, como você já deve ter notado.

No mês passado, quando a empresa previu que precisaria pagar até US$ 5 bilhões como penalidade por sua negligência —um "tapa no pulso", segundo Hughes— as ações do Facebook subiram 7%, adicionando US$ 30 bilhões ao seu valor, seis vezes o tamanho da multa.

Esse contexto mostra que as ações recentes do poder público para frear o poderio do Facebook têm sido mínimas, enquanto mantém seu poder sobre o que é censurado ou deletado da rede social. E contou o caso de Mianmar no final de 2017, quando mensagens trocadas no Facebook Messenger que incentivaram genocídio foram deletadas sem aviso.

"É profundamente preocupante que ele tenha feito isso sem nenhuma responsabilidade perante nenhuma autoridade independente ou governo", diz Hughes. Ao mesmo tempo, executivos do Facebook haviam excluído permanentemente suas próprias mensagens da plataforma, alegando segurança corporativa.

A defesa do Facebook: Após defender o tamanho do Facebook, Nick Clegg apelou para uma versão do bordão do Tio Ben, do Homem-Aranha: "Com grande sucesso vem uma grande responsabilidade". Diz que atualmente a empresa opera sob mais regulamentação do que em qualquer ponto da história da empresa, e que mesmo assim deve haver mais.

Elencou as ações recentes da empresa contra a tempestade de problemas: reduzir a quantidade de conteúdo nocivo que as pessoas publicam; proteger eleições democráticas; apoiar regras unificadas para privacidade de dados; e dar aos indivíduos mais capacidade de mover facilmente seus dados.

"Em todas essas áreas, acreditamos que os governos devem tornar as regras consistentes com seus próprios princípios, e não com as de empresas privadas como o Facebook", alegou.

E aí? Sim, o Facebook está pressionando governos por mais regulação. Mas primeiro: nem sempre pensou assim. Segundo: suas tentativas são mais na intenção de impedir, nas palavras de Mark Zuckerberg em sua visita à França nesta semana, uma "mínima incerteza possível em nível jurídico", para a empresa continuar trabalhando livre de processos em todos os países onde atua. Terceiro: a pressão do Facebook é para garantir, na medida do possível, que as futuras regulações estejam as mais adequadas possível aos seus interesses.

Enquanto isso, a empresa segue em terreno pantanoso sobre impedir boatos e conteúdo de ódio, mas tentando não adquirir a pecha de censora. Nessa mesma ocasião na França, Zuck não pareceu disposto a adotar a sugestão do presidente Emmanuel Macron de retirar conteúdos denunciados em 24 horas.

Funcionário do Facebook trabalha com computador em sofá na sede da empresa em Menlo Park, na Califórnia (EUA) - Robert Galbraith/Reuters - Robert Galbraith/Reuters
Funcionário do Facebook trabalha com computador em sofá na sede da empresa em Menlo Park, na Califórnia (EUA)
Imagem: Robert Galbraith/Reuters

O monstro Facebook não tem rivais?

O que Chris Hughes disse? "Por muito tempo, os legisladores ficaram maravilhados com o crescimento explosivo do Facebook e negligenciaram sua responsabilidade de garantir que os americanos sejam protegidos, e os mercados, competitivos", disse ele. A empresa de Zuckerberg expulsou os que dependiam de sua infraestrutura (Vine, do Twitter), comprou os que tinham potencial (WhatsApp e Instagram) e copiou os que incomodavam (Snapchat).

Isso criou um ambiente que, por um lado, afastou novos investimentos em plataformas sociais e, por outro, tornou impossível às pessoas correr para outra plataforma para interagir pela internet.

"Mesmo que o rompimento e a regulamentação não sejam imediatamente bem-sucedidos, simplesmente pressionar por eles trará mais supervisão", disse Hughes, exemplificando com o processo antitruste que a Microsoft enfrentou na virada do século por forçar usuários a ter o Internet Explorer instalado no Windows.

A defesa do Facebook: Clegg fala em "implicações perigosas" para o setor tecnológico americano a partir dos argumentos de Hughes. E cita mal-entendidos sobre o Facebook e o objetivo central da lei antitruste.

O primeiro mal-entendido, segundo ele, é sobre o próprio Facebook, "uma grande empresa composta de muitas peças menores". Daí cita que em fotos e vídeos, o Facebook compete contra YouTube, Snapchat, Twitter, Pinterest e TikTok; em mensagens, com o iMessage, WeChat, Line e o Skype da Microsoft. "não somos líderes nos três principais mercados: China, Japão e, segundo nossa estimativa, nos EUA." E que grandes empresas de redes sociais chinesas, como Tencent e Sina, também têm o perfil de pluralidade de serviços do Facebook.

Ele retorna à questão dos anúncios e diz: "A maioria das estimativas diz que a participação do Facebook é de cerca de 20% do mercado de anúncios online dos Estados Unidos, o que significa que 80% de todos os anúncios digitais acontecem fora de nossas plataformas". Ele está se referindo obviamente ao Google, soberano nessa área e que também está sendo acusada de monopólio.

O segundo mal-entendido, para ele, é sobre a lei antitruste. "Essas leis, desenvolvidas nos anos de 1800, não são destinadas a punir uma empresa porque as pessoas não concordam com a sua administração. Seu objetivo principal é proteger os consumidores, garantindo que eles tenham acesso a produtos e serviços de baixo custo e alta qualidade".

E aí? Parece que o Facebook teve tempo para pensar em uma resposta melhor sobre concorrência, pois no ano passado o próprio Zuckerberg se enrolou um pouco para dizer no Congresso dos EUA quem eram os rivais diretos da sua empresa, tamanha a sua área de abrangência.

Para ser justo, não é apenas o Facebook que está sujeito a uma divisão, ou pelo menos a uma regulação econômica mais rígida. Outras gigantes de tec, como Amazon, Google e Apple, também esmagam concorrentes emergentes com relativa facilidade. Essa discussão só está começando a esquentar agora e ainda vai longe.

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