Não é só Apple: treta EUA x China resvala até na Qualcomm, líder em chip
A detenção da diretora financeira da Huawei no Canadá a pedido do governo dos Estados Unidos foi um dos golpes mais duros da briga que chineses e norte-americanos vêm travando há meses.
Até os dois países acertarem uma trégua em sua guerra comercial, a troca de farpas se resumia à imposição de tarifas. Agora que a gigante chinesa virou alvo de boicote da Casa Branca, consultores avaliam que outras gigantes de tecnologia, até então longe da linha de tiro, podem ser pegas no tiroteio. E não pense que se trata apenas da Apple. Correm risco Qualcomm, a maior fabricante de chips para celular do mundo, e Nokia, concorrente da Huawei em equipamentos de telecomunicação.
A avaliação é da consultoria em tecnologia e telecomunicações Ovum, que levantou quais são as companhias com maior exposição a retaliações do governo chinês. São firmas que possuem laços comerciais muito estreitos com o país asiático, ou seja, tiram de lá parte substancial de suas receitas, ou concorrem diretamente com gigantes chinesas e começaram a ter alguma entrada no maior mercado do mundo.
Uma ação mais dura de Pequim não está descartada. Tanto é que a mídia chinesa já começou a sugerir que algo pode acontecer. "O fracasso em garantir uma abertura recíproca significa que as empresas deles não receberão qualquer benefício da economia digital da China", escreveu o jornal "Global Times".
Motor do Android
Na linha de frente, está uma empresa bastante conhecida de quem usa celular Android.
A Qualcomm está altamente exposta. Se o governo chinês resolver retaliar americanas, uma óbvia escolha é a Qualcomm
Ari Lopes, analista da Ovum
Ela é a dona da maior parte dos processadores para celulares que rodam o sistema operacional do Google, mas também possui um catálogo enorme de patentes essenciais para empresas de aparelhos de telecomunicação. Isso a faz ser uma fornecedora crucial para quem quiser fabricar smartphones.
"Ela ganha uma taxa a cada dispositivo que tenha chips ou tecnologia dela embarcados. Muitos dos licenciamentos dela são para empresas do mundo Android, e por isso o mercado chinês é importante."
Quer ver como o país é crucial para a norte-americana? Na semana passada, a Qualcomm anunciou seu primeiro chip para smartphones compatíveis com o 5G, a nova tecnologia de conexão móvel que vai suceder o 4G. A primeira a coçar o bolso e virar compradora do componente foi a chinesa Oppo, uma fabricante emergente de smartphones que começou a fungar no cangote da Apple, após a dona do iPhone ser superada pela Huawei e cair para o terceiro lugar em vendas globais de celulares.
Ainda que o perigo seja por ora virtual, os estilhaços da disputa comercial entre China e EUA já vêm afetando os planos da companhia. Em julho, a Qualcomm desistiu de comprar a fabricante holandesa de chips NXP Semiconductors por US$ 44 bilhões. O motivo? Os reguladores chineses não emitiram uma aprovação ao negócio a tempo. "Isso foi interpretado como uma má vontade do governo chinês", diz Lopes.
Mas também há fogo amigo. O governo norte-americano impediu a Qualcomm de ser vendida para a Broadcom, de Singapura, por US$ 117 bilhões. O negócio multibilionário seria um dos maiores da história da tecnologia. Melada por uma ordem presidencial, a aquisição, diz a Casa Branca, "poderia ser uma ação que ameaça desiquilibrar a segurança nacional dos EUA".
A avaliação do governo dos EUA é que, caso o negócio fosse concluído, áreas sensíveis da administração federal, como o Exército, deixariam de poder contar com uma empresa norte-americana forte na área de telecomunicação.
Uma ação mais incisiva da China poderia prejudicar de forma fundamental a Qualcomm, já que 65% de suas receitas vêm do país, segundo dados levantados pelo banco Goldman Sachs.
Ícone do celular
Outra companhia que pode ser atingida é a Nokia. Você deve conhecer a empresa por ela ter dado nome a uma das icônicas do mundo dos celulares pré-iPhone. Mas isso é passado. Hoje em dia, a finlandesa é, sim, uma fabricante de equipamentos de telecomunicação, que domina o mercado norte-americano ao lado da Ericsson devido à ausência das chinesas Huawei e ZTE. Ela é, por exemplo, a parceira da T-Mobile para lançar o 5G em terras norte-americanos. Valor da brincadeira: US$ 3 bilhões.
Só que a Nokia começava a entrar também no mercado chinês. Recentemente, fechou um acordo bilionário com a China Mobile, o que a fez ter contratos da ordem de 2 bilhões de euros com empresas chinesas. O que poderia ser o início de uma inserção no maior mercado do mundo -- são 800 milhões de usuários -- pode ser abreviado caso a China decida retaliar.
"Assim como os EUA estão pressionando vários países a parar de comprar Huawei, a China pode dizer que empresa chinesa só compra ZTE e Huawei", comenta Lopes.
Após colocar em marcha medidas para evitar que Huawei e ZTE vendam em seu mercado, o governo dos Estados Unidos passou a pedir a aliados que fizessem o mesmo. Austrália, Nova Zelândia e Japão toparam; no Reino Unido, a British Telecom entrou no boicote para alguns tipos de equipamentos.
Além de Qualcomm e Nokia, estão correndo risco outras firmas, como Cisco e Palo Alto Networks, avalia o consultor da Ovum. "A Huawei compete com essas empresas de redes em roteadores e switches. Pode haver um movimento protecionista, e todas as que tiverem negócios com a China podem sofrer."
A Apple é outra cotada a virar alvo, já que 20% das vendas de iPhone vêm da China. "Fora isso, boa parte da produção é feita na China, o que é difícil de substituir", comenta Lopes. Só que, caso o disparo seja feito pelo governo chinês, pode acabar sendo um tiro no pé. "Ela emprega muita gente na China e, qualquer ação contra ela, pode afetar também o país."
Essa guerra comercial mostra como o mundo está conectado porque todas essas empresas têm muito a perder, porque elas tanto vendem como compram da China
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