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Ataques racistas: acabar com o anonimato nas redes sociais é o melhor caminho?

Marcus Rashford disse que foi submetido à "pior face das mídias sociais" após o empate de 0 a 0 do Manchester United com o Arsenal no último sábado (30/01) - Carl Recine/Reuters
Marcus Rashford disse que foi submetido à "pior face das mídias sociais" após o empate de 0 a 0 do Manchester United com o Arsenal no último sábado (30/01) Imagem: Carl Recine/Reuters

Rory Cellan-Jones - Repórter de tecnologia da BBC News

02/02/2021 08h23

Depois que o jogador de futebol Marcus Rashford e outros atletas enfrentaram abusos, ativistas pedem que as regras dos aplicativos e sites sejam repensadas.

Os gigantes das mídias sociais estão novamente no banco dos réus público por causa do fracasso em policiar suas plataformas de forma eficaz.

O problema da vez é a onda de comentários e mensagens racistas enviados ao atacante Marcus Rashford, do Manchester United.

Além de Rashford, outros jogadores da Premier League, o campeonato inglês, estão enfrentando a mesma situação em seus perfis, o que tem gerado pedidos de ações mais contundentes.

A cada dia, a pressão aumenta para que Twitter, Instagram e outras plataformas façam algo para impedir o envio de mensagens de ódio.

Essas empresas estão sendo instadas a usar sua experiência em inteligência artificial para detectar mensagens racistas, mesmo enquanto elas estão sendo escritas, e incentivar que os autores repensem o envio ou até os impeça de publicar.

Outra ideia que está ganhando força é acabar com o anonimato nas redes sociais, para que, assim, os racistas possam ser rastreados.

Informação verificada

Margaret Hodge, representante do Partido Trabalhista do Reino Unido, diz receber milhares de tuítes abusivos todos os meses.

Em dezembro de 2020, ela pediu a proibição do anonimato para usuários de mídia social.

"As pessoas argumentam que o anonimato permite a participação democrática adequada, mas acho que os danos superam os benefícios", disse ela ao jornal The Guardian.

Os ativistas antirracistas não estão dizendo que todos precisam necessariamente postar em seus próprios nomes, mas, sim, dar às redes sociais um meio de identificá-los se eles infringirem a lei.

"Você precisa ter essa verificação de informação para que, se alguém abusar do privilégio do anonimato, esse dado possa ser compartilhado de forma rápida e transparente com as autoridades", disse Sanjay Bhandari, executivo-chefe da Kick It Out, uma organização que trabalha para acabar com o racismo no futebol e na sociedade, ao programa de rádio BBC Radio 4's Today nesta segunda-feira (01/02).

Como evitar danos

Acabar com o anonimato pode parecer uma solução simples e óbvia.

Mas quando resolvi coletar opiniões sobre essa proposta no Twitter, muitos entrevistados viram muitos problemas.

Eles apontaram que em algumas partes do mundo o anonimato é vital para que as pessoas consigam expressar seus sentimentos e opiniões a respeito do governo ou falar sobre sua sexualidade.

"E isso é verdade tanto no Reino Unido quanto no exterior", disse o fundador da startup Aplisay, @robinjpickering.

"Não vamos nos enganar achando que isso só se aplica a lugares distantes, fora de nossas fronteiras", escreveu ele.

"Mesmo no Reino Unido, ser franco sobre sexualidade, discordar publicamente de um empregador ou escapar de um parceiro abusador são circunstâncias em que a privacidade é necessária para evitar danos", completa.

Vidas privadas

Para @curiousiguana, um professor que usa o Twitter sem identificar o próprio nome, o banimento do anonimato seria um motivo para abandonar as redes sociais.

"Minhas informações pessoais não estão publicadas nas redes", escreveu o titular da conta. "Professores não podem arriscar que os alunos encontrem suas vidas privadas. A linha entre profissional e pessoal significa que tenho que permanecer anônimo ou ficar insosso, apolítico e sem graça."

O pesquisador de ciências sociais Sunil Rodger, que tuíta como @sunildvr, avalia: "O anonimato não é uma questão 'técnica' em si, mas evolve uma questão social".

"Uma solução técnica simplista, como banir o anonimato, não resolverá os problemas sociais em torno da questão."

Outros perfis, no entanto, enxergam maneiras de limitar o uso de contas anônimas sem aboli-las por completo.

"Eu entendo que há uma limitação do que pode ser feito", aponta Damian Rafferty, que tuíta como @mrfly. "Mas eu gostaria de ver um trabalho sério para tornar a vida de trolls e racistas muito mais difícil — como etapas de verificação, ficar sem postar nada sobre outras contas por 14 dias, remoções rápidas..."

'Anarquia'

Para algumas pessoas, incluindo a ex-parlamentar britânica Helen Goodman (@helengoodmanBA), há apenas uma resposta para acabar com esse crime.

"Há muito tempo que acredito no fim do anonimato", escreveu ela. "Não é liberdade, é anarquia."

A especialista em relações públicas @ellaminty concorda. "Palavras podem matar. Palavras machucam."

E acrescenta: "As palavras podem desestabilizar e afetar a muitos. A mídia social é um mercado, não um espaço sem regras".

Como barrar o racismo e os ataques de ódio?

Vale lembrar que mesmo as redes sociais que exigem o uso de nomes reais nos perfis não estão imunes a abusos.

O Facebook, por exemplo, tem lutado para policiar o comportamento de seus usuários.

Enquanto isso, o Parler, a rede preferida por muitos daqueles que são banidos de outras plataformas de mídia social, pede um documento de identidade com foto quando as pessoas abrem suas contas.

É possível que, nos próximos meses, exista alguma pressão política para incluir a proibição do anonimato online em futuras leis e regulamentações do setor.

Mas é provável que os governos de várias partes do mundo enxerguem muitas dificuldades práticas nesta abordagem.

E isso, claro, aumentará a pressão para que as próprias plataformas encontrem alguma outra forma de conter ou prevenir o abuso em sua origem, antes que ele seja publicado.