Topo

Como a inteligência artificial faz você comprar coisas, mesmo sem precisar

Echo Dot, a caixa de som com inteligência artificial da Amazon - Getty Images
Echo Dot, a caixa de som com inteligência artificial da Amazon Imagem: Getty Images

Jane Wakefield

Repórter de Tecnologia da BBC News

10/11/2020 12h56

Os varejistas estão usando cada vez mais a IA para tentar prever o que os clientes compram.

As listas de compras que rabiscávamos no verso de um envelope já são cada vez mais conhecidas pelos supermercados que frequentamos.

Em primeiro lugar, através dos cartões de fidelidade que digitalizamos nas caixas e, cada vez mais, por nossos carrinhos de compras online, os nossos hábitos de compra deixaram de ser um segredo.

Mas agora mais varejistas estão usando IA (inteligência artificial)— sistemas de software que podem aprender por si mesmos— para tentar prever e encorajar automaticamente nossas preferências e compras como nunca antes.

O consultor de varejo Daniel Burke, da Blick Rothenberg, chama isso de "o cálice sagrado (...) para se construir um perfil de clientes e sugerir um produto antes que eles percebam que é o que queriam".

Portanto, da próxima vez que você entrar em sua loja local para comprar certas comidas e um determinado vinho em uma noite de sexta-feira, talvez você possa culpar pela sua própria decisão a IA e um computador que aprendeu tudo sobre você.

Will Broome é o fundador da Ubamarket, uma empresa do Reino Unido que desenvolve um aplicativo de compras que permite às pessoas pagar por itens por meio de seus telefones, fazer listas e escanear produtos em busca de ingredientes e alérgenos.

"Nosso sistema de IA rastreia os padrões de comportamento das pessoas em vez de suas compras, e quanto mais você compra, mais a IA sabe sobre os tipos de produtos que você gosta", diz ele.

"O módulo de IA foi projetado não apenas para fazer as coisas óbvias, mas ele aprende na medida em que é usado e passa a se tornar premonitório. Ele pode começar a construir um cenário de quão provável é você experimentar uma marca diferente ou comprar chocolate em um sábado."

E pode oferecer o que ele chama de "ofertas hiperpersonalizadas", como vinho mais barato em uma noite de sexta-feira.

O Ubamarket não vinha conseguindo convencer os maiores supermercados do Reino Unido a adotar o aplicativo, então, em vez disso, fez acordos com cadeias de lojas de conveniência menores no Reino Unido, incluindo Spar, Co-op e Budgens, que não são tradicionalmente adeptas da alta tecnologia.

A aceitação do aplicativo continua baixa, mas está crescendo, em parte graças à pandemia de coronavírus, que tornou as pessoas mais relutantes em tocar em caixas registradoras ou em filas.

"Com o aplicativo, descobrimos que o conteúdo médio de uma cesta sobe 20% e as pessoas com o aplicativo têm três vezes mais chances de voltar a fazer compras naquela loja", diz Broome.

Na Alemanha, uma start-up de Berlim chamada SO1 está fazendo coisas semelhantes com seu sistema de IA para varejistas. Afirma que nove vezes mais pessoas compram produtos sugeridos por IA do que aqueles oferecidos por promoções tradicionais, mesmo quando os descontos são 30% menores.

Receber ofertas de produtos que você realmente deseja comprar em vez de cupons aleatórios é ótimo para os consumidores. No entanto, Jeni Tennison, que dirige o Instituto de Dados Abertos do Reino Unido, um órgão que faz campanha contra o uso indevido de dados, permanece cautelosa sobre a vasta quantidade de informações sobre as pessoas que estão sendo coletadas.

"As pessoas ficam felizes com os produtos recomendados, mas começam a se sentir mais desconfortáveis quando são 'cutucadas' ou manipuladas em compras específicas baseadas na caricatura de quem são, e não na complexidade total de sua personalidade", diz ela.

E ela acrescenta que existem questões sociais mais importantes levantadas pelo uso de IA no varejo.

"Precisamos perguntar o quão equânime e ética é a coleta de dados. Então, por exemplo, as mulheres brancas de classe média estão recebendo desconto em verduras frescas, mas isso não está sendo oferecido a alguém que realmente poderia se beneficiar com isso?", diz Tennison.

"O que realmente precisamos entender é o impacto da coleta de dados e do tipo de perfil feito em diferentes setores da sociedade. É um perfil das pessoas com base em raça, status socioeconômico, sexualidade?"

A gigante online Amazon não é estranha à coleta de dados. Ela possui uma vasta quantidade de informações sobre os seus clientes, desde as suas compras online e através dos seus próprios produtos que coletam dados, como as campainhas Ring e caixas de som Echo. Agora a Amazon está fazendo a transição do digital para o varejo físico, com lojas de verdade repletas de tecnologia de visão por computador auxiliada por IA.

Isso significa que em suas lojas Amazon Go, atualmente em funcionamento em 27 locais nos EUA, as pessoas podem fazer compras sem interação com um humano ou caixa registradora.

Elas simplesmente passam seus smartphones no scanner quando entram no supermercado, pegam o que querem comprar e saem. A IA está observando, é claro, e envia uma conta no final.

As primeiras lojas Amazon Go eram locais pequenos, devido ao alto custo dos sensores e equipamentos necessários, mas a empresa está gradualmente se expandindo para lojas maiores.

A Amazon também está desenvolvendo tecnologia para supermercados que não querem reformar suas lojas com sistemas tão caros. É aqui que entra o Dash Cart, um carrinho de supermercado repleto de sensores para detectar e agrupar tudo o que você coloca nele.

Na loja de Los Angeles onde isso está sendo testado, existe uma via expressa especial para pagamentos, sem a necessidade de um ser humano supervisionar, é claro.

Outro varejista dos EUA, a Kroger, está experimentando prateleiras inteligentes equipadas com telas de LCD que exibem conteúdo contextualizado projetado para atrair os clientes até elas. Algumas ofertas exibem conteúdo personalizado conectando-se via Bluetooth a aplicativos de fidelidade em telefones.

Mais de três quartos dos grandes varejistas em todo o mundo já possuem sistemas de IA em funcionamento ou planejam instalá-los antes do final do ano, de acordo com o grupo de pesquisa Gartner.

O analista da empresa, Sandeep Unnim diz que a pandemia global acelerou essa tendência porque mudou drasticamente os hábitos do consumidor.

"As pessoas entravam em pânico quando compravam (em meio à pandemia) e se concentram em bens essenciais em vez dos não-essenciais, o que por sua vez cria um enorme desequilíbrio entre oferta e demanda", diz ele. "Isso significa que vimos as prateleiras ficando vazias e a previsão de demanda de repente não estava funcionando."

A empresa americana Afresh fabrica sistemas de abastecimento baseados em IA para supermercados para ajudar a planejar melhor os níveis de estoque necessários.

O fundador da Afresh, Matt Schwartz, diz que a equipe precisou ensinar os sistemas de IA sobre os principais eventos do calendário, como o recente Halloween.

"Historicamente, levar em consideração coisas como feriados (e outros eventos) tem sido um dos maiores desafios para a IA", diz ele.

"(E) não podemos automatizar totalmente, excluindo os humanos. A IA pode oferecer 20 sugestões de abóboras para outubro, e os humanos podem ajustar isso se for preciso."

Já assistiu aos nossos novos vídeos no YouTube? Inscreva-se no nosso canal!

https://www.youtube.com/watch?v=psgNuJG7hUI

https://www.youtube.com/watch?v=—5wYWmkAVs

https://www.youtube.com/watch?v=DYBulDVkxz0