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Grupo francês Total age deliberadamente contra clima desde 1980, diz estudo

20/10/2021 10h08

Paris, 20 Out 2021 (AFP) - O gigante francês do setor de energia Total conhecia as consequências nefastas de suas atividades para o clima desde 1971, mas, desde os anos 1980, criou obstáculos e semeou dúvidas sobre a limitação do uso de combustíveis fósseis - diz um artigo científico divulgado nesta quarta-feira (20).

Publicada no periódico Global Environmental Change, a pesquisa revela que já em 1971 uma publicação da revista Total explicava que a queima de combustíveis fósseis levava à "liberação de enormes quantidades de gás carbônico" e ao aumento, de forma "bastante preocupante", deste gás na atmosfera.

Ainda assim, o grupo francês de petróleo e gás não tomou qualquer medida diante destas advertências, observam os pesquisadores.

Esta pesquisa foi conduzida por Christophe Bonneuil, diretor de pesquisa do CNRS, Pierre-Louis Choquet, sociólogo da Sciences Po, e Benjamin Franta, pesquisador de história na universidade americana de Stanford.

Em meados da década de 1980, outro gigante do setor, a empresa americana Exxon, por meio da IPECA, a associação da indústria petroleira voltada para o meio ambiente, desenvolve uma campanha internacional para "contestar as ciências climáticas e enfraquecer os controles sobre os combustíveis fósseis", acrescenta o artigo.

"A novidade é que pensávamos que apenas a Exxon e os grupos americanos estivessem na duplicidade", mas "percebemos que nossos campeões do petróleo franceses participaram desse fenômeno pelo menos entre 1987 e 1994", explicou à AFP Christophe Bonneuil, falando de uma "fábrica da ignorância".

O IPIECA "torpedeou por meio de lobby ativo os projetos de ecotaxa da Comissão Europeia entre 1990 e 1994" e outros projetos de regulação das energias fósseis, declarou o pesquisador durante uma coletiva de imprensa online.

Segundo ele, "há notas internas comemorando esse trabalho de lobby" nos arquivos dos grupos franceses estudados.

Ao mesmo tempo, a Total e a Elf buscaram adquirir credibilidade ambiental por meio de compromissos voluntários, sugere o estudo.

Com a Cúpula da Terra no Rio, em 1992, e com a assinatura do Protocolo de Kyoto, em 1997, a situação começa a mudar.

"A indústria petroleira francesa para de questionar publicamente as ciências climáticas, mas continua aumentando seus investimentos na produção de petróleo e gás" e, ainda conforme os pesquisadores, continua insistindo em "minimizar a urgência (climática) e a desviar a atenção das energias fósseis como a primeira causa da mudança climática".

Em meados dos anos 2000, uma nova estratégia. Seu CEO na época, Thierry Desmaret, reconhece a realidade das mudanças climáticas.

Christophe Bonneuil qualifica esta fase da "era do greenwashing" onde "o que está em jogo é a capacidade da Total de se colocar em cena do lado das soluções e não do lado do problema".

Em resposta enviada à AFP antes da publicação do artigo científico, o grupo Total declarou que: "Os executivos da Total (...) reconhecem a existência da mudança climática e sua ligação com as atividades da indústria do petróleo" e que, desde 2015, têm como objetivo "serem um ator importante na transição energética".

"É imperativo que o Parlamento analise essas revelações com uma uma comissão de inquérito", pediram as ONGs Notre Affaire e 350.org em um comunicado conjunto.

Elas também criticam o fato de que "a TotalEnergies ainda pretende aumentar sua capacidade de produção e desenvolver novos projetos devastadores em regiões protegidas".

O que essa investigação mostra "é extremamente sério", insistiu Marie Toussaint da Notre Affaire na coletiva de imprensa. "Estamos falando de uma empresa intimamente ligada ao Estado francês", que já foi acionista do grupo petrolífero no passado, assim como da Elf, lembrou.

Um estudo de 2017 já mostrava que a petroleira ExxonMobil sabia, desde os anos 1980, que o fenômeno da mudança climática era real e estava ligado à atividade humana. Mas o grupo se esforça há anos para manter as dúvidas sobre essa realidade, enganando assim seus acionistas e cidadãos.

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