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Ricardo Cavallini

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Starlink: descubra se a internet via satélite de Elon Musk serve para você

Missão da SpaceX coloca satélites  do projeto Starlink em órbita - Divulgação/ SpaceX
Missão da SpaceX coloca satélites do projeto Starlink em órbita Imagem: Divulgação/ SpaceX

08/02/2022 04h00Atualizada em 09/02/2022 08h25

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Este mês a Anatel autorizou a Starlink a oferecer internet via satélite no Brasil. Subsidiária da SpaceX, de Elon Musk, a empresa vai usar milhares de satélites para prover o serviço para o mundo todo.

Para ser assinante você precisa comprar uma antena, similar às antenas parabólicas que usamos para TV, só que para internet. Desta forma, não funciona diretamente no celular, mas os smartphones têm acesso a internet através do wi-fi gerado pelo roteador da antena.

A Starlink é o que chamamos de internet com portabilidade, mas não mobilidade.

Eu explico.

Imagine que você vai viajar pelo Brasil em uma Kombi e botou uma antena da Starlink no teto do carro. Toda vez que parar o carro em algum lugar, vai precisar de energia elétrica e calibrar a antena para funcionar, ou seja, não terá internet enquanto estiver em movimento, não tem mobilidade.

Mas por ser portátil, com uma antena e uma assinatura do serviço, você poderá levar a "sua internet" para a casa de praia nos finais de semana ou quando mudar de endereço.

Outro ponto relevante é que, assim como as antenas parabólicas de TV, você precisa ter visão clara do céu para funcionar.

Se a sua casa é rodeada por prédios, grande chance de não funcionar. Se você mora em um apartamento, muito provavelmente terá que pedir autorização para o prédio para instalar a antena na cobertura e puxar um cabo até o seu apto.

Principais clientes da empresa

A empresa só é viável por ser parte da SpaceX, que está revolucionando a viagem espacial, tornando muito mais barato enviar satélites ao espaço.

O serviço possibilitará a empresa vender acesso a internet para o mundo todo.

Um dos principais filões será prover o serviço para locais remotos e zona rural. Pense na agricultura com todos os seus avanços, como veículos autônomos, internet das coisas, inteligência artificial. Tudo isso vai precisar de internet.

Apesar de existirem uma série de outras tecnologias e soluções de comunicação, a Starlink com certeza será uma delas. E este público tem bastante dinheiro para investir.

Outro público que não pode ser desconsiderado são os muito ricos em lugares pobres. A desigualdade no mundo é enorme. Mesmo em países muito pobres, com infraestrutura capenga, tem muita gente rica.

Contudo, um dos melhores clientes da empresa deve ser o mercado financeiro. Por utilizar robôs que tomam decisão, compram e vendem ações em milésimos de segundo, o intervalo (latência) pode significar bilhões perdidos.

Mesmo usando fibra ótica, um computador no Japão que opera na bolsa de NY passa por milhares de km de cabo, divididos em dezenas de roteadores. Toda essa distância e todos esses passos acrescentam dezenas de milissegundos no processo.

Por operar no vácuo (espaço), a Starlink promete ter um tempo de resposta muito menor, mesmo com a informação tendo que subir e descer do espaço. Tudo isso vale muito dinheiro para o mercado financeiro.

Quanto custa e para quem serve?

O preço atual da antena é de US$ 2.500 (cerca de R$ 13 mil) para o serviço premium — há ainda um serviço básico em que a antena custa US$ 500 (cerca de R$ 2.600). Com tarifas de importação, taxas e o famoso "custo Brasil", este valor pode facilmente passar dos R$ 30 mil.

Obviamente, conforme nos ensina a Lei de Wright, estes valores irão cair nos próximos anos. Analistas acreditam que em alguns anos poderá ser vendida por US$ 500. Por enquanto, a assinatura do serviço premium é de US$ 100 para até 250 Mbps e US$ 500 para até 500 Mbps.

Mas analisar o custo-benefício não é tão simples, então fiz algumas ponderações abaixo para refletirmos juntos.

Só para ricos?

Parece coisa de gente rica, mas se pensarmos no coletivo, uma aldeia no meio da Amazônia ou em favelas, talvez seja uma opção.

Fazendo uma conta no papel de pão, pense em dividir os custos e a banda entre várias pessoas. Por exemplo, 50 residências em uma favela.

Dividido, o preço da antena seria equivalente o dobro do preço de instalar uma antena parabólica em cada casa. Caro, mas viável.

Com a assinatura mensal compartilhada, se não tivermos um preço em reais especial para o Brasil (como acontece com alguns serviços), cada residência pagaria cerca de R$ 11 por mês por uma banda de 1 a 5 Mbps. O gargalo seria mesmo no upload, importante para enviar arquivos, reuniões por vídeo ou lives. Quando compartilhada por todos, a banda não chegaria nem perto de 1 Mbps.

Parece muito pouco, mas a questão é o parâmetro de comparação. Hoje, a banda média do 3G no Brasil não chega a 1 Mbps. Uma pesquisa feita ano passado pelo Instituto Locomotiva mostrou que 13% dos moradores de favelas não tem acesso ao sinal 3G e 30% com acesso ruim ou muito instável.

Outro fator importante, os planos de 3G, 4G ou 5G têm limites de transferência e, em algumas regiões, muita instabilidade.

Tudo isso sem levar em conta a possibilidade do governo, instituições de caridade ou a própria Starlink bancarem o serviço gratuitamente para regiões ou comunidades mais pobres. Se pensarmos em aulas ou trabalho feitos remotamente, este deveria ser um benefício social pensado com bastante carinho.

Vale a pena para quem já tem banda larga?

Se você tem uma boa banda larga hoje, dificilmente a Starlink vai valer a pena para você. Ela é mais cara e entrega menos.

Se a sua internet é ruim porque não pode pagar por uma melhor, a resposta é não. A Starlink será mais cara, principalmente se levar em conta o investimento em antena.

No caso da sua internet ser ruim, você poder pagar por uma melhor mas ela não está disponível onde você mora, a Starlink seria uma ótima opção.

Existe uma ponderação a ser feita.

O 5G deve, entre outras coisas, fomentar a instalação de uma melhor malha de fibra ótica no Brasil, e um possível efeito colateral pode ser ampliar bastante o acesso (e até o custo) da banda larga para algumas pessoas.

Pode demorar 2 ou 3 anos para isso acontecer, mas se estamos falando de investir milhares de reais em uma antena, você deveria ponderar essa possibilidade.

Vale a pena para jogadores de eSports?

Vale os pontos anteriores, a Starlink é cara e não é melhor que uma boa banda larga.

Mas se você é ou pretende ser profissional, pode valer muito a pena viabilizando treinar e competir com os melhores do mundo. Isso porque, da mesma forma que expliquei sobre o mercado financeiro, jogar em servidores muito distantes, como China, Coreia ou Japão, a latência promete ser bem menor.

Vale a pena para empresas e cidades?

Para empresas e cidades me parece ser uma ótima solução, não para substituir, mas para agregar.

Imagine uma equipe tática quando for atuar em regiões de catástrofe onde a primeira coisa que vai embora é a infraestrutura.

Cada cidade deveria ter pelo menos uma antena para situações assim. Um parque ou grande zoológico pode prover internet sem necessidade de grandes instalações.

Para alguns tipos de empresa pode ser muito útil. Uma produtora que filma em externas e áreas remotas. Uma emissora de TV. Uma construtora pode ter internet boa em seus terrenos logo no início do projeto.

Mesmo para empresas tradicionais me parece ser uma escolha fácil ter a Starlink como redundância. Seu link de internet caiu? Use a Starlink.

Em São Paulo, por exemplo, muitos bairros ficam sem internet quando chove, mesmo sendo uma chuvinha fraca. Se São Paulo que é o maior PIB da América Latina é assim, fico imaginando o resto do Brasil.

Servindo para você ou não, ter mais opções (e mais concorrência), é uma boa notícia para todos.