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ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

Se um astronauta ficar à deriva, flutuaria para sempre ou cairia na Terra?

Pizar Almaulidina/ Pixabay
Imagem: Pizar Almaulidina/ Pixabay

26/04/2021 04h00Atualizada em 30/04/2021 13h56

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Se um astronauta ficasse à deriva, ele flutuaria para sempre ou cairia na Terra? - Pergunta de Jorge Florêncio, de São Paulo (SP) - quer enviar uma pergunta também? Clique aqui.

Salve, Jorge. Depende. Se o astronauta ficar à deriva numa altitude igual à da Estação Espacial Internacional (ISS) e orbitando com a mesma velocidade dela, pode ficar flutuando por alguns anos.

A primeira chance clara de isso acontecer, digamos, ocorreu há quase quarenta anos. Em 1984, o americano Bruce McCandless foi o primeiro astronauta a fazer um voo solo fora do planeta sem amarras à nave-mãe --o soviético Aleksei Leonov foi o primeiro a caminhar no espaço em 1965, mas ele esteve preso à sua nave por uma corda.

Ele era parte da tripulação do ônibus espacial Challenger e em 7 de fevereiro saiu da nave pilotando uma mochila propulsora chamada MMU (sigla em inglês para unidade de manobra manual).

Pela primeira vez, uma pessoa saía de uma nave espacial sem nada que a prendesse. McCandless se afastou quase 100 metros do ônibus espacial, ficou soltão no espaço e voltou com segurança.

Mas e se algo tivesse dado errado com seu equipamento de voo e ele não conseguisse controlar seu retorno nem ser pego de volta pelos colegas de Challenger?

De acordo com Claudio Furukawa, do Instituto de Física da USP (Universidade de São Paulo), um astronauta à deriva poderia ficar flutuando em órbita terrestre por alguns anos. Mas não seria um passeio suave, não.

Como ele estaria inicialmente orbitando com a Estação Espacial Internacional, estariam ambos com a mesma velocidade tangencial em relação à Terra, que é da ordem de 28 mil km/h, numa altitude de cerca de 400 quilômetros. Essa velocidade é o que garante que objetos fiquem em órbita por longos períodos em vez de cair direto para a Terra.

"Ao contrário do que muitos pensam, nestas altitudes ainda existe gravidade e é muito grande: cerca de 90% da aceleração gravitacional que existe aqui na superfície terrestre. Por isso, se um corpo em repouso fosse simplesmente solto lá de cima, iria cair como uma pedra", acrescenta Furukawa.

No caso de um astronauta se desprendendo da ISS, ele manteria uma velocidade tangencial parecida com a da sua origem, na casa dos 28 mil km/h, e morreria em pouco tempo, sem alimento.

Mesmo nestas altitudes ainda existem forças de arrasto sobre a Estação e sobre outros corpos, pois o vácuo não é perfeito e provoca uma leve diminuição na velocidade deles. Isto faz a altitude da ISS diminuir cerca de 100 m por dia. Por isso, a Estação precisa ser constantemente reposicionada para manter a órbita.

Já o astronauta à deriva, mesmo caindo, demoraria alguns anos até atingir camadas da atmosfera com ar menos rarefeito. "Ao penetrar a atmosfera, a compressão rápida do ar que está à frente do objeto em movimento, também chamada de compressão adiabática, ocasionaria um superaquecimento, provavelmente incinerando o astronauta", diz Furukawa.

Haveria ainda a mórbida possibilidade de nosso hipotético astronauta à deriva permanecer flutuando indefinidamente em órbita, caso a sua órbita se iniciasse em altitudes maiores, onde o vácuo é mais acentuado, como ocorre com os 34 mil objetos com mais de dez centímetros de diâmetro que formam o lixo espacial ao redor da Terra.

Então, Jorge, respondendo diretamente a sua pergunta, ele poderia tanto flutuar para sempre como cair. No caso de queda, ela seria, paradoxalmente, lenta e em altíssima velocidade, e o corpo dificilmente chegaria até o solo ou o mar para ser enterrado - o mais provável seria uma cremação atmosférica.

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Errata: este conteúdo foi atualizado
Diferentemente do que foi informado no texto, o que provoca o aquecimento do objeto em queda na Terra é a compressão do ar à frente do objeto, e não o atrito com o ar. O texto foi corrigido.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL