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ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

Igual "Avatar": planta que ilumina a casa está mais perto de ser realidade

Cena do filme "Avatar" (2009) - Reprodução
Cena do filme "Avatar" (2009) Imagem: Reprodução

Em uma noite escura, imagine você caminhando em um parque entre plantas, flores e árvores que brilham, também chamadas de bioluminescentes. Parece uma cena do filme "Avatar" que ficou famoso pelos belos cenários do fictício mundo de Pandora, com plantas e animais que emitem luz, mas essa cena pode se tornar realidade em um futuro (assim esperamos) não tão distante.

Cientistas do Massachusetts Institute of Technology (MIT), nos Estados Unidos, desenvolveram um método capaz de fazer com que plantas comuns, como o espinafre e a couve, brilhem no escuro através da injeção de certas nanopartículas.

Nanopartículas são partículas cujas dimensões (altura, largura e comprimento) se encontram na escala nanométrica, ou seja, 1 bilhão de vezes menor que o metro ou cerca de mil vezes menores que uma célula humana.

O método ainda precisa ser aprimorado para aplicações práticas, mas os resultados são animadores.

Esse estudo realizado pelo grupo do MIT faz parte de um grande projeto chamado "Nanobionics", cujo objetivo é incorporar nanopartículas a plantas para alterar suas funcionalidades, fazendo com que elas possam brilhar no escuro, por exemplo.

Outros estudos incluem injetar nanopartículas em plantas, tornando-as capaz de detectar arsênico (composto extremamente tóxico) e explosivos no solo e transmitir essa informação através de wi-fi, ou monitorar quando a planta necessita de água. Mas esse é um assunto para colunas futuras. Voltemos às plantas bioluminescentes.

Plantas bioluminescentes são uma alternativa "brilhante", com o perdão do trocadilho, para um problema bastante real. Iluminação elétrica, gerada por lâmpadas ligadas a rede elétrica, corresponde a 19% do consumo global de energia elétrica. E como grande parte da geração de energia elétrica vem de fontes não renováveis que liberam gases estufa na atmosfera, ao usarmos lâmpadas também estamos contribuindo para o aquecimento global. Por exemplo, a energia consumida para iluminação corresponde a 70% das emissões de gases estufa por veículos leves de passageiros do mundo.

Dado esse cenário, é preciso encontrar alternativas para geração de luz que não precisem de energia elétrica. Plantas bioluminescentes são uma excelente alternativa pois elas usam sua própria energia química —energia armazenada nas ligações químicas das moléculas formadas após fotossíntese— para gerar luz visível, não necessitando portando de energia elétrica. É geração de luz através de ''baterias'' que não precisam ser recarregadas!

Como plantas conseguem brilhar no escuro?

Nesse trabalho, a luz emitida pelas plantas é gerada através de uma reação química: uma molécula chamada luciferina reage com oxigênio e ATP, a "moeda de energia" da planta, na presença de uma enzima chamada luciferase (enzimas são estruturas biológicas capazes de acelerar certas reações químicas), gerando luz e outros subprodutos.

Essa dupla luciferase & luciferina (sugestão de nome para uma eventual dupla sertaneja) é a responsável pela luz emitida pelos vaga-lumes e por algas bioluminescentes encontradas em alguns lugares do mundo como em Porto Rico, que fazem com que a água do mar brilhe a noite.

Mas as plantas não produzem luciferina e luciferase naturalmente. Uma solução para isso é modificá-las geneticamente para que elas passem a produzir a enzima luciferase, como foi feito no primeiro trabalho sobe o assunto.

Mas a modificação genética de plantas não é um processo trivial e em geral é limitada a poucas espécies.

Uma alternativa é introduzir a luciferase e luciferina diretamente nas plantas usando nanopartículas. Essa foi a estratégia adotada pelos cientistas do MIT.

Nesse trabalho, nanopartículas foram usadas como meio de transporte para levar as moléculas de luciferase e luciferina para dentro das folhas, algo como um "nano taxi" que leva essas moléculas até destinos específicos na folha. Vamos ao processo.

Os cientistas sintetizaram um tipo de nanopartícula contendo luciferase e um outro tipo de nanopartícula contendo luciferina.

As plantas (rúcula, agrião, couve e espinafre) foram então imersas em uma solução contendo ambas nanopartículas e, em seguida, submetidas a uma pressão grande o suficiente para que as nanopartículas entrassem pelos poros das folhas (chamados estômatos).

Cada nanopartícula foi projetada para levar a luciferina ou a luciferase em seu interior para regiões específicas no interior da planta, através de alterações no diâmetro das nanopartículas e carga elétrica em sua superfície.

As nanopartículas transportando a luciferase eram menores, capazes de penetrar as células no interior da folha, nas regiões ricas em ATP (lembre-se que a reação precisa de ATP para ocorrer).

Já as nanopartículas transportando a luciferina eram maiores, não conseguindo penetrar nas células e permanecendo no espaço entre elas.

Essas nanopartículas liberam gradualmente a luciferina, que então se difunde para o interior das células onde estão a luciferase e o ATP. Uma vez que a luciferina e luciferase se encontram no interior das células, a reação química ocorre e luz é gerada.

É particularmente importante que as moléculas de luciferina sejam liberadas pelas nanopartículas lentamente, caso contrário, a reação ocorreria "de uma vez só" e não teríamos um brilho duradouro.

Tal estratégia de se usar nanopartículas liberando substâncias controladamente, vem sendo bastante utilizada na fabricação de medicamentos que precisam ser liberados lentamente no organismo.

A luz emitida pelas plantas nesse estudo ainda é pouco intensa para aplicações práticas e desde esse primeiro estudo, os cientistas do MIT continuam pesquisando formas de otimizar o processo.

Uma maneira é através da injeção de outras nanopartículas que funcionam como os capacitores usados em eletrônica, armazenando a energia gerada por picos de bioluminescência e liberando essa energia lentamente, também em forma de luz, o que estende a emissão de luz pela planta de horas para dias e semanas.

Um outro foco do grupo é injetar essas nanopartículas em plantas maiores, como árvores.

De acordo com o professor Michael Strano, líder do grupo do MIT:

"O projeto das Plantas Emissoras de Luz está avançando rapidamente. Estamos descobrindo novas ferramentas de nanotecnologia que nos permitem armazenar e gerar quantidades cada vez maiores de luz da planta. Escalonamos algumas etapas do processo para plantas excepcionalmente grandes e aumentamos consideravelmente a emissão de luz.''

Plantas bioluminescentes iluminando o interior de ambientes seriam uma alternativa para tornar prédios e casas mais sustentáveis.

Essa ideia foi demonstrada inclusive, em uma exposição com plantas bioluminescentes que durou 33 semanas em Nova York, o que mostra que a ciência está nos aproximando, aos poucos, da realidade fantástica de Avatar.