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Letícia Piccolotto

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Crise exige que líderes respondam a ela de forma rápida e com apelo social

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Imagem: Freepik

24/04/2021 04h00

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Esta semana foi realizado o Leaders Summit on Climate. O evento, que foi organizado pelo presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, teve como principal objetivo alinhar as visões de mais de 40 líderes globais e reforçar a urgência de priorizarmos as ações para reduzir a degradação ambiental em escala global, debatendo temas como energia renovável e sustentável, mudanças climáticas, entre outros temas.

A participação do Brasil foi bastante polêmica, seguindo recentes acontecimentos da agenda de meio ambiente em nosso país, mas o que fica evidente é que não dá mais para esperar e precisamos encontrar e articular soluções para os desafios do planeta na próxima década —você pode acompanhar a transmissão do evento aqui.

Eu tive a oportunidade de reforçar a urgência deste tema ao participar como palestrante de uma das maiores conferências relacionadas à política, economia, educação, cultura e sociedade, a Brazil Conference at Harvard & MIT 2021.

Tive a honra de dividir a mesa virtual com duas mulheres que são grandes referências: Ana Fontes, fundadora e presidente do Instituto Rede Mulher Empreendedora, e Luiza Helena Trajano, presidente do conselho da Magazine Luiza.

Para mim, a conversa foi um verdadeiro respiro. Depois de semanas difíceis, com a piora da pandemia de covid-19 no Brasil, ter a oportunidade de discutir sobre ações transformadoras foi um verdadeiro bálsamo. Você pode acompanhar a transmissão aqui

Falamos sobre o tema de empreendedorismo social, algo que definiu a minha trajetória profissional, pessoal e que é assunto frequente aqui na coluna e nas minhas redes.

Discutimos como a crise atual é efeito de uma emergência ambiental, e como teremos que trabalhar conjuntamente para enfrentar desafios que ameaçam a nossa própria existência no planeta. O empreendedorismo social, certamente, é uma dessas estratégias de atuação coletiva.

O meu primeiro grande projeto profissional foi desenvolvido no universo do empreendedorismo. Isso foi há 20 anos, antes mesmo do próprio termo ser conhecido e fazer parte do dicionário da língua portuguesa —o que só aconteceu em 2004.

Eu tinha 18 anos e ajudei a construir a Endeavor no Brasil, uma organização que desde então vem apoiando empreendedores a desenvolver seus negócios.

Logo depois, liderei a Fundação Brava e todas as iniciativas construídas junto a diversos governos, até chegar à concretização de um sonho, o BrazilLAB, primeiro e único hub de aceleração Govtech do país.

O Brasil é um país empreendedor. Nossa população é altamente criativa e resiliente, características fundamentais para aqueles e aquelas que desejam se aventurar no universo do empreendedorismo.

E há tempos também percebemos que esse modelo pode transformar realidades, servindo a propósitos que não somente o retorno econômico. É o que chamamos de empreendedorismo social.

Experiências que florescem

O empreendedorismo social abrange uma gama de iniciativas, nas mais diferentes áreas, com diferentes objetivos e resultados. Em comum, essas experiências partilham o desejo de enfrentar problemas que afetam milhares —por vezes, milhões— de pessoas.

Isso sem abrir mão do aspecto financeiro: ou seja, quando não garantem um retorno para seus fundadores, sempre buscam a sustentabilidade da operação.

Não é surpresa que experiências de empreendedorismo social floresçam no Brasil. Somos um país de desigualdades abissais, com desafios do século 19 e a necessidade de nos conectarmos com as demandas do século 21. Com a pandemia, esses problemas ficaram ainda mais evidentes, graves e urgentes, demandando inovação e tecnologia para serem enfrentados.

Com o empreendedorismo social, há a chance de transformar realidades, trazendo impactos positivos para um grande número de indivíduos.

Reações rápidas diante da crise

O empreendedorismo social também tem sido desenvolvido por organizações tradicionais.

O Magazine Luiza, por exemplo, doou mais de R$ 40 milhões para projetos de combate à disseminação da covid-19 no país. O valor foi destinado à compra de cestas básicas e de equipamentos para hospitais em todo o Brasil e ao auxílio a centros de longa permanência para idosos. Além disso, projetos de apoio ao ensino à distância e de combate à violência contra a mulher também foram contemplados.

Já a Rede Mulher Empreendedora, que apoia o empreendedorismo feminino no Brasil, teve no ano passado, apesar das dificuldades da pandemia, a maior captação de recursos da história. Foram levantados R$ 45 milhões para projetos sociais dentro da organização.

As grandes empresas olharam para esse universo, principalmente para os pequenos negócios, e se prontificaram a ajudar de alguma forma. Foram realizadas ações para garantia de renda de mulheres e formação profissional.

No BrazilLAB, também buscamos trazer a nossa contribuição. No ano passado, lançamos o Programa Força-Tarefa Covid-19 e, em uma versão 100% online, aceleramos 60 startups, pequenas e médias empresas que apresentavam soluções para combater os desafios nas áreas de educação, inclusão produtiva e digitalização dos governos.

E não para por aí. Temos assistido a união de empreendedores, que doaram recursos para diferentes iniciativas sociais, como as que buscam apoiar pessoas em situação de vulnerabilidade.

A Gerando Falcões, liderada por Edu Lyra, é um desses exemplos e com o "Corona no Paredão, Fome Não" já conseguiu arrecadar mais de R$ 16 milhões para a compra de cestas básicas, que devem impactar mais de 53 mil famílias. Iniciativas como o Movimento União Rio e União São Paulo buscam fazer o mesmo.

Nesse movimento, estamos assistindo a profissionalização dos empreendimentos sociais, que se estruturam, se organizam e criam uma metodologia que garante impacto e sustentabilidade.

Não se trata somente de caridade, mas de ações estruturadas que possam gerar transformação social.

De forma complementar, empresas privadas começam a compreender a importância de investir em ações sociais, muitas delas gerando um duplo impacto: financeiro e social.

Também adotam um olhar mais empático frente às pessoas, comunidades e ao meio ambiente, entendendo que o desenvolvimento sistêmico é muito mais importante que o crescimento econômico tradicional.

Termos antes desconhecidos, como venture philanthropy, investimento social privado e filantropia estratégica passam a ser conhecidos e trabalhados. Vivemos um momento de amadurecimento do empreendedorismo social e o melhor, todos temos a ganhar com isso.

O que o futuro nos reserva?

O empreendedorismo social será a grande força motriz da próxima década.

Precisaremos de ferramentas que nos ajudem a combater os efeitos perversos da crise atual e daquelas que ainda podem surgir. Estaremos, portanto, diante do potencial de encontro de dois mundos: o do setor privado e o setor social.

Mas ainda precisamos avançar para que isso se torne, de fato, uma realidade, e que o trabalho conjunto, colaborativo e sistêmico entre setor público e privado no enfrentamento das desigualdades sociais possa crescer em escala.

A educação será um pilar fundamental para isso, além de um planejamento nacional que nos dê a perspectiva de nossas prioridades e os caminhos possíveis para as mudanças fundamentais.

Os desafios daqui para frente podem ser maiores do que os que enfrentamos em 2020 quando a pandemia chegou.

Há assuntos latentes que precisam ser resolvidos e que não podem mais esperar. Com isso, precisaremos de resiliência, união e empatia para os avanços que precisamos e merecemos.