Startup projeta R$ 500 por mês para quem topar 'alugar' dados para empresas

Ler resumo da notícia
(Esta é a newsletter Tilt. Inscreva-se gratuitamente para receber no seu email toda sexta. Conheça as demais newsletters do UOL. São dezenas de opções sobre os mais variados assuntos para a sua escolha)
Que os seus dados pessoais valem um dinheirão ao serem processados por empresas, você já sabe. Outra coisa evidente é que essa grana passa longe do seu bolso. Uma companhia brasileira de tecnologia quer mudar esse jogo.
A DrumWave, fundada por André Vellozo, um brasileiro que mora há anos no Vale do Silício, criou um sistema onde as pessoas guardam os dados pessoais delas coletados por diversas empresas. A partir daí, permite aos donos das informações serem remunerados caso topem negociá-los com outras companhias. Funciona como um aluguel dos dados, que renderia até R$ 500 por mês, projeta a startup.
Na terça (14), a DrumWave lançou uma campanha para incentivar brasileiros a bater na porta de 40 empresas para pedir de volta os dados que pertencem a eles. A empresa, porém, vem preparando o terreno há anos, tempo em que conquistou parceiros importantes, como a Dataprev, estatal que lida com os dados sociais de milhões de brasileiros, e o apoio de figuras relevantes do mercado financeiro, como o ex-presidente do Banco Central e atual diretor do Nubank Roberto Campos Neto.
Em conversa com a coluna, os executivos da DrumWave contaram já haver companhias interessadas em pagar para acessar os dados dos brasileiros, afirmaram que o negócio não só se apoia, mas é viabilizado pela LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados) e dizem estar criando um novo modelo de gerar —e distribuir— dinheiro com informações pessoais.
Patrick Hruby, Diretor de operações da DrumWave

Acostumado a atuar com empresas que coletam e processam grandes massas de dados dos usuários, Hruby tem passagens por Google, Facebook e Movile (antiga dona do iFood), onde atuou como CEO. Agora, ele vai para o outro lado do balcão, já que o propósito da DrumWave é convencer as pessoas a exigir os dados delas de volta, hoje em posse de muitas das companhias em que ele trabalhou. E, na prática, funciona assim:
- A startup criou uma plataforma de gerenciamento de contratos de licenciamento de dados. De um lado, as pessoas armazenam em suas carteiras digitais (Dwallet) os certificados obtidos junto às empresas que guardam as informações delas. Do outro lado, essas companhias também abrem suas próprias carteiras, onde estocam os contratos de todo mundo com quem firmou um acordo. Isso ocorrerá, porque...
- ... Os dados têm propriedade compartilhada entre a pessoa (titular) e a empresa (controladora), porque a DrumWave entende que a informação só foi gerada devido à interação entre o humano e produto ou serviço da companhia.
Essa carteira de dados é a forma que eu vou assinar um contrato com o Itaú, Droga Raia e dizer que os dados que a gente gera junto nessa relação não são meus, não são delas, são nossos
Patrick Hruby
- Para a DrumWave, essa primeira fase da operação consiste em convencer as pessoas a acionar alguma das quarenta empresas presentes numa lista em seu site. Elas foram escolhidas por lidarem com grandes massas de dados e terem capilaridade entre os brasileiros. Elas são de áreas tão diversas quanto...
- ... Setor bancário (Bradesco, Nubank, BB, BTG, Itaú), de tecnologia (Amazon, Apple, TikTok, X, Waze, Samsung), de farmácias (Drogaria São Paulo, Droga Raia, Drogasil, Drogarias Pacheco), de alimentação (iFood, Burger King), de streaming (HBO Max, Disney+, Netflix, PrimeVideo, Spotify), de viagem aérea (Delta), de finanças (Mastercard, Serasa Experian, Visa), de varejo (Magazine Luiza, Carrefour, Pão de Açúcar), de transporte (Uber, 99, Rappi), de saúde (Amil, Dasa, SulAmérica) e de telecomunicações (Claro, TIM, Vivo). Para isso...
- ... Basta disparar um pedido por meio da plataforma da DrumWave. Os certificados armazenados ali funcionarão como uma poupança, uma espécie de reserva de informação à espera de interessados, diz Hruby. A partir daí...
- ... Começa a segunda fase, aquela em que licenciamentos de fato irão ocorrer. Nessa etapa, as pessoas são convidadas a definir regras de uso para os dados presentes em sua carteira (libera para quais finalidades? para quais setores? etc). Só que...
- ... Nesse estágio, surge o "agente de dados", que vai intermediar o contato entre os titulares e companhias interessadas e vai propor quais são as regras de negócio. Se o usuário não topar, nada feito. A primeira a exercer esse papel é a própria DrumWave. Em contrapartida...
- ... A exploração da informação será recompensada. Como isso irá acontecer, ainda está em aberto, mas deverá envolver pagamento em dinheiro ou a concessão de benefícios sob a forma de descontos em serviços ou produtos e a gratuidade em eventos. Mas quanto?
Nesse momento, a gente estima renda por volta de R$ 500 por mês por pessoa. Sempre lembrando que esse número é uma estimativa, com base em algo que não existe ainda. o que a gente quer --e com certeza ao longo de 2026 a gente vai ter condição de fazer-- é um estudo empírico, uma coisa mais sólida, falando assim: "Olha, a gente entende que aquele valor de R$ 500, estipulado no começo, está subestimado, porque a gente não considerou os efeitos de rede, não considerou séries históricas"
Rafael Andrezo, diretor de economia da DrumWave
- O lucro da startup sairá de taxas cobradas por essas transações. E...
- ... Nas próximas semanas, a startup abre a possibilidade de as pessoas acionarem novas empresas em busca de certificado de dados.
Patrick Hruby, Diretor de operações da DrumWave

Para os executivos da DrumWave, a LGPD já fornece o arcabouço jurídico necessário à empreitada. Em seu artigo 18, a lei diz, por exemplo, que:
O titular dos dados pessoais tem direito a obter do controlador, em relação aos dados do titular por ele tratados, a qualquer momento e mediante requisição (...) acesso aos dados
No entanto, eles não ignoram que pode haver alguma contestação por parte de autoridades ou mesmo das empresas. A ANPD (Agência Nacional de Proteção de Dados) chegou a abrir um inquérito a respeito de um protocolo assinado pela startup e o Serpro, mas o arquivou posteriormente. Na prática, a DrumWave quer abrir a possibilidade de os dados pessoais serem usados para finalidades diferentes daquelas para as quais foram coletados.
Um teste de indústria farmacêutica remunera em média até R$ 4 mil por indivíduo, que não ganha nada com isso. As empresas estão ganhando, e a gente vai devolver isso. Testes de oncologia e doenças graves pagam até 10 vezes isso. Ao criar a carteira jurídica, a empresa vai ser custodiante dos dados e vai receber um pedaço de uma série de transações. Imagine quanto não vale para o McDonald's saber: quais lojas vendem mais quando há jogo do Corinthians? Quais vendem mais Big Mac quando o Palmeiras perde? Onde vende mais Quarteirão com bacon nos fins de semana? Em quais dos 12 McDonald's de Sorocaba (SP) há mais influência dos passeios de moto, quando eu cruzo com os dados do Sem Parar? Quanto vale para a Friboi, cujo maior cliente no Brasil é o McDonald's, saber onde ela vende mais fraldinha ou mais patinho dependendo da época do mês?
Tonico Pereira, gerente geral da DrumWave no Brasil
Até o fim do ano, a DrumWave ganhará um aliado de peso: a Dataprev. Segundo declaração de abril do presidente da estatal, Rodrigo Assumpção, a entrada da empresa pública ocorrerá de duas formas: ao disponibilizar sua base de empréstimos consignados —eram 60 milhões no começo do ano—, ela permitirá que as pessoas emitam certificados referentes a esses contratos e os guardem em suas carteiras digitais. Por outro lado, a empresa pública também atuará como "agente de dados", ou seja, intermediando a negociação dos dados do consignado com outras empresas.

Detalhe importante: os dados das pessoas a serem certificados permanecerão armazenados nos data centers das empresas controladoras. O que vai ocorrer é uma conexão via API (interface de programção) entre essas centrais e os sistemas da DrumWave.
Outro aspecto importante: os dados negociados a partir da plataforma da DrumWave serão anonimizados, de modo a inviabilizar que, por meio de uma engenharia reverse, seja possível usar aspectos das informações para reconstituir a identidade da pessoa. Só que, por isso mesmo, o negócio da startup só vingará se houver grande adesão. Algumas bases só adquirem valor substancial se forem formadas por dados reais, constantemente atualizados e com grande volume.






























Deixe seu comentário
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Leia as Regras de Uso do UOL.