Diogo Cortiz

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Opinião

Doubao desbanca DeepSeek e pode fazer a China dominar a IA pelo TikTok

DeepSeek era o cartão de visita mais famoso da China na área de inteligência artificial. Eu disse que era, porque a coisa mudou por lá. Se no começo do ano o modelo de IA chocou o mercado internacional e fez as big techs americanas perderem mais de US$ 1 trilhão em valor de mercado, agora tem uma outra IA reinando por lá - e isso pode ter consequências para o resto do mundo.

O nome dela é Doubao. Desenvolvida pela ByteDance, empresa dona do TikTok, essa IA desbancou DeepSeek e se tornou a mais popular no país asiático com mais de 157 milhões de usuários ativos por mês, de acordo com a QuestMobile. DeepSeek caiu para o segundo lugar, com 143 milhões de usuários ativos por mês.

O desempenho é tão surpreendente que a empresa de capital de risco A16z listou Doubao como o quarto aplicativo de IA mais usado por mês globalmente, atrás de ChatGPT e Gemini.

Bytedance e SuperApp são trunfos Doubao

O fato de Doubao ter sido desenvolvido pela ByteDance é um ponto relevante. A empresa tem a vantagem de conhecer bem o mercado de aplicativos e produtos digitais, diferente da DeepSeek que, embora seja especialista em pesquisa e treinamento de IA, ainda carece de expertise no mercado digital.

E, como temos discutido bastante nessa coluna, a IA vive um momento de comoditização, em que os principais modelos apresentam capacidades similares. Neste caso, a diferenciação deixará de estar no desempenho do modelo e passará a depender do propósito de uso. Sai na frente quem conseguir oferecer a melhor experiência e promover a adoção mais rápida do produto.

E isso faz total diferença: muda a competição da capacidade do modelo para a experiência de uso e distribuição da plataforma.

Doubao já nasceu com uma proposta diferente dos demais chatbots. Com um design mais humanizado, o objetivo é tornar a experiência aconchegante e pessoal. O detalhe começa pelo logo do aplicativo que usa a ilustração de uma personagem feminina que sempre cumprimenta os usuários no primeiro acesso.

Essa escolha de um design que antropomorfiza a experiência pode ser efetiva para gerar engajamento, mas não posso deixar de alertar que também levanta uma série de questões éticas e afetivas sobre como nos relacionamos com a IA.

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Outro diferencial de Doubao é funcionar como uma "Super IA". Quando apareceram os aplicativos de smartphones, a China foi pioneira em popularizar o conceito de super apps, estratégia de reunir diferentes serviços, de mensagens a compras, em um único aplicativo.

Agora, a mesma ideia está funcionando com a IA. Os usuários do Doubao podem conversar por texto ou voz, criar imagens e vídeos, além de interagir com agentes, tudo em um único ambiente. A principal estratégia, porém, é a integração com o ecossistema da ByteDance.

De uma forma parecida com o que acontece com o Grok no X, os usuários do Douyin (versão chinesa do TikTok) podem marcar o Doubao nos comentários de um vídeo para receber um resumo do conteúdo em texto. Quem está no Doubao pode receber vídeos do Douyin como contexto de uma resposta em uma pergunta feita na IA, sem precisar trocar de aplicativos. O resultado é que na China o ambiente digital está sendo dominado por essas interações.

Nesse cenário, a China pode acelerar a expansão global de sua IA: basta integrá-la ao TikTok para alcançar milhões de usuários de diferentes países.

Embora a ByteDance ainda não tenha feito nenhum anúncio, o movimento faria todo sentido. Seria uma jogada parecida com a da Meta, que resolveu colocar sua IA em praticamente todos os aplicativos. O desafio, no entanto, continua ser criar uma experiência realmente útil, que gere valor e condicione comportamentos.

Se der certo, seria a ascensão da IA da China não apenas como uma infraestrutura tecnológica, mas também cultural.

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Doubao ainda não está no Brasil

Ficou curioso para testar o Doubao? Sinto informar que está disponível apenas em chinês. Mas, assim como aconteceu com o TikTok, a ByteDance lançou uma versão internacional: Cici, que já está disponível no Brasil. Essa versão combina a tecnologia da ByteDance com modelos de terceiros, o que pode explicar possíveis diferenças de recursos com a versão chinesa.

Vale acompanhar de perto como essa história vai desenrolar, porque mais do que uma curiosidade, é um movimento que pode redefinir o papel da China na era da IA.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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