IA vai nos deixar mais burros? O que estudo do MIT realmente significa
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A preguiça é uma das maiores ameaças para a humanidade em tempos de inteligência artificial. Estamos diante de máquinas que dominam a linguagem e executam tarefas cognitivas complexas por nós: criam conteúdos, resumem livros, respondem e-mails e muito mais.
Mas se não estamos nos esforçando mentalmente para fazer algo, como fica o nosso cérebro?
Uma nova pesquisa publicada em formato preprint por pesquisadores do MIT Media Lab, um dos mais respeitados laboratórios do mundo, trouxe algumas pistas. Eles usaram a técnica de EEG (eletroencefalografia) para medir a atividade do cérebro de pessoas enquanto elas realizavam tarefas de escrita usando o ChatGPT, o Google ou nenhuma ferramenta de apoio.
Os resultados revelam evidências de que a conectividade neural tem padrões diferentes de acordo com as tecnologias usadas na escrita de um ensaio. Enquanto o grupo que não usou nenhuma ferramenta de apoio apresentou conectividade neural mais forte, indicando maior processamento semântico interno e ideação criativa, o grupo que utilizou o ChatGPT teve a menor conectividade. Já quem usou o Google, por sua vez, ficou no meio termo.
De acordo com os autores, os dados sugerem que uma conectividade mais robusta dá suporte para a consolidação da memória episódica e a codificação semântica profunda, processos importantes que ocorrem quando os indivíduos geram e estruturam o conteúdo internamente.
O estudo também mostrou outras consequências para além dos dados sobre atividade neurais. As pessoas que usaram o ChatGPT tiveram dificuldade para lembrar ou citar trechos do que haviam escrito minutos antes. E o mesmo grupo relatou uma redução no senso de propriedade sobre o conteúdo, como se se sentisse menos autor do texto produzido.
A criatividade foi outra característica impactada. Os textos criados por quem usou o ChatGPT eram mais uniformes, com frases repetidas e poucas variações linguísticas. Já o grupo que não usou nenhuma ferramenta produziu as respostas mais variadas e originais, até porque cada um dependeu exclusivamente do seu próprio repertório.
Esses resultados não surpreendem como uma grande novidade, mas são importantes por servirem como evidências para uma hipótese que formulamos há bastante tempo: se as pessoas recorrem à IA como um atalho intelectual, o que acaba acontecendo é a diminuição, e não o fortalecimento, do engajamento cognitivo.
O estudo vem circulando na mídia internacional e nas redes sociais, muitas vezes trazendo a mensagem catastrófica de que a IA vai nos deixar mais burro. Primeiro, o estudo tem limitações metodológicas. Segundo, o artigo não crava isso de forma explícita. É algo que pode acontecer, mas como vimos, depende do tipo de uso e do grau de interação das pessoas com a IA.
E há um achado particularmente relevante que pode nos ajudar a entender melhor o impacto na educação dos diferentes tipos de interação com a IA. Após 3 sessões de testes, os pesquisadores inverteram as condições experimentais dos grupos. Quem não usou nenhuma ferramenta, passou a usar o ChatGPT; e quem usou a IA, deveria escrever o texto sem apoio.
Os pesquisadores descobriram que aquelas pessoas que inicialmente escreveram sem apoio do ChaGPT demonstraram maior conectividade neural quando passaram a usar a IA. Os dados indicam que reescrever uma redação usando um chatbot, após a escrita prévia sem IA, envolve interações mais extensas na rede cerebral. Em contraste, o grupo que usou o ChatGPT desde o início demonstrou menos esforço neural e viés no vocabulário da IA.
A partir desses achados podemos refletir sobre percursos pedagógicos e políticas educacionais. Como educador, defendo que não dá para ignorar a chegada da IA, mas sempre alerto que não devemos comprar o discurso imediatista de jogar tudo fora para fazer uma educação centrada na IA.
A integração da IA na educação não é simples e apresenta contradições. Ao mesmo tempo em que a tecnologia aumenta a acessibilidade e personalização, pode contribuir para uma atrofia cognitiva como consequência de uma dependência excessiva dos chatbots.
Os resultados deste estudo dão pistas que há momentos certos para inserir a IA no processo de aprendizagem. É urgente aprendermos como integrá-la no processo educacional para que seja usada como apoio, e não como substituta do engajamento cognitivo. Como mencionei no início do texto, um dos maiores riscos é a preguiça. Por isso, é fundamental educar as pessoas para que aprendam a pensar com a IA, e não simplesmente deixar que a IA pense por elas.
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