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OPINIÃO

Valorant vai bater CS:GO? Motivos para acreditar que sim (e que não)

Valorant é o primeiro jogo de tiro da Riot Games: tem influências de Overwatch, mas deve mesmo brigar com Counter-Strike - Divulgação/Riot Games
Valorant é o primeiro jogo de tiro da Riot Games: tem influências de Overwatch, mas deve mesmo brigar com Counter-Strike Imagem: Divulgação/Riot Games

Bruno Araujo

Colaboração para o START

02/06/2020 04h00

Valorant será lançado oficialmente nesta terça (2), menos de 1 mês após entrar em fase beta no Brasil. E aí, enfim, o público em massa poderá aderir ao bolão mais quente do momento nos eSports: será que o shooter da Riot Games conseguirá derrubar Counter-Strike: Global Offensive, o decano dos esportes eletrônicos?

O START se enfurnou no antigo Project A durante o beta e levantou motivos para acreditar que o "Valorão" será o novo rei do pedaço. Mas também conversou com um especialista em CS:GO e trouxe razões para confiar que o embate entre CT e TR ainda vai reinar por muito tempo.

Valorant: caçador de cheaters

Quem é veterano de shooters sabe: modo online nos joguinhos de tiro são para-raio de malandro. E como ver alguém roubando pra acertar um headshot ou descobrir onde você está no mapa é um saco, uma das promessas de campanha da Riot é combater os trapaceiros desde o dia 1 de Valorant.

A iniciativa toma forma majoritariamente por meio do Vanguard, um software anti-cheat cuja instalação é obrigatória para rodar o jogo. O Vanguard já baniu milhares de contas durante o beta de Valorant, mas a Riot diz que durante o período se preocupou mais em monitorar os principais cheats usados e como reagir a eles.

Valorant A - Divulgação/Riot Games  - Divulgação/Riot Games
Imagem: Divulgação/Riot Games

Na versão final de Valorant, no entanto, o software será capaz de encerrar automaticamente toda partida em que um trapaceiro for detectado, além de banir não apenas a conta do meliante, mas a configuração do computador usado pelo cheater: um método agressivo de evitar que o jogador banido simplesmente crie um novo usuário e volte a roubar.

A Riot defende o Vanguard como uma solução de alto nível contra aimbots e wallhacks, problemas que sempre pareceram impossíveis de resolver em jogos como Crossfire, Point Blank e CS, por toda a experiência empregada no programa.

De acordo com a desenvolvedora, o Vanguard é a evolução de tudo que já foi implementado e melhorado em League of Legends, um dos games mais jogados do mundo. E por ser uma tecnologia proprietária da Riot, a empresa afirma conseguir manter uma equipe focada no programa e capaz de implementar mudanças com agilidade.

A reação aos esforços até agora, no entanto, foi de altos e baixos. Jogadores de Valorant relataram bugs bizarros relacionados ao Vanguard, incluindo dificuldades e falhas em instalar o jogo por causa do anti-cheat, problema que também presenciamos e só foi solucionado com uma atualização do Windows 10. Outros problemas envolvem conflitos com outros programas, drivers e acessórios conectados ao PC (como mouse e teclado), além de quedas de frame rate.

Botando fé ou não nessa nova cruzada contra cheaters, a Riot tem sido transparente em relação ao Vanguard. A dev diz que o software está em constante evolução a partir do feedback de Valorant. E cumprir com a fiscalização e o trabalho incessante nessa briga é até mais importante que prometer seu fim.

Valorant: suporte show, Rogerinho

Mundial LoL - Divulgação - Divulgação
Experiência da Riot com LoL conta pontos para Valorant: não só no aspecto eSports, mas também no suporte à comunidade
Imagem: Divulgação

Sempre que surge um concorrente novo e badalado, o que os fãs e envolvidos no corre do CS:GO mais falam é: se nem a Valve conseguiu matar o jogo, o quê ou quem vai conseguir? Mas se tem alguém que gosta de oferecer um suporte bonito, um suporte bem feito, um suporte formoso aos seus produtos e passar por cima dos medalhões (alô, Dota 2) é a Riot Games.

Tudo bem, o plural no Games da Riot pintou faz nem 1 ano, mas ainda é do seu primogênito vários dos títulos distribuídos pelo The Game Awards em 2019, a premiação mais renomada dessa indústria vital: melhor jogo de esports (League of Legends), melhor time de esports (equipe de LoL da G2) e melhor evento de esports (Worlds 2019).

E o Lolzinho não é mais uma promessa ou um novato na parada. O jogo fez 10 anos ainda no topo, e o sucesso é resultado dos esforços em alimentar sua comunidade de jogadores. Por que o mesmo não aconteceria com Valorant?

Da realização in-game de eventos especiais, com modos de jogo e skins exclusivas, à inclusão periódica de novos personagens. Da organização de ligas regionais, com direito a peneiras em realities shows e divisões de acesso, a uma reunião dos vencedores no final do ano em uma grande copa do mundo que lota estádios de futebol no Brasil e na Coreia do Sul.

Valorant nasce com uma baita jurisprudência entre as histórias recentes de sucesso nos jogos free-to-play, tanto em aspectos casuais quanto competitivos. Se a Riot conseguir converter tudo que já foi feito a favor do caçula da família, numa realidade onde seu principal concorrente conta com pouco apoio da matriz e depende de terceiros para os principais torneios e transmissões pela internet, o tiro pode ser certeiro.

Essa fagulha de esperança, inclusive, já despertou movimentações no cenário. Já existem pro-players que migraram para Valorant e organizações que anunciaram equipes para o novo shooter.

Valorant: RG do talento

Evidentemente, de nada adianta ser um FPS livre de cheaters e com modo de jogo novo a cada semestre se não fornecer o elemento mais essencial de todos: ser gostoso de dar tiro. Mas pelo beta, o futuro de Valorant é próspero.

Sim, o jogo atinge pontos de intersecção harmoniosos entre habilidade mecânica, familiaridade e novos temperos, como as skills de cada agente. O veterano de Counter-Strike vai se sentir em casa, uma vez que o game da Riot assimila muita coisa do arquétipo de gameplay e da própria cultura do CS. É a arma que se comporta igual (a M4A4 é a Phantom e a Vandal é a AK-47), as gírias que funcionam ("eco" pro round econômico, "cavalar" pra falar do coleguinha que não para de correr) e também o glossário de posições nos mapas, como "céu", "banana" e "banheiro".

Mas a inclusão em Valorant de agentes/operadores/heróis, que mecanicamente têm um papel diferente de Overwatch e Rainbow Six Siege, vai muito além de botar poderzinho no meio do tiroteio.

Valorant B - Divulgação/Riot Games  - Divulgação/Riot Games
Imagem: Divulgação/Riot Games

Em tempos em que mais do que nunca tudo gira em torno de representatividade e expressão individual, Valorant consegue criar o elo emocional entre jogador, torcida e avatar que os soldados e terroristas encapuzados de CS, por exemplo, não têm.

Tá, cada agente tem habilidades únicas, um é mais defensor e outro mais atacante. Mas como a própria Riot já frisava desde o princípio, a grande maioria dos abates e rounds são decididos na bala, e não com uma ou mais habilidades especiais.

Uma ult mais agressiva, como a de Sova ou Brimstone, pode salvar em clutches ou situações de bomb site. Mas o que costuma resolver ainda é o conhecimento do mapa, o bom posicionamento para permitir o headshot claro, entre outros comportamentos táticos.

Ou seja, os agentes estão ali para criar identificação, seja pela personalidade, poderes ou origem. Basta ver o tweet do jornalista Luiz Queiroga, que gerou uma onda de ódio nas redes por dizer que ele, um homem preto, só jogaria com Phoenix e Raze, agentes pretos, por uma questão de representatividade.

E os exemplos da força de se enxergar num jogo se estendem por todos os lados. No meu caso, sempre me considerei um jogador fraco de FPS, sem domínio do beabá da boa mira. Tanto que Overwatch, um shooter em que nem todos os bonecos exigem precisão, foi um paraíso para mim.

Em Valorant, comecei como Brimstone, passei pela Jett, e não parecia encontrar meu lugar. Até destravar Omen, um agente com habilidades para confundir o adversário e se teleportar pelo mapa. Esse respiro do confronto direto era o que eu precisava para controlar minha insegurança, me acostumar com o ritmo do jogo e entender meu papel nas partidas.

Hoje, todos meus perfis nas redes sociais já ostentam o título de melhor Omen da Freguesia do Ó.

A emoção move Valorant e essa é uma de suas maiores cartadas. Basta assistir ao trailer localizado para o Brasil, com destaque para Raze, a agente brasileira, e trilha de BaianaSystem e Tropkillaz. É difícil não ficar envolvido.

CS:GO: 20 anos contrariando as estatísticas

SK - Helena Kristiansson/ESL - Helena Kristiansson/ESL
Conquistas dos brasileiros com a SK Gaming estão eternizadas na memória do torcedor
Imagem: Helena Kristiansson/ESL

Mas se por um lado Valorant conta com toda a experiência acumulada pela criadora de um dos jogos mais populares da última década, por outro ela encara um dos maiores macacos velhos dos games.

Desde que pintou em 1999 como um mod de Half-Life, Counter-Strike passou por tudo: foi fenômeno cultural, bombou o mercado das lan houses, proliferou gerações de pro players e grandes ídolos dos esports, gerou polêmica e teve suas vendas suspensas, caiu no limbo, ressurgiu das cinzas com CS:GO e foi palco de grandes torneios e premiações. E tá aí firmão até hoje.

O que falar da sequência de 87 vitórias da Ninjas in Pyjamas entre 2020 e 2013? E do bicampeonato brasileiro em 2016 com Luminosity e SK? Ou da era Astralis dos últimos anos? De Coldzera, Olofmeister, Fallen, KennyS, dev1ce, entre tantos gigantes do cenário competitivo?

É muita história — e muito conteúdo também. São sete mapas só na rotação atual do competitivo, contra três de Valorant, dezenas de skins de operadores e armas (e um mercado secundário bem estabelecido e muito lucrativo) e vários modos de jogo, incluindo uma tentativa de surfar na onda dos battle royale.

A marca Counter-Strike percorreu um longo caminho ao longo de 20 anos. E isso o ajuda a ser bastante estável e popular.

Marcelo Ferrantini - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
O comentarista de CS:GO Marcelo Ferrantini vê algumas vantagens de Valorant, mas lembra que é difícil encontrar um equilíbrio
Imagem: Arquivo pessoal

"O jogo vem sendo estudado por profissionais e analistas desde o começo do século, com mudanças nos regulamentos das competições e no equilíbrio geral das funcionalidades do CS", diz Marcelo Ferrantini, coordenador da Brasil Game Cup 2018 e comentarista da Blast Pro Series Global Final 2019, um dos torneios mais conhecidos de CS:GO.

"Valorant pode se aproveitar disso para estabelecer seu próprio metagame. No entanto, levando em consideração principalmente que o jogo da Riot tem vários heróis com poderes e utilidades distintas, pode ser que leve anos até que a sintonia perfeita seja encontrada", conta.

Para Ferrantini, fica a dúvida se o público terá paciência até que Valorant atinja o mesmo nível de equilíbrio de CS:GO. "E será que a Riot vai aprender com outros jogos que são assim, como Rainbow Six Siege, e têm na banalização de certos operadores um dos seus grandes problemas?"

CS:GO: jogando o fino do fino

Poder controlar agentes de diferentes perfis e skills é inquestionavelmente mais representativo e atraente para diversos públicos. Mas isso também pode tornar Valorant menos dependente das habilidades motoras dos jogadores — e, por consequência, menos competitivo.

"Enquanto apenas a Sage (a curandeira de Valorant) pode erguer barreiras, todos os membros de um time de CS:GO têm acesso aos mesmos armamentos e acessórios. Com isso, o metagame não se baseia na escolha de personagens", opina Marcelo Ferrantini.

"Você vai precisar de um planejamento de jogo em Valorant, de uma reflexão sobre a composição do seu time. Mas a execução round a round não é tão estratégica e tem menos espaço para improvisos", ele diz.

As habilidades especiais de cada agente de Valorant, ponto de contato com jogos como Overwatch, deixam os campos de batalha mais coloridos e caóticos do que em CS. Mas o que isso significa, na prática, em termos dos grandes momentos do eSport?

Para Ferrantini, os grandes highlights surgem de situações de desvantagem, "quando um jogador precisa das próprias habilidades para ter sucesso em uma situação onde tudo parece perdido".

"Usar as vantagens de um personagem sobre os outros simplesmente diminui a questão humana", ele afirma. "Um grande exemplo pode ser tirado de dentro da própria Riot. Existe algum momento melhor em League of Legends que a play lendária de Zed do Faker? Com apenas um abate, e usando as mecânicas básicas do seu campeão, ele mostrou ao mundo que é o melhor jogador de LoL da história".

CS:GO: um bando de loucos

Com tanta bagagem, é evidente que Counter-Strike conta com uma estrutura bem estabelecida de equipes, torneios e, claro, torcedores ativos e ávidos pelo jogo.

Grandes orgs multidisciplinares dos eSports surgiram no CS, como Fnatic, Ninjas in Pyjamas e Na'Vi. O streamer mais assistido do mundo na Twitch no início de maio foi de CS, e é o brasileiro Gaules. Nesta segunda-feira, inclusive, ele bateu a marca de 200 mil espectadores simultâneos —foi numa transmissão de MiBR x FURIA, duas potências brasileiras.

Além disso, CS:GO é o segundo jogo que mais distribuiu premiações da história, segundo o site Esports Earnings, batendo a marca de US$ 96 bilhões e ficando atrás apenas de Dota 2.

Tudo isso contribui para uma base sólida de fãs, que, no fim das contas, é o que move um game. "Torcidas fortes são sinônimo de um cenário bem estabelecido. Apesar de 2020 ser o epicentro da chamada 'era do hype', é o tempo que cria a verdadeira paixão por pro players ou organizações", comenta Marcelo Ferrantini.

"Valorant ainda precisa figurar por muito tempo no imaginário popular antes que se possa pensar em verdadeiras grandes torcidas pelos times do jogo".

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