A terceira gêmea

Última mensagem e vontade de parar. A vida de Maiara e Maraisa sem a 'irmã' Marília Mendonça

Lucas Pasin De Splash, no Rio Divulgação
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Elas se conheceram em 2013, por intermédio de Henrique e Juliano, com a intenção de fortalecer o que passaria a ser chamado futuramente de "feminejo". Maiara e Maraisa viram em Marília Mendonça não só um talento musical, mas - como elas mesmo brincam - uma "terceira gêmea".

Da amizade, que incluía diversos momentos de confidências, noites em claro bebendo em postos de gasolina e até um anel, usado pelas três, com o símbolo do infinito, surgiu também um audacioso projeto musical: "Patroas". A iniciativa concorreu ao Grammy Latino neste ano e tinha a intenção de se tornar uma turnê em 2022.

Na primeira entrevista após a morte de Marília Mendonça, Maiara e Maraisa conversam entre si e se questionam por diversos momentos "se a ficha já caiu". Com a agenda cheia, herdando também algumas apresentações que seriam da "Rainha da Sofrência", as duas se surpreendem ao lembrar que já faz um mês que o Brasil perdeu uma de suas maiores cantoras.

Hoje, um mês após a morte de Marília Mendonça, as gêmeas do sertanejo contam como estão lidando com a perda, relembram as últimas conversas com a irmã, grupo no WhatsApp e planos, e destacam a importância do legado deixado pela amiga.

João Valentino

Show tem de continuar

Assim que souberam da morte de Marília Mendonça, Maiara e Maraisa anunciaram a pausa na agenda e o cancelamento de todos os shows. A vontade, segundo elas, era não subir mais ao palco neste ano. Porém, uma semana depois, elas já estavam se apresentando e, mais, assumindo os compromissos da amiga, como o show realizado em Lorena, interior de São Paulo, no dia 14 de novembro.

Fizemos reuniões e deixei claro que não queria mais fazer show em 2021. Na minha cabeça isso era o certo. - Maraisa

"Conversei com um e com outro, e todos estavam num movimento contrário, de honrar o que tinha sido combinado com a Marília. A Ruth [mãe de Marília] foi uma das que pediu que a gente não parasse. Foi aí que eu mudei também e decidi orgulhar minha amiga independentemente de ela estar aqui. Muita gente depende disso."

Para Maiara, o sentimento em relação ao palco já foi diferente.

"Aconteceu o velório e o enterro, esperei um dia e, enquanto a Maraisa estava prostrada na cama, caída mesmo, fui para o estúdio e criei o show que apresentamos em Lorena. Montei repertório, tudo. Foi ali que a minha ficha caiu. Soube que teria que continuar. Se não fizesse o combinado em vida com ela, seria covarde, e me arrependeria lá na frente".

Subo no palco e fico sem saber como me portar. Será que posso falar isso? Brincar com aquilo? No show em homenagem à Marília não consegui cantar. Foi pesado. Me feriu demais olhar ela num telão.

Maraisa

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A força da plateia

A volta aos palcos trouxe para Maiara e Maraisa um sentimento de "primeira vez". As sertanejas confidenciam que não sabem ao certo como irão reagir a cada apresentação.

"Passamos dois anos sem show por conta da pandemia, aí criamos o planejamento das Patroas e passamos a inserir a Marília em tudo. Ficamos por muito tempo vivendo o trabalho juntas. Os nossos sonhos passaram a ser os das Patroas. Almejamos carreira internacional juntas. O que fazer agora?", pergunta Maiara.

Nos resta levar esse legado e entregar sempre o melhor

Maraisa diz ainda "se sentir perdida" nas apresentações e assume a dor ao ver que a amiga não está no show com elas.

"Saía do palco e me perguntava: 'Estou interagindo com a minha amiga num telão? Como assim?'. Quando falam que poderíamos colocar a Marília num holograma no projeto Patroas, eu me pergunto: 'Jura? Sério isso?'. Isso tudo me fere demais."

Tanto Maiara quanto Maraisa destacam, no entanto, que voltar aos shows é o que tem ajudado no processo do luto.

"Recebo tanta força dos fãs, tanto carinho. Sei que nos primeiros shows, principalmente os que seriam da Marília, os fãs não estavam ali para ver Maiara e Maraisa, muitos nem nos conheciam bem. Eles queriam apenas ser confortados por nós. E nós voltamos aos palcos pelas pessoas que dependem de nós e por nossa saúde mental. Se eu estivesse em casa, sem show, estava lascada", aponta Maraisa.

Ninguém conhece a Marília como nós a conhecíamos

Maraisa

Reprodução/Instagram

Não eram apenas colegas de palco. O relacionamento entre as três ia além do profissional. Ao menos é isso que ressalta Maraisa. "A gente era amiga o tempo inteiro. Falava de cachaça, de romance, tudo. A amizade sempre veio primeiro, o 'cantar' era diversão".

Elas não se importavam em dividir o mesmo quarto de hotel antes de uma apresentação, de ligar de madrugada para fazer um desabafo e, principalmente, faziam questão de defender uma a outra com unhas e dentes.

"A Marília me defendia quando nem precisava. Ela comprava briga minha que nem eu comprava", lembra Maraisa.

Maiara diz que muitas vezes lê comentários de pessoas que querem entender o motivo de elas falarem tanto de Marília Mendonça. Ela tenta explicar, definindo o sentimento que tinha pela amiga:

Basta você imaginar. Se você perdesse seu marido ou esposa hoje, como seria? Alguém com quem você convive 24 horas. Não sofreria? É isso. Tive a Marília arrancada de mim no momento em que eu estava com o projeto mais lindo da vida com a minha melhor amiga

O mundo é pequeno demais para nós três

A última mensagem trocada entre as patroas

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Sexta-feira, 5 de novembro, 4h da manhã. Maraisa, acordada depois de assistir a uma série, resolveu escrever para Marília. A sertaneja conta que essa foi a última mensagem trocada antes do acidente aéreo.

"Foi uma conversa aleatória, uma bobeira. Mandei mensagem dizendo que a amava e a lembrei de algo do trabalho. Falamos aquele 'eu te amo' com muito carinho. Foi a última vez que a Marília me respondeu naquele dia".

As três tinham um grupo no WhatsApp chamado "Só nós". Era ali que elas planejavam projetos e trocavam confidências. Maiara se lembra de uma das últimas conversas no grupo e se emociona ao ler uma mensagem de Marília que, entre outras coisas, dizia: "Meninas, o mundo é pequeno demais para nós três".

Sempre escuto os áudios e leio os conselhos que a Marília me dava - Maiara

"Até hoje, não apagamos esse grupo. Guardei especialmente essa mensagem que veio logo após conquistarmos a capa da Forbes. Ela escreveu: 'Vocês perceberam que nada foi em vão? Ficou tudo como a gente imaginava. Que doideira, né? Nos desgastamos por alguns assuntos, fazemos reuniões, estresse, mas vale a pena ter firmeza nos sonhos'", conta Maiara.

Reprodução/Instagram

A mãe "adotiva"

Maiara e Maraisa contam com o apoio de Ruth Dias, mãe de Marília Mendonça, para seguir com o projeto "Patroas". Elas dizem que estão ainda mais próximas da família da amiga após a perda e que sentem uma certa obrigação de continuar para que eles também se sintam honrados.

"Toda vez que estou em Goiânia, vou à casa da Ruth. Ela é muito forte. Foi uma das pessoas que falou que nós tínhamos que continuar e me disse que gostaria que o combinado com a Marília não fosse desfeito", explica Maraisa.

A sertaneja também fala de Leo, filho de Marilia, que completa 2 anos no próximo dia 16: "Tenho muito amor por ele e sei que está bem. É uma criança, né? A Marília engravidou e deixou esse menino para a mãe dela, para fazer companhia. Até nisso ela fez bem. Deixou o Leo para nós".

Além de Ruth, Leo também é criado por Murilo Huff, com quem Marilia foi casada.

Nós, neste momento, temos o mesmo trabalho deixado por Marília. Ela está presente em tudo, é a primeira voz das nossas músicas. Então continuaremos levando esse legado, mostrando o trabalho que também foi da Marília

Maraísa

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