Fagundes é processado por impedir atrasados de verem peça; ele pode barrar?

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O ator Antônio Fagundes, 76, está sendo processado por ter impedido a entrada de um casal que chegou atrasado para assistir à peça de teatro "Dois de nós", no teatro da PUC-SP.
O que aconteceu
O caso teria ocorrido em janeiro e os dois teriam atrasado apenas "uns segundinhos", segundo o colunista Ancelmo Gois, do jornal O Globo. Splash confirmou que há um processo por danos morais contra o ator, no valor de R$ 20,4 mil em tramitação no Tribunal de Justiça de São Paulo.
Não é a primeira vez que Fagundes é processado sob a mesma reclamação. Durante participação no Roda Viva em setembro do ano passado, ele contou que costuma ter o nome envolvido em ações na Justiça por pessoas que não chegam a tempo das peças. Ele afirma que sempre ganha as ações.
Acho isso muito engraçado, ser processado por cumprir o que você promete.
Antonio Fagundes, no Roda Viva, em setembro de 2024
Fagundes pode impedir entrada?
Sim, organizadores culturais podem estabelecer regras próprias de pontualidade. Isso está amparado no princípio da razoabilidade, explica Stefano Ribeiro Ferri, membro da comissão de Direito Civil da OAB-Campinas e especialista em Direito do Consumidor.
O Código de Defesa do Consumidor exige que essas condições estejam claramente informadas ao consumidor no momento da compra. "É o chamado dever de informação. Se o ingresso deixar claro que a entrada após o início da peça não será permitida, não há ilegalidade."
Mas se essa regra não foi informada de forma clara e ostensiva, o consumidor pode, sim, alegar que houve falha na prestação do serviço. Portanto, tudo gira em torno da transparência. A empresa ou artista podem restringir o acesso, mas devem avisar com clareza e antecedência.
Stefano Ribeiro Ferri, especialista em Direito do Consumidor
Apesar disso, cada caso pode ter particularidades que demonstrem danos morais ou materiais. O advogado explica que se o impedimento de entrada é feito de maneira abusiva, é possível que o juiz entenda que houve um dano legal.
Por exemplo, se o casal [do caso de Fagundes] foi avisado previamente [no ingresso, por e-mail ou na bilheteria] de que o atraso impediria o acesso, a recusa não caracteriza, por si só, dano moral ou material. Afinal, trata-se do exercício legítimo de um direito pelo fornecedor do serviço. Agora, se não houve aviso prévio ou se a recusa foi feita de maneira abusiva, desrespeitosa ou desnecessariamente humilhante, pode haver, sim, responsabilidade civil.
Stefano Ribeiro Ferri, especialista em Direito do Consumidor
O dano material seria a devolução do valor pago pelos ingressos, explica Ferri. "Já o dano moral só se configura se ficar demonstrado um sofrimento que ultrapasse o mero aborrecimento —por exemplo, se o casal foi exposto a constrangimento público ou teve sua dignidade ofendida."
Em geral, a Justiça tem compreendido que o organizador tem razão. O advogado explica que o Judiciário é cauteloso com pedidos de danos morais em casos assim, exigindo provas concretas que demonstrem abuso do fornecedor. No entanto, quando há aviso prévio e regras claras sobre o impedimento da entrada após o horário previsto para início do espetáculo, a jurisprudência normalmente não é favorável ao consumidor.
Quando o fornecedor não comprova ter informado claramente o consumidor, ou quando há falha no atendimento, como desorganização na entrada, atrasos no início da peça ou descaso com o público, os tribunais já reconheceram a existência de danos materiais e, em alguns casos, morais. Não é uma questão de regra rígida, mas de análise do caso concreto, com base no princípio da boa-fé objetiva e no equilíbrio da relação de consumo.
Stefano Ribeiro Ferri, especialista em Direito do Consumidor
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