Escritora é acusada de racismo em feira literária em Minas: 'Fui atacado'
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A escritora Camila Panizzi Luz causou revolta durante a Flipoços (Festival Literário Internacional de Poços de Caldas) após uma fala considerada racista em palestra com o escritor Wesley Barbosa.
O que aconteceu
Durante uma palestra ocorrida na quarta-feira, Camila convidou ao palco o escritor que lança o livro "Viela Ensanguentada". Ele participa da Flipoços como editor, vendendo livros de sua editora, a Barraco Editorial, no estande do Coletivo Neomarginal.
Em meio à apresentação de Wesley, que escreve literatura marginal, Camila o interrompeu para perguntar: "Como que faz para ser neomarginal?" "Eu quero ser uma neomarginal gente, olha que tudo. Camila Luz, neomarginal, nunca fui presa", completou ela.
"Também nunca fui preso", escreveu ele ao compartilhar o vídeo da situação no Instagram. "Senti que eu fui atacado, associado a um criminoso, quando, na verdade, a literatura marginal é um movimento literário que se iniciou nos anos 1970, com vários escritores", diz ele em contato com Splash.
Me senti constrangido com as falas dela. Em todo momento, eu tentei não polemizar, não devolver com a mesma moeda, quis ir pelo lado da cultura, falar dos livros, da minha trajetória enquanto escritor. Ela soltou aquelas palavras que me deixaram indignado e que não atacaram somente a mim, mas a tantas outras pessoas pretas que são atacadas direta, indireta e tão escancaradamente. Sinto que ela tem a certeza da impunidade, por isso, falou o que falou.
Wesley Barbosa para Splash
A Flipoços emitiu comunicado para esclarecer que repudia veementemente qualquer ato de racismo, discriminação ou preconceito. Além de repudiar a "postura inaceitável" de Camila, anunciou que decidiu "romper vínculos entre a autora e a programação, retirar os seus livros da feira e cancelar todas as demais atividades em que a autora estaria vinculada nesta e em outras realizações do festival".
Camila e sua mãe, Ivana Panizzi, também escritora, participaram da mesa "Raízes e Asas: Literatura e Artes Sem Fronteiras - O Encontro de Mãe e Filha na Terra Natal", na Flipoços, na quarta-feira. A mãe lança o livro "Traços do Tempo — Uma Jornada Abstrata pelo Mundo", enquanto a filha divulga "Liderança Feminina Sem Fronteiras".
Splash tenta contato com Camila Panizzi Luz, mas sem sucesso. A escritora fechou o seu perfil pessoal e o de seu podcast, Pane No Sistema, no Instagram. Espaço segue aberto caso ela queira se pronunciar.
À EPTV, afilada da TV Globo em Minas e em parte do interior paulista, a produção da escritora afirmou que surgiram acusações públicas contra Camila nos últimos dias, "alegando condutas racistas com base em recortes de mensagens privadas e fora de contexto". "Reconhecemos que houve uma fala infeliz, que pode ter sido mal interpretada e por isso, lamentamos profundamente se alguém se sentiu ofendido".
Pedido de desculpas e ataques de amigos
Para Splash, Wesley relata ainda que Camila pediu desculpas por meio de mensagem nas redes sociais. "Falei para ela ficar em paz, que está tudo certo porque não quero cancelar ninguém. Apenas expus o vídeo e escrevi: 'eu também nunca fui preso'. As pessoas viram o vídeo, se indignaram e começaram a compartilhar e, de repente, os jornalistas vieram me procurar".
Wesley faz campanha para levar o lançamento do livro à França, o que teria gerado críticas de Camila, afirma ele. "A Camila viu isso nos meus stories e disse que eu estava aproveitando da situação... Não preciso me aproveitar de uma situação dessa para ter reconhecimento. Já tenho muitos leitores que sabem da minha trajetória como escritor. No mercado editorial, as pessoas já me conhecem. Não é isso que me dá espaço. O que me dá espaço são os meus livros".
Quando eu disse, no palco, que um colete é a prova de bala, eu quero dizer que é a prova de palavras como as dela. Para aguentar o que ela disse ali, é porque eu leio livros e tenho a autoestima que eles me deram.
Wesley Barbosa a Splash
Wesley diz ainda que recebeu ataques de amigos de Camila pelas redes sociais. "Disseram que estou me aproveitando da situação para 'hypar', quando, na verdade, estou me sentindo exposto por uma coisa ruim. Quero ser reconhecido pelos meus livros e trajetória literária".
Quem é Camila Panizzi Luz
Camila Panizzi Luz é filha da escritora Ivana Panizzi e do diplomata Francisco Carlos Soares Luz, atual embaixador do Brasil na Bolívia, segundo o Ministério das Relações Internacionais. Eles vivem no exterior atualmente, mas a família é de Poços de Caldas, onde é realizada a feira literária. Atualmente, mora em Portugal, país homenageado pela feira literária de Poços de Caldas.
Este ano, ela foi citada pelo NYC Journal como uma das 30 mulheres mais inspiradoras para ficar de olho em 2025. O perfil traçado pelo jornal diz que "a jornada de Camila abrange mais de 15 anos, de start-ups à liderança internacional, escrevendo comunicados para a imprensa e artigos, organizando eventos desde cedo e combinando sua expertise em marketing global e relações internacionais."
O perfil continua: "Ela morou em 10 países, visitou mais de 60 e compartilha seus aprendizados em seu livro mais recente, intitulado 'Tempestade da Mente', inspirando leitores a abraçar a autodescoberta, a diversidade cultural e a inovação. Apaixonada por marketing orientado a propósito, Camila capacita indústrias e indivíduos a abraçar mudanças e construir um futuro mais sustentável".
Em suas redes sociais, ela se apresenta como internacionalista, marketeira, exploradora e autora. Diz já ter conhecido 63 países.
Veja a nota do Flipoços na íntegra:
"Nota de Apoio ao escritor Wesley Barbosa e ao Coletivo Neomarginais
O Flipoços 2025 repudia veementemente qualquer ato de racismo, discriminação ou preconceito. Nosso evento tem como pilares a diversidade, a inclusão e a valorização de todas as vozes — especialmente aquelas que historicamente foram silenciadas.
Durante uma das mesas do Festival, um dos integrantes do Coletivo Neomarginais foi alvo de um episódio lamentável de cunho racista.
Na mesa "Raízes e Asas: literatura e artes sem fronteiras, o encontro de mãe e filha na terra Natal", a escritora Camila Panizzi Luz decidiu convidar o escritor Wesley Barbosa, integrante do Coletivo Neomarginais, que estava na plateia para subir ao palco e participar da conversa, no entanto, ela assumiu uma postura inaceitável, com falas ofensivas ao autor do Coletivo.
Diante disso, o festival decidiu por romper vínculos entre a autora e a programação, retirar os seus livros da Feira e cancelar todas as demais atividades em que a autora estaria vinculada nesta e em outras realizações do Festival.
Visando preservar o respeito e a escuta mútua nas próximas edições, o Festival se compromete à abertura de uma convocatória de escuta para fortalecer a curadoria, que sempre esteve aberta a todos as formas de pensamentos enaltecendo a diversidade, representatividade e a pluralidade de vozes.
A presença do Neomarginais no Flipoços, com um estande vibrante e potente, é motivo de orgulho para todos nós. Suas obras são urgentes e essenciais para a construção de uma sociedade mais justa e consciente.
Reforçamos que o Flipoços, ao longo de seus 20 anos, sempre foi — e continuará sendo — um espaço de liberdade, respeito e celebração da cultura em todas as suas formas.
Importante destacar que, em um espaço de fala livre e democrática como o Flipoços, não é possível prever o que cada pessoa dirá ao microfone. Ainda assim, reafirmamos que não compactuamos com nenhum tipo de discurso discriminatório ou ofensivo, e seguiremos atentos para preservar o respeito e a escuta mútua em todas as atividades do evento.
Seguimos juntos, lutando por um mundo onde todas as histórias possam ser contadas e ouvidas."
Veja a nota completa de Camila Panizzi Luz enviada à EPTV
"Nos últimos dias, surgiram acusações públicas contra Camila, alegando condutas racistas com base em recortes de mensagens privadas e fora de contexto. Reconhecemos que houve uma fala infeliz, que pode ter sido mal interpretada e por isso, lamentamos profundamente se alguém se sentiu ofendido.
Entretanto, é importante ressaltar que Camila tem plena consciência de seus privilégios e já demonstrou inúmeras vezes sua disposição em abrir espaço para outras vozes - inclusive, cedendo seu próprio protagonismo em eventos, feiras e espaços profissionais, em respeito e reconhecimento à desigualdade histórica que permeia nossa sociedade.
É doloroso ver a luta por justiça ser usada como palco para autopromoção. Esperamos que o debate avance com responsabilidade e verdade, e que possamos, todos, aprender e crescer —sem distorções, sem recortes convenientes.
Camila seguirá refletindo, aprendendo e se posicionando sempre ao lado da inclusão e do respeito."
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