Novelas curtas e jornadas apaixonantes: Entenda o sucesso dos k-dramas

Seja na conversa com o motorista de aplicativo, com a tia que já está na sua quarta "novelinha coreana" consecutiva, ou com a própria descoberta desse novo universo, os k-dramas nunca estiveram tão em alta por aqui. E qual é a razão para tanto sucesso?

O formato

Uma das principais razões de os k-dramas terem conquistado tanta gente é graças ao formato enxuto. Com cerca de 16 episódios, as produções possuem tamanho de minisséries e apesar dos episódios longos, com mais de uma hora de duração, elas são estruturadas de uma forma compacta, sem muitos episódios para enrolações (mas existem, acredite).

A imersão cultural

Outro grande atrativo das produções sul-coreanas é a exposição a uma cultura completamente distinta da nossa. Os dramas mostram costumes das famílias, muitas comidas e bebidas típicas, pontos turísticos, trilha sonora "de k-drama" (as OST, como são chamadas, fazem muito sucesso) e rituais de beleza e estilo, com looks impecáveis tanto em mulheres quanto homens.

Jornada e peculiaridades

As produções sul-coreanas abraçam diversos gêneros e temas, como podemos ver com o grande sucesso "Round 6", a série mais vista da história da Netflix e bancada em boa parte pelo governo local. São dramas de serial killer, viagem no tempo, troca de corpos, Era Joseon (os dramas antigos, de época), comédias e, obviamente, romances.

Para Gaby Brandalise, jornalista e escritora, os k-dramas têm como diferencial saber contar boas histórias de amor. "Os roteiros sempre me surpreendem, os coreanos têm um jeito de contar história de uma forma fascinante. Uma hora estamos chorando em um velório e em seguida temos um alívio cômico" explica. A escritora se inspirou em k-dramas para escrever sua nova obra, "Minha vida é um k-drama".

'Minha vida é um k-drama', novo livro da jornalista Gaby Brandalise pela editora Intrínseca
'Minha vida é um k-drama', novo livro da jornalista Gaby Brandalise pela editora Intrínseca Imagem: Intrínseca/Divulgação

A escritora conta que entrou nessa vida de dramas e k-pop há uma década. Ela foi à Coréia do Sul três vezes e percebeu que os coreanos têm o hábito de ver muita novela (os dramas) na TV aberta. Ao construir sua protagonista do livro, a adolescente confusa Talita, Gaby explica que pensou em narrativas de muitos questionamentos, na confusão escolar que é muito trabalhada em dramas, e em como tudo isso afeta a adolescência.

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No livro, Talita fica impressionada com os beijos dos k-dramas e sonha em ter seu primeiro beijo de forma tão mágica quanto os dramas aparentam. "A demora do beijo, a construção do clima, isso tudo atrai muito quem assiste", fala Gaby.

Fantasia vs. Realidade

Talvez esse seja um dos maiores atrativos dos k-dramas, e o que o diferencia das narrativas ocidentais: a demora, a espera, a construção lenta do romance principal. Os homens são, além de muito bonitos - muito acima da média mesmo -, extremamente educados, ou se tornam durante o drama. É uma fantasia de um homem quase perfeito.

"Logo que comecei a ver dramas eu fiquei muito impressionada com a quantidade de homens chorando. Por que esses homens choram tanto? Achei muito diferente", conta Gaby. Essa construção de um homem mais sensível, compreensivo, que escuta, abre a porta do carro, cozinha e ainda por cima é romântico, alimenta e muito o imaginário das pessoas.

É importante lembrar, no entanto, que fantasia e ficção são coisas muito distintas, e desde 2019 começou no país um fenômeno - que vem ganhando força - chamado "4B". Os B's correspondem a Bihon (não casar), Bichulsan (não ter filhos), Bisekseu (não transar) e Biyeonae (não namorar), e o movimento foi criado por conta da cultura patriarcal e dos altos índices de violência doméstica na Coréia do Sul. Vale lembrar que o país tem a menor taxa de natalidade do mundo.

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Ou seja, é importante saber separar bem o que é ficção e o que é realidade.

A válvula de escape

Existe uma discussão constante se devemos ou não romantizar os k-dramas e os homens coreanos e quase sempre ela cai na xenofobia e etarismo, e acaba banalizando uma pauta interessante de ser conversada.

Os k-dramas são parte de um investimento enorme do governo sul-coreano em produções locais e conseguiram com sucesso expandir o mercado e fazer dinheiro com isso. São obras de ficção bem feitas, dirigidas e promovidas em grandes plataformas de streaming. No Brasil, a dublagem excelente fez o sucesso ser ainda maior. Ver um episódio no fim do dia é uma excelente válvula de escape para rotinas difíceis, corridas ou chatas e vazias.

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Muita gente faz amigos, cria grupos, assiste junto e expande conhecimento em diversas áreas. E como tudo que tem vários prós, também temos vários contras, com a objetificação de pessoas amarelas, a obsessão de "arranjar um coreano" e a romantização de comportamentos tóxicos. Os romances, particularmente, não mostram quase nunca brigas, discussões, a parte "feia" das relações. Só enxergamos o limpo, o bonito (e nenhuma grávida, reparem).

Assim como Talita, que na sua confusa adolescência aprende muito com sua jornada em busca do beijo perfeito, é sempre bom lembrar que na vida real, nem sempre o beijo vai sair no sexto episódio das nossas histórias. E tá tudo bem.

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